A transição para uma nova economia de baixo carbono é um desafio complexo e exige a combinação de diversas soluções e ferramentas para alcançar sucesso.
Nesse contexto, a transição energética, por meio da incorporação de energias renováveis e combustíveis de baixa emissão de carbono, é vista como parte fundamental dessa nova economia.
Para viabilizar essa transição, muito investimento tem sido aplicado no desenvolvimento e aperfeiçoamento de uma nova geração de combustíveis com baixa emissão, tendo o hidrogênio (H2) ganhado especial destaque nos últimos anos.
O interessante sobre a produção industrial de H2 é que — de modo geral — ela não é exatamente uma novidade, o que é nova é a possibilidade de produzi-lo em larga escala por meio de um processo com baixa emissão de carbono.
É aí que se destacam o hidrogênio verde ou renovável e o hidrogênio azul.
A produção de hidrogênio verde é feita por meio da eletrólise da água, cuja energia utilizada no processo é gerada a partir de fontes renováveis, como eólica, solar ou hidroelétrica.
Hidrogênio azul, com captura de carbono, é solução complementar
Já o hidrogênio azul é produzido a partir do gás natural, através do processo de reforma a vapor (conhecido como hidrogênio cinza). A este processo é acoplado a uma infraestrutura de captura do CO2 produzido, que será posteriormente armazenado permanentemente em rochas profundas.
Ou seja, trata-se da combinação da produção de hidrogênio com tecnologias de CCS. O resultado é a produção de H2 com uma intensidade de carbono significativamente menor do que o hidrogênio cinza.
Embora o hidrogênio verde tenha sido enfatizado em muitas políticas públicas de descarbonização, trata-se de uma tecnologia emergente, em geral, mais cara, e consequentemente pode levar mais tempo para ser implementado em larga escala.
Já a tecnologia e os equipamentos para produção do hidrogênio azul em larga escala estão disponíveis e podem ajudar a criar um mercado de hidrogênio limpo, o que contribui para acelerar o desenvolvimento do próprio hidrogênio verde no médio e longo prazo.
Entretanto, o hidrogênio azul não é uma alternativa ao verde, mas uma solução complementar, uma estratégia para a transição energética.
Não é à toa que as perspectivas para o hidrogênio azul no mundo são bastante positivas, com vários projetos em andamento e anunciados globalmente.
No Reino Unido, estão em desenvolvimento diversos clusters e hubs de CCS com hidrogênio, como é o caso do projeto de 500MW de hidrogênio azul em Teesside no Norte da Inglaterra comandado pela BP; e do acordo firmado entre Shell e Uniper para implantação de planta de 740MW de hidrogênio azul em North Lincolnshire também na Inglaterra.
Essas iniciativas visam integrar diferentes empresas e setores, formando uma rede de produção, armazenamento e distribuição de hidrogênio azul com baixas emissões de carbono.
Além de contribuir para a redução das emissões de gases do efeito estufa, esses clusters e hubs são importantes para fomentar a inovação e a competitividade no setor, além de criar empregos e gerar desenvolvimento econômico em regiões específicas, reforçando a ideia de que as tecnologias de CCS são recursos relevantes para viabilizar o uso de hidrogênio em larga escala e, assim, complementar alternativas de baixo carbono na transição para uma economia mais sustentável.
Abertura de rotas tecnológicas
No Brasil, a ampla produção e expertise da indústria de gás natural, combinada ao potencial geológico para armazenamento de carbono, criam um grande potencial de produção de hidrogênio azul em território nacional. Já existem projetos e estudos em andamento no país, além do Programa Nacional do Hidrogênio.
Trata-se uma iniciativa do governo brasileiro que tem como objetivo impulsionar o desenvolvimento e o uso do hidrogênio como fonte de energia limpa e renovável.
O programa abrange várias áreas, como produção, armazenamento, transporte e uso do hidrogênio em setores como transporte, indústria e geração de energia e busca incentivar a pesquisa e a inovação, além de criar um ambiente favorável para o investimento privado no setor.
A abordagem agnóstica do programa considera o fato de que cada tecnologia tem suas próprias vantagens e limitações e pode ser mais adequada em determinados contextos.
Nosso país dispõe uma vasta gama de fontes de geração de energia, além de grande extensão de terras para instalação de projetos de geração sem a competição por produção de alimentos, realidade diferente da União Europeia, por exemplo, que precisa privilegiar algumas tecnologias, como a eletrólise da água, em detrimento de outras como a biomassa.
O nosso contexto é outro e permite múltiplos projetos, o que evita o chamado trancamento tecnológico, que, ao privilegiar alguns setores, pode resultar em prejuízos ao desenvolvimento de outras tecnologias promissoras que necessitam de mais tempo e escala para se firmarem.
Por fim, vale mencionar que a combinação do uso de fontes renováveis para produção do hidrogênio acoplada a CCS pode permitir a geração de outros tipos de hidrogênio de baixo carbono, que tem o potencial de gerar emissões líquidas negativas, como via gaseificação de biomassa.
Apesar da escala potencialmente menor que a do hidrogênio azul, essa abordagem pode ajudar a atingir metas ambiciosas de redução de emissões devido à capacidade de remoção de CO2 da atmosfera, além de fornecer uma fonte de energia limpa e sustentável para vários setores da economia.
Em suma, a transição para uma economia de baixo carbono requer a implementação de uma série de soluções e tecnologias inovadoras.
A utilização do hidrogênio como uma alternativa limpa para combustíveis fósseis tem se mostrado uma solução promissora, mas que ainda enfrenta desafios, como a alta dependência de energias renováveis intermitentes e a necessidade de reduzir os custos de produção.
Nesse contexto, o uso de hidrogênio azul apresenta-se como uma solução complementar capaz de reduzir as emissões de gases de efeito estufa em setores que ainda não possuem alternativas viáveis, favorecendo o crescimento do hidrogênio verde ou renovável no longo prazo.
E proporcionando um meio mais rápido de cumprimento das metas de descarbonização da economia, que é o grande desafio da humanidade.
Nathália Weber e Isabela Morbach são diretoras da CCS Brasil.
Carlos Peixoto é cofundador e CEO da H2helium Projetos de Energia, Presidente do Comitê de O&G da Câmara Britânica e Head de Marketing da CCS Brasil.