RIO – O governo federal, por meio do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), defende que sejam incluídas mais restrições à operação do gasoduto Subida da Serra, pela Comgás, no acordo a ser celebrado entre a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e Arsesp, órgão regulador paulista, para encerrar o conflito federativo entre as partes sobre a classificação do gasoduto.
Durante consulta pública sobre a minuta do acordo, proposta pela ANP, o MDIC sugere que o Subida da Serra atenda apenas à demanda nova de gás natural dos consumidores atendidos pela Comgás; e que sejam incluídas medidas adicionais para mitigar os riscos associados à verticalização do negócio.
Em São Paulo, a empresa do grupo Cosan controla a Comgás e é, ao mesmo tempo, dona do Terminal de Regaseificação de São Paulo (TRSP), a principal fonte de suprimento do gasoduto Subida da Serra.
Relembre
A ANP colocou em consulta pública (010/2023), entre julho e setembro, uma proposta de acordo com a Arsesp para encerrar uma disputa sobre a classificação do Subida da Serra. O assunto vai a audiência pública nesta quarta (20/9). A agência reguladora paulista entende que se trata de um ativo de distribuição, na contramão de um entendimento da diretoria da ANP, de 2021, que classificou o gasoduto como de transporte.
Posteriormente, a ANP abriu a possibilidade de um acordo, para que o projeto, também conhecido como Reforço Metropolitano, seja considerado uma rede de distribuição – e possa, assim, permanecer na base de ativos da Comgás, desde que atendidas algumas condicionantes.
MDIC teme esvaziamento da malha de transporte
A ANP propõe, dentre outras contrapartidas, que haja um controle de vazão na interligação do TRSP ao Subida da Serra, de forma que a entrega de gás à Comgás seja limitada até o volume já contratado pela distribuidora (3,125 milhões de m3/dia). Tudo que exceder esse volume teria que passar, portanto, pelo sistema de transporte – e pagar tarifa de transporte;
O MDIC, por sua vez, defende uma proposta alternativa, segundo a qual o Subida da Serra se limitaria a atender apenas a demanda nova da área de concessão da Comgás. Assim, não haveria substituição do gás atualmente provido pela malha de transporte pela molécula que será movimentada pelo Reforço Metropolitano.
Segundo a pasta, isso “tornaria o Gasoduto Subida da Serra mais aderente ao objetivo informado do projeto, que seria o de constituir reforço da malha de distribuição, e não o de operar como um novo duto de transporte”.
O Ministério endossa, assim, o argumento das transportadoras, de que a operação do gasoduto de forma verticalizada com o TRSP deslocará uma parte expressiva do volume de gás que circula pela malha de transporte – encarecendo o serviço para os demais usuários da rede.
Isso porque o sistema de transporte funciona como uma espécie de condomínio. A transportadora é remunerada pela infraestrutura por uma receita permitida, que é repartida entre os usuários. Se o número de carregadores (quem contrata a capacidade) e o volume caem, o valor a ser pago pelos demais cresce.
Reconhecer o Subida da Serra como um ativo de distribuição da Comgás – e não como de transporte – implicará num aumento imediato de 6% nas tarifas dos usuários da Nova Transportadora do Sudeste (NTS). Essa alta pode chegar a 14%, a depender da dinâmica do mercado paulista, estima o Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura da FGV (FGV Ceri), em estudo encomendado pela ATGás.
O MDIC também propôs que, no acordo a ser celebrado, a ANP e Arsesp se comprometam a definir, dentro de seus limites de competência, regras que minimizem o risco de self dealing na celebração de contratos de comercialização – ou seja, o risco de aquisições ineficientes de molécula decorrentes de transação entre partes relacionadas.
A pasta cita que a Nova Lei do Gás confere à ANP a competência para estabelecer o conteúdo mínimo de contratos de comercialização, bem como vedar cláusulas desses contratos que prejudiquem a concorrência.
Nas suas argumentações, o MDIC reforça muitos dos pontos dos críticos à classificação do Subida da Serra como ativo de distribuição. Reconhece, por exemplo, que o gasoduto constitui um by-pass na malha de transporte, prejudicando a conexão entre os mercados regionais e a concorrência no fornecimento de molécula, num efeito conhecido como “ilha do gás”, por reduzir as alternativas de provimento para o consumidor.
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O outro lado
A Compass rebate as críticas de que a verticalização do negócio traz riscos de monopólio regional e criação de “ilhas do gás”, ao citar que a Comgás fechou, recentemente, contrato de longo prazo, no valor de R$ 56 bilhões, com a Petrobras, para aquisição de molécula.
Defende também ser alvo de uma medida discriminatória, já que existem outros terminais de GNL no Brasil que entregam gás aos clientes (no caso termelétricas) sem passar pela malha de transporte – e que, portanto, não pagam tarifa correspondente e não se sujeitam a qualquer limitação de volume para essa entrega.
São os casos dos terminais de Barra dos Coqueiros (SE), da Eneva; do Porto do Açu (RJ), da GNA; e de Barcarena (PA), da New Fortress Energy.
E nega que haja conexão direta do TRSP ao Subida da Serra, como acusam os defensores da tese do by-pass. A Compass alega que o gás que vem do TRSP chega até o ponto de entrega Cubatão II – onde, só a partir daí, o gasoduto em disputa, então, se conecta.