CHICAGO – A Lei de Redução da Inflação (IRA, em inglês), sancionada pelo governo Biden nos Estados Unidos há um ano, prevê subsídios de US$ 1,75 por galão de combustível sustentável de aviação (SAF, em inglês) para produtores e companhias aéreas que misturam o produto ao querosene fóssil.
“Nos EUA, o IRA definitivamente tem ajudado a acelerar projetos, porque criar incentivos fiscais para combustíveis limpos dá às companhias uma perspectiva mais clara da economia”, afirma Gavin Towler, chefe de Sustentabilidade da Honeywell, em entrevista à epbr.
A indústria da aviação responde por cerca de 3% das emissões globais de gases de efeito estufa.
Internacionalmente, o setor tem metas de de descarbonização até 2050, e vê no SAF o caminho mais viável para chegar lá – já que a eletrificação ainda está distante e requer a substituição das aeronaves.
O SAF é a solução disponível hoje, mas ainda é duas a quatro vezes mais cara que o querosene de petróleo. Além disso, a produção ainda está muito aquém da demanda projetada até o final da década.
É aí que entram os governos, com incentivos para alavancar a produção e estimular o consumo.
O parlamento europeu aprovou na semana passada o projeto de lei que estabelece metas obrigatórias para as companhias aéreas do bloco aumentarem gradativamente o consumo de SAF a partir de 2025.
O mandato começa com 2%, e deve chegar a 6% em 2030; 20% em 2035 e 70% em 2050. Para combustíveis sintéticos, produzidos com hidrogênio renovável e CO2, o e-SAF a meta é 1,2% em 2030; 2% em 2032; 5% em 2035; e 35% em 2050.
Os sintéticos também são chamados de eletrocombustíveis e estão ganhando espaço nas discussões sobre substituição de carbono e hidrogênio de fontes fósseis.
Por aqui, o governo brasileiro, também na semana passada, enviou ao Congresso Nacional um projeto de lei criando um mandato de emissões para a aviação que terá que ser cumprido com renováveis.
Políticas como essas ajudam as empresas a planejarem seus investimentos, e o IRA de Joe Biden é um bom exemplo, defende o chefe de Sustentabilidade da Honeywell.
“Cada empresa tem as suas metas de redução de gases com efeito de estufa, por isso sabe quais os projetos que pretende executar. Mas a economia melhorou muito com algumas das medidas que estão no IRA, e isso levou a um grande aumento nas aprovações de projetos”, relata Towler.
“[Com o subsídio] as empresas podem recorrer aos seus investidores, ao seu conselho, e obter o capital de que necessitam para realmente fazer esses projetos acontecerem”, completa.
No caso brasileiro, o executivo vê um grande potencial de liderar essa transição.
“Obviamente, todos os países ainda têm áreas para trabalhar. Para o Brasil, em particular, a adesão à Aliança Global de Biocombustíveis na reunião do G20 deve criar um ímpeto adicional e investimentos adicionais”, comenta.
“Mostra muito bem como os países que ainda são economias emergentes podem assumir uma posição de liderança e realmente encorajar todos os outros a acelerar o ritmo da transição energética”.
Tecnologia para diversificar matéria-prima
A ambição do governo estadunidense é chegar a 3 bilhões de galões de SAF por ano (cerca de 200 milhões de barris por dia) em 2030 e 35 bilhões de galões por ano até 2050.
Uma meta factível, avalia Kevin O’Neil, chefe sênior de Negócios em Combustíveis Renováveis da Honeywell.
Em evento para jornalistas em Chicago (EUA) na última semana, o executivo contou que há vários projetos de biorrefino em andamento no país, desde construção de novas plantas até a conversão de refinarias convencionais para produzir SAF e diesel verde.
Em julho, a empresa de tecnologia que fornece os equipamentos para os produtores de combustíveis anunciou um contrato para a conversão da refinaria da bp de Cherry Point em Blaine (Washington), e outras quatro na Europa e Austrália.
Em todo o mundo, a Honeywell já licenciou 39 biorrefinarias, com capacidade total de produção superior a 400 mil barris por dia.
“A tecnologia existente hoje permite uma descarbonização significativa da aviação”, destaca O’Neil.
O desafio está na matéria-prima. Atualmente, todo o SAF consumido no mundo vem de óleos e gorduras residuais, produzido pelo processo HEFA. Mas há um limite de insumo disponível.
Com o crescimento da demanda global previsto para saltar dos atuais 50 mil bpd para mais de 3 milhões de bpd, a indústria precisará encontrar novas fontes renováveis ou de baixo impacto para o SAF.
O que demanda investimentos em tecnologia para produção via outras rotas, como a ATJ, que utiliza etanol, e a Fischer-Tropsch, para incluir alternativas como biogás e dióxido de carbono.
Etanol, biomassa e CO2
As três rotas (HEFA, ATJ e FT) são a aposta da Honeywell para o SAF.
“Encontrar matérias-primas alternativas é vital para produzir biocombustíveis avançados e SAF para alcançar as metas globais”, defende O’Neil.
Ele vê etanol, biomassa e dióxido de carbono como as fontes de suprimento com maior potencial de aplicação na indústria de biocombustíveis até 2050.
“Essas são as três alternativas que enxergamos para o futuro, pela possibilidade de escala. Outras rotas potenciais que as pessoas estão falando nós não vemos esse mesmo potencial de ganho de escala. Mas nestas três nós já vemos”.
Segundo O’Neil, plantas já estão sendo desenhadas ao redor do mundo para pirólise de biomassa, combinação de CO2 com hidrogênio renovável, e transformação de etanol e combustível de aviação.
Outro fator de influência na definição dos investimentos em tecnologia são as políticas de incentivo. O uso de CO2 como matéria-prima está sendo impulsionado por mandatos na Europa e subsídios nos EUA, conta o executivo.
A jornalista viajou para a 2023 Global Sustainability Week a convite e com despesas pagas pela Honeywell