Gás Natural

Distribuidoras vão às compras em 2022 com menos gás privado e preços mais altos

Concessionárias buscam até 9 milhões de m³/dia no mercado e tentam reduzir dependência da Petrobras

Compagas contrata novos supridores, mas corte da Bolívia atrasa planos. Na imagem, citygate (ponto de entrega de gás) da Compagas, distribuidora de gás natural do Paraná (Foto: Compagas/Divulgação)
Citygate (ponto de entrega de gás) da Compagas, distribuidora de gás natural do Paraná (Foto: Compagas/Divulgação)

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Editada por André Ramalho
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PIPELINE Distribuidoras buscam até 9 milhões de m³/dia no mercado. Concessionárias tentam reduzir dependência da Petrobras, mas esbarram em limites na oferta de produtores privados. E cenário de preços é adverso.

Eneva e bp miram distribuição de GNL de pequena escala. E PetroReconcavo planeja expansão da infraestrutura de processamento. E mais. Confira:

Distribuidoras buscam até 9 milhões de m³/dia

Ao menos oito distribuidoras estão em busca de novos fornecedores de gás natural e correm contra o tempo para fechar contratos para 2023.

As concessionárias querem até 9 milhões de m³/dia. A pergunta é se haverá gás suficiente dos novos supridores para toda essa demanda. E em que condições de preços esse gás chegará.

Embora o mercado brasileiro tenha dado sinais concretos de abertura nos últimos 12 meses, o cenário atual é adverso nesta nova janela de comercialização de gás.

Do lado da oferta, falta molécula nova e produtores privados de gás nacional têm, hoje, menos volumes disponíveis para negociar com as concessionárias – sedentas, por sua vez, por reduzir a dependência do gás da Petrobras, hoje mais caro que o dos concorrentes.

Já o atraso na entrada em operação do Rota 3 e o choque global dos preços do gás natural liquefeito (GNL) tendem a jogar pressão sobre os novos contratos.

A tendência é que as concessionárias consigam negociar preços mais altos do que aqueles fechados há um ano atrás.

A falta de gás novo

Na visão do CEO da consultoria Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto, o mercado brasileiro tende a vivenciar, neste fim de ano, “uma reciclagem de contratos”.

O que sobra, da parte dos novos fornecedores, é a recontratação de volumes que ficarão descontratados na virada do ano, enquanto falta gás novo no mercado.

“É uma situação desafiadora para as distribuidoras. Os novos fornecedores já têm seus volumes, em sua maior parte, contratados para 2023-2024”, afirma.

Segundo ele, a partir de 2024, à medida que o gás novo do Rota 3 entre no mercado e que contratos relevantes em vigor entre distribuidoras e supridores vençam, pode haver uma mudança maior no jogo.

Acompanhe a nossa cobertura sobre os avanços do Novo Mercado de Gás: eixos.com.br/gas

Os efeitos da crise do GNL

O agravamento da guerra na Ucrânia, o corte de gás russo à Europa e a proximidade do inverno no Hemisfério Norte colocam pressão sobre os preços no spot. E, embora a maior parte do mercado brasileiro seja abastecido por gás nacional, o GNL impacta os preços internos.

No fim de 2021, a Petrobras ajustou os termos dos contratos com as distribuidoras e aumentou os preços do gás, justamente sob a alegação de que GNL estava mais caro.

Em diferentes estados, as distribuidoras locais judicializaram a questão. A petroleira, aliás, vinha renegociando contratos com algumas concessionárias nos últimos meses, mas interrompeu as conversas.

Em geral, o gás vendido pela Petrobras se tornou mais caro que o gás dos novos fornecedores e as distribuidoras intensificaram a busca por opções.

A conselheira da FGV Energia, Ieda Gomes, acredita que a crise global do GNL pode contaminar, em certa medida, os preços domésticos nas novas negociações – seja com a Petrobras, seja com novos supridores.

“Existem contratos [de novos fornecedores] com descontos relativamente interessantes em relação ao gás da Petrobras, mas há uma tendência de se elevar os preços”, diz.

Embora o gás nacional não tenha nenhuma influência sobre o preço internacional, a tendência de precificação [no mercado] é pelo custo marginal da última molécula que entra no sistema [o GNL]”.

Assista à entrevista com Ieda Gomes no Backstage Rio Oil & Gas 2022 

A PetroReconcavo já sinalizou, por exemplo, que buscará precificar melhor o seu gás no mercado. “Temos levado isso [exposição maior do Nordeste à importação de GNL] na nossa formação de preços”, disse o diretor de Regulação e Novos Negócios da companhia, João Vítor Moreira.

