BRASÍLIA — O programa detalhado de Lula deve prever a inclusão de metas de redução da emissão de carbono na política de contratação de novas usinas para geração centralizada de energia centralizada.
“Vincular toda a contratação de energia nova no Sistema Interligado Nacional (SIN) às metas de redução de emissões de gases de efeito estufa do setor elétrico”, diz a proposta.
Consta em documento entregue pela ex-ministra do Meio Ambiente, candidata a deputada federal por São Paulo, Marina Silva (Rede) ao ex-presidente nesta segunda (12), com pontos para serem aplicados na agenda ambiental e social de um eventual governo do petista.
Na carta, Marina sugere adoção de outras medidas, como a implementação do mercado de carbono no Brasil e a criação de uma Autoridade Nacional de Segurança Climática, responsável por fiscalizar as metas e ações para descarbonização no país.
“É necessário promover o alinhamento das políticas públicas, em especial as políticas econômicas, fiscal, tributária, industrial, energética, agrícola, pecuária, florestal, da gestão de resíduos e de infraestrutura, aos objetivos gerais do Acordo de Paris”, diz a candidata no documento.
Negociação por plano de governo
A inclusão dos tópicos no programa de governo fez parte das tratativas para que a ex-ministra declarasse apoio à Lula — endosso que veio a público nesta segunda.
Durante a coletiva – há 20 dias do primeiro turno –, Aloízio Mercadante, responsável pela elaboração do programa de Lula, assegurou que a campanha irá trabalhar para “ver como operacionalizar e incorporar” as propostas.
Lula pontuou que o programa — a que chamou de “ousado” — são metas a serem buscadas em todo o governo, mas que a implementação depende de uma série de fatores políticos.
“Será colocado em prática na medida que a gente tome posse, na medida em que a gente mude lei […] O programa da Marina é uma proposta plenamente possível de ser colocada em prática. Não é proposta para um mês ou um ano, mas é uma a ser trabalhada e perseguida”, disse.
“Não haverá no nosso governo política de ministro. A política ambiental será de forma transversal. Ou seja, todos os ministros terão obrigação com a questão climática“, declarou ainda Lula.
O foco da política ambiental de maneira transversal e integrada é pauta de Marina Silva desde que foi ministra do Meio Ambiente na gestão de Lula, entre 2003 e 2008.
Divergências políticas com outros integrantes da Esplanada, especialmente com Dilma Rousseff à frente do Ministério de Minas e Energia, esbarraram na pasta de meio ambiente e inviabilizaram a implementação de algumas das propostas de Marina para o setor.
Metas de descarbonização nos leilões e mercado de carbono
Apesar de estudar mecanismos de valoração dos benefícios ambientais das fontes de energia, o governo não estabeleceu alguma política pública para vincular as metas de descarbonização para o setor elétrico com leilões de energia nova.
As ações de redução de emissões de gases do efeito estufa são feitas individualmente pelas empresas como parte das agendas de sustentabilidade.
O documento lista a necessidade da implementação do mercado de carbono no Brasil, com “salvaguardas ambientais” e geração de créditos pela redução de emissões por desmatamento.
Não dá detalhes, mas indica apoio a um mercado regulado e obrigatório de carbono — proposta que encontra resistência no atual governo.
O ministro Joaquim Leite defende que o mercado brasileiro seja voluntário e desenhado a partir de metas setoriais — ou seja, pacificadas entre os próprios segmentos produtivos.
A ideia tem resistência das próprias empresas com interesse em ingressar no mercado. Elas pedem um maior detalhamento na legislação para que seja possível uma previsibilidade maior dos investimentos.
Por conta disso, o governo não conseguiu apoio político para aprovar no Congresso o PL 528/2021 para regulamentar o mercado de carbono, parado desde maio deste ano na Câmara dos Deputados.
Política climática internacional
Em agosto, Lula já havia defendido que o Brasil deve atuar para fortalecer o papel das Organizações das Nações Unidas (ONU) como mediadora de políticas climáticas regionais. “O acordo de Paris até hoje não foi cumprido por muita gente”, afirmou. “É preciso que haja responsabilidade e aí tem que ter governança mundial mais forte”, comentou.
“Nós defendemos uma ONU fortalecida, com a participação de outros países e com poder de decisão, sobretudo na questão climática, senão a gente vai ficar fazendo discurso e não vai cumprir”, disse.
A articulação internacional envolveria, na visão do candidato, ações locais, de desenvolvimento da Amazônia. “O que nós queremos é tirar proveito da biodiversidade para gerar melhores condições de vida por povos que moram na floresta, e não apenas na Amazônia brasileira, mas na venezuelana, colombiana, equatoriana”.
É um contraponto a defesa feita por Jair Bolsonaro (PL) ao longo de todo o seu governo, em que a “soberania” — em um contexto de futuras ameaças ao território — justificaria a exploração e ocupação da região pelo agronegócio, mineração e outras atividades econômicas, incluindo o garimpo, chamada oficialmente pelo Ministério de Minas e Energia de ‘mineração artesanal’.
“Muitas vezes nos sentimos ameaçados em nossa soberania nessa região, mas o fato é que o Brasil preserva muito bem o seu território”, já disse o presidente, em encontro com o presidente americano, Joe Biden.