Diálogos da Transição

Fase de projetos-piloto de hidrogênio já passou

Sócio da PwC Brasil conta como países estão desenvolvendo estratégias para viabilizar economia do hidrogênio verde

Fase de projetos-piloto de hidrogênio já passou, afirma Adriano Correia [na foto], sócio da PwC Brasil, em entrevista à Diálogos da Transição (Foto: Divulgação)
Na avaliação de Adriano Correia “O período de tocar projeto piloto, de fazer teste, avaliar se vai ser viável ou não, para eles [Europa] já acabou." (Foto: Divulgação)

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Diálogos da Transição

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Editada por Nayara Machado
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Com demanda estimada em 115-200 milhões de toneladas (Mt) até 2030, para cumprir promessas climáticas, a produção de hidrogênio limpo precisa acelerar para alinhar necessidades de segurança energética com metas de descarbonização da indústria.

Em entrevista à Diálogos da Transição, o sócio da PwC Brasil, Adriano Correia, observa que, na Europa, o contexto de crise energética está fazendo a UE sair à frente de outras regiões em políticas de incentivo.

“O período de tocar projeto piloto, de fazer teste, avaliar se vai ser viável ou não, para eles já acabou. E é curioso perceber que foi um período muito curto, por necessidade de achar uma alternativa ao gás russo, ao mesmo tempo que precisam cumprir com as metas de descarbonização do acordo de Paris”.

Na avaliação de Correia, a Europa tem sido inflexível em relação ao que foi firmado no acordo climático, embora reconheça a complexidade de atingir as metas.

Dentre as complexidades, como garantir o acesso à energia sem elevar custos e inflação.

Nos dois últimos anos, o hidrogênio (H₂) entrou de vez no radar de países e empresas como estratégia de transição energética.

Pelo mundo, há 26 desenhos regulatórios para desenvolver o segmento. Já os anúncios da indústria levarão a um salto da capacidade de fabricação de eletrolisadores, que hoje é de quase 8 GW/ano, a mais de 60 GW/ano até 2030, calcula a Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês).

E os investimentos na cadeia de fornecimento podem chegar a US$ 5 trilhões até 2050, de acordo com o Goldman Sachs.

“Tem muito investimento aprovado em pesquisa, na geração, mas também de transporte e armazenamento, que hoje são grandes nichos para viabilizar uma operação grande de hidrogênio, visando só não só o custo de produção — que está sendo cada vez mais fácil de equacionar com o aumentos do custo do gás na Europa –, mas também viabilizar a exportação de H₂ e amônia”, comenta Correia.

Grandes acordos ganham impulso, mas ainda não fecham a conta

Um deles foi firmado em agosto deste ano, entre Alemanha e Canadá para comércio de hidrogênio entre os dois países a partir de 2025.

Como parte do acordo, o Canadá deve produzir hidrogênio, principalmente a partir de eletricidade renovável, para exportação para a Alemanha. Enquanto o país europeu se compromete a apoiar importadores e consumidores de H2V.

Os dois países também discutem a possibilidade de Berlim comprar gás natural liquefeito (GNL) canadense. DW

“É um acordo de cooperação grande. Eles vão aproveitar algumas linhas que já existiam em águas profundas para desenvolver o projeto. Na primeira fase, com turbinas onshore”, diz o sócio da PwC.

Um projeto bilionário que prevê a instalação de turbinas eólicas para geração de 1 GW e construção de eletrolisadores com capacidade de 500 MW.

Isso tudo combinado com o mercado de nitrogênio para produzir amônia para exportação.

“Nesse projeto, em particular, existe uma discussão grande sobre custos, que ainda não fecham. Mas o pessoal tem buscado algumas alternativas de financiamento e de capex”.

A discussão de capex é quente

O nível de investimento já realizado mais o projetado na Europa em 2022 supera o total pré-covid. O problema é que boa parte não está em função de projetos novos, mas do aumento de custos da inflação.

Inflação e escassez da demanda têm pressionado novos projetos, enquanto governos buscam formas de reduzir o capex.

Aí entram os subsídios, créditos tributários e a própria precificação de carbono.

“Como é uma região que lidera as iniciativas relacionadas a descarbonização, as metas são bastante arrojadas. Eles têm buscado alternativas para penalizar quem não está cumprindo as metas”, explica.

“O dilema é que, enquanto não tiver um mercado global de carbono para equalizar as bases, ou a Europa vai se fechar, ou vai ter que conviver com o desafio de tentar pressionar as empresas de outros países, mas sem perder a competitividade”.

Além disso, essas taxas também pressionam a inflação e penalizam quem mais precisa.

Uma solução em pauta para contornar essa distorção seria tributar lucros não usuais, para que as empresas passem a contribuir mais efetivamente com os custos da descarbonização.

Viabilidade e protagonismo

No Brasil, que também discute seu mercado de carbono e uma política para o hidrogênio em diferentes frentes, Correia acredita que será necessário algum tipo de subsídio para ajudar a fechar a conta e trazer o custo a um patamar competitivo.

“Vamos ter que tomar a decisão, em algum momento, se queremos olhar para o longo prazo. Em 2040, queremos participar desse mercado e ser protagonista?”

Ele cita como exemplo a China, que tem a matriz energética mais suja do mundo, mas os massivos investimentos em renováveis nos últimos anos devem levar o país asiático a uma virada de chave muito rápida.

“Essa é uma grande questão para o Brasil. Como viabilizar esses projetos para que a gente assuma o protagonismo sem onerar tanto a base de consumidores que já paga uma conta muito alta?”

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Gabinete climático para H₂

Ontem (4/10), Alemanha e Holanda anunciaram um gabinete climático para intensificar a cooperação em eólica offshore e hidrogênio, incluindo o desenvolvimento de uma infraestrutura de H₂ entre os dois países.

Os europeus dizem enxergar na crise energética uma oportunidade para alcançar a neutralidade climática mais rapidamente, ao mesmo tempo em que mantêm o fornecimento seguro de energia como “prioridade máxima”.

Tanto a Alemanha quanto a Holanda examinarão o potencial de novos parques eólicos offshore híbridos no Mar do Norte.

No hidrogênio, o gabinete do clima apresentou uma chamada conjunta para financiamento de projetos de hidrogênio verde e química verde. O volume previsto é de cerca de dez milhões de euros, metade fornecido pela Alemanha e Holanda.

Com isso, o governo holandês se lança na iniciativa alemã H2Global, para impulsionar o investimento na tecnologia, associada à compra do energético.