Isis Marinho, analista de gás, energia e soluções climáticas da S&P Global Commodity Insights, destaca, por sua vez, que a entrada de novos fornecedores pode ajudar a consolidar, no Brasil, novas fórmulas de precificação que reduzam a exposição do mercado doméstico aos preços internacionais – seja do GNL ou Brent.

“À medida que mais contratos de fornecimento são negociados ou renegociados, preços fixos ou mesmo a inclusão de níveis de preços mínimos/máximos nos contratos podem ajudar a dissociar o mercado brasileiro de gás da volatilidade internacional”, disse.

O diretor técnico da Origem Energia, Nathan Biddle, relativiza o impacto dos preços do GNL. A companhia trabalha com pisos e tetos de preços em seus contratos. “O mercado nacional sempre será mais competitivo que a importação de GNL, especialmente no onshore. Não temos muita preocupação com o preço do GNL”, afirmou.

Assista Nathan Biddle no epbr entrevista

O copo meio cheio

Para analistas da S&P Global Commodity Insights, os preços mais altos do GNL no mercado global podem de converter numa janela de oportunidades para o aumento da produção de gás nacional.

“O atual contexto internacional pode ser um catalisador para a nova evolução do mercado de gás. Isso torna o desenvolvimento de ativos de gás não associado relativamente mais competitivo, tanto no Brasil quanto na vizinha Argentina, e isso pode contribuir para a diversificação da oferta”, afirma Marcela Rosas, diretora de Análise, Gás, Energia e Soluções Climáticas.

Por outro lado, diz Rosas, a tendência de queda nas importações bolivianas e os atrasos na expansão dos gasodutos de escoamento do pré-sal preocupam.

Quem tem gás para vender?

Um dos candidatos naturais a suprir parte da demanda das distribuidoras, nas chamadas públicas deste fim de ano, é a Equinor — cujo único contrato de suprimento, com a Bahiagás, vence em 2022.

A companhia já está em negociações para realocar os volumes do campo de Roncador (Bacia de Campos) no mercado e conversa, inclusive, com potenciais consumidores livres. São ao menos 350 mil m³/dia.

Numa perspectiva de mais longo prazo, a companhia também tenta tirar do papel o projeto do BM-C-33 (Pão de Açúcar), na Bacia de Campos. A decisão final de investimento no ativo, de 16 milhões de m³/dia, deve ocorrer em breve.

A Shell também terá parte de seu gás descontratado. Na virada do ano, haverá uma redução de 740 mil m³/dia nos compromissos de entrega à Bahiagás.

A petroleira, contudo, espera começar a fornecer gás à termelétrica Marlim Azul, em Macaé (RJ), e não está claro, ainda, qual será o volume disponível da multinacional neste momento para outros clientes.

Entre os produtores onshore, a Origem Energia já sinalizou que será conservadora nesta janela e que está confortável com os compromissos já assumidos com a Bahiagás e Algás.

A PetroReconcavo, por sua vez, tem cerca de 350 mil m³/dia excedentes – negociados hoje em contratos flexíveis PUT (opções de venda).

A companhia tem como estratégia deixar parte de seu volume livre para contratos flexíveis, mas não descarta alocar os volumes disponíveis em acordos de gás firme.

Tudo dependerá, ao fim, das condições de preços oferecidas nas diferentes modalidades – e no mercado livre. A companhia vê a Braskem, Unigel e Acelen, na Bahia, como potenciais compradores de seu gás.

Entre supridores de GNL, a Excelerate Energy vê nas chamadas públicas deste fim de ano uma oportunidade para buscar seus primeiros contratos com as distribuidoras.

Em 2021, não conseguiu fechar negócio. Mas acredita que, dessa vez, com o amadurecimento gradual do setor, o desfecho pode ser mais favorável. A empresa oferece contratos de garantia de suprimento – uma espécie de “seguro” que as companhias contratam para garantir a continuidade das operações em casos de falhas de suprimento.

A Compass também inaugura em 2023 o terminal de GNL de São Paulo. Nas negociações com a Arsesp, para um acordo sobre a classificação do gasoduto Subida da Serra, porém, a ANP propõe manter a conexão do duto da Comgás ao terminal de regaseificação sob a condição de que o Subida da Serra não entregue gás a outras concessionárias.

Caso da Naturgy preocupa

A tendência é que o mercado do Rio se mantenha dependente da Petrobras. Na prática, a Naturgy está, hoje, sem contrato e precisa de 7,2 milhões de m³/dia, para as demandas da CEG e CEG Rio.

A distribuidora conseguiu manter as condições do contrato vencido e 2021 – mais favoráveis – por força de uma liminar que hoje é alvo de uma tentativa de conciliação na Justiça.

A oferta de capacidade existente da malha de gasodutos da NTS, até o fim do ano, tende a facilitar o acesso de novos supridores ao mercado do Rio. Porém, há pouco espaço, entre os produtores nacionais para volumes desse tamanho.

Além da Naturgy, também estão atrás de gás, hoje, a Sulgás (RS), SCGás (SC), Compagas (PR), Bahiagás (BA), Sergas (SE), Potigás (RN) e Gasmig (MG).

O receio, entre as concessionárias, é que, diante da alta do gás no mercado internacional, a conta fique cara. A Petrobras já sinalizou que a última oferta – de indexar o gás a 16,75% do Brent — está defasada.

Além disso, a Petrobras entende que tem o direito de receber — das concessionárias que judicializaram seus contratos — o valor pelo período em que foi impedida de reajustar o gás.

Cobra R$ 130 milhões da SCGás e R$ 300 milhões da Cegás. No caso da Naturgy, a estimativa é que esse passivo possa chegar a bilhões de reais. Procurada, a Naturgy preferiu não comentar.

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O GÁS NA SEMANA

PetroReconcavo planeja ampliar capacidade de processamento

Com aumento projetado de 70% da produção de gás até 2026, para 2,5 milhões de m³/dia, prepara investimentos na expansão da infraestrutura de processamento. UPGN de Catu (BA) começará a dar sinais de estresse da capacidade em 2024.

bp quer GNL de pequena escala no Brasil em 2024

Planos envolvem uma planta de 2,4 milhões de m³/dia no Porto do Açu (RJ). Empresa negocia a formação de uma joint venture para o mercado brasileiro. A companhia mira mercados no Sudeste e Sul da Bahia.

E Eneva mira small scale a partir de Sergipe

Já está investindo R$ 980 milhões num projeto de liquefação de gás natural do complexo do Parnaíba (MA) para atender Vale e a Suzano. O plano, agora, é explorar oportunidades de GNL em outros estados, a partir do terminal comprado da Celse, em Sergipe.

Rota 3 fica para 2024

Projeto contribuirá com até 5 milhões de m³/dia, inicialmente. De acordo com o diretor de exploração e produção da Petrobras, Fernando Borges, a capacidade plena do gasoduto de escoamento, de 21 milhões de m³/dia, só será atingida no médio e longo prazos.

NTS recebe aval da ANP para oferta de capacidade

Espera ofertar, este ano, 12 milhões de m³/dia de saída. Estima que, desse total, cerca de 5 milhões de m³/dia estejam disponíveis em São Paulo. A oferta deve ocorrer via chamada pública, simultaneamente com a chamada incremental do Gasig.

TAG prevê investir R$ 5 bi em novos gasodutos para térmicas

A Transportadora Associada de Gás (TAG) tem acordos, para expansão da malha no Norte e Nordeste, com empreendedores cadastrados no primeiro leilão dos 8 GW em termelétricas compulsórias previstas na lei de privatização da Eletrobras, marcado para sexta.

TCU questiona Aneel sobre térmicas da Âmbar Energia

Tribunal deu 15 dias para que a agência esclareça a decisão que permitiu à empresa do grupo J&F substituir quatro usinas emergenciais (cujas entregas atrasaram) pela UTE Mário Covas, já em operação. Folha de S. Paulo

Com Vaca Muerta, Argentina pode chegar à autossuficiência em 2024

Anúncio foi feito por Omar Gutierrez, governador da província argentina de Neuquen, onde está localizada a área. O investimento total previsto para explorar plenamente o potencial de gás não convencional da região é de US$ 200 bilhões, dos quais US$ 30 bilhões já foram realizados. [Valor]

Europa se aproxima de gás do Oriente Médio

A alemã RWE contratou cargas de GNL com a Abu Dhabi National Oil Company. A quantidade é pequena (137 mil m³), mas o esforço geopolítico é expressivo: o chanceler Olaf Scholz busca no Golfo Pérsico alternativas para assegurar o suprimento de energia [Reuters]

Danos em gasodutos que abastecem Europa podem ser irreversíveis

Alerta foi dado por agência reguladora de combustíveis da Alemanha que investiga as explosões ocorridas nos gasodutos Nord Stream I e II, que ligam Rússia à Europa [Valor]. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, chamou de “estúpidas” as acusações de que a Rússia está por trás do vazamento nos gasodutos. [g1]