Energia

Biogás: chegou a hora de investir

Investimentos em biogás e biometano têm vasta demanda e ambiente seguro e amigável para desenvolvimento

PDE 2031 elege biogás e SAF como rotas para descarbonizar transportes. Na imagem: Planta de produção de biometano, com câmaras de armazenamento e chaminés (Foto: Divulgação Aggreko)
No caso do biogás do setor sucroenergético, o PDE 2031 projeta uma maior inserção na matriz, tanto para geração elétrica, quanto para substituir o diesel (Foto: Divulgação Aggreko)

O setor de biogás no Brasil segue crescendo em ritmo acelerado. A publicação Panorama do Biogás no Brasil – 2021, elaborada pelo CIBiogás (Centro Internacional de Energias Renováveis–Biogás) indica que em 2017 havia em operação no Brasil 271 plantas de biogás, sendo que, deste total, 51 plantas eram novas. Em 2021, por sua vez, o número total de plantas de biogás em operação saltou para 755 — sendo que, deste total, 102 plantas eram novas.

Neste mesmo período, a produção de biogás no Brasil saltou de 1,12 bilhão para 2,35 bilhões de metros cúbicos. No entanto, por ser uma fonte de energia extremamente atrativa do ponto de vista ambiental, foram anunciados recentemente diversas iniciativas e medidas para conferir a segurança necessária e fomentar um desenvolvimento ainda maior do setor.

Iniciativas regulatórias recentes de fomento

O ambiente de negócios para investimentos no setor de biogás vem se tornando cada vez mais favorável. A Lei nº 14.134/2021 (Nova Lei do Gás) e o seu regulamento, Decreto nº 10.712/2021, estabelecem que qualquer gás que não se enquadrar na definição de gás natural estabelecida na lei tenha tratamento equivalente, desde que
aderente às especificações estabelecidas pela ANP — o que é o caso do biometano — criando assim segurança jurídica para os negócios que podem se utilizar da base legal e regulatória do gás natural.

Em março, a Presidência da República publicou o Decreto nº 11.003/2022, que institui a Estratégia Federal de Incentivo ao Uso Sustentável de Biogás e Biometano. A Estratégia tem os seguintes objetivos: incentivar programas e ações para reduzir as emissões de metano; fomentar o uso de biogás e biometano como fontes renováveis de energia e combustível; e contribuir para o cumprimento dos compromissos assumidos pelo país em convenções internacionais afetas ao tema.

Em atendimento ao referido decreto, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) publicou em 22/03/2022 a Portaria MMA nº 71, que institui o Programa Nacional de Redução de Metano, apelidado de Programa Metano Zero.

Dentre as medidas a serem desenvolvidas pelo programa, se destacam: linhas de crédito e financiamento específicas para, entre outras ações:

  • implantação de biodigestores;
  • implantação de sistema de purificação de biogás, produção e compressão de biometano;
  • criação de pontos e corredores verdes para abastecimento de veículos pesados movidos a
    biometano, tais como ônibus, caminhões e máquinas agrícolas;
  • alavancagem da utilização ou desenvolvimento da tecnologia veicular;
  • desoneração tributária para infraestruturas relacionadas com projetos de biogás e biometano.

Terá grande relevância no programa a criação do mercado de créditos de carbono gerados pela redução das emissões de metano oriundas dos resíduos orgânicos, bem como pela emissão evitada de carbono com a substituição de combustíveis fósseis.

Na esfera estadual, é importante mencionar que diversos estados possuem leis que estabelecem políticas públicas para o biogás e biometano. Alguns estados estabeleceram a obrigação de que parte do suprimento de gás das concessionárias deve ser atendida por biometano.

Cobrimos por aqui

Além dos programas publicados, está tramitando na Câmara de Deputados o Projeto de Lei nº 3.865/2021, que institui o Programa de Incentivo à Produção e ao Aproveitamento de Biogás, de Biometano e de Coprodutos Associados (PIBB). No Senado Federal, por sua vez, tramita o Projeto de Lei nº 302/2018, que cria incentivos
às empresas que produzem biogás, metano e energia elétrica a partir de resíduos sólidos em aterros sanitários.

Na perspectiva ambiental, ressaltamos que o Plano Nacional de Resíduos Sólidos estabelece diretrizes, metas e estratégias para a produção de biogás e biometano, uma vez que tal produção além dos benefícios energéticos, ainda oferece tratamento adequado para resíduos sólidos urbanos e rurais, favorecendo ainda mais a necessidade destes empreendimentos.

Assim, tais empreendimentos trazem um benefício duplo para a sociedade, posto que geram energia e ainda solução para o tratamento dos resíduos gerados pelas populações urbanas e rurais.

É sempre oportuno lembrar que os empreendimentos para a produção de biogás e biometano tem papel importantíssimo na descarbonização de emissões, uma vez que a sua pegada de carbono é significativamente menor que as fontes de energia conhecidas, o que inclui os combustíveis fósseis e outras fontes renováveis.

Outras medidas de incentivo

Além do fomento trazido pela legislação, é importante observar diversas outras características que favorecem os investimentos no setor de biogás e biometano. Destacamos:

  • demanda crescente de biogás e biometano;
  • incentivos específicos nos leilões de energia promovidos pela Aneel;
  • viabilidade técnica e econômica para projetos de pequena, média ou grande capacidade;
  • geração de eficiência energética para empreendimentos associados a outros tipos de produção;
  • possibilidade de captação de receitas de longo prazo por meio de contratos longa duração, cujo formato dependerá das características do empreendimento;
  • receitas oriundas da venda de créditos de metano, cujo mercado será regulado em breve;
  • receitas com a venda de CBIOs para a produção de biometano que seja destinado à distribuição de combustíveis; receitas com venda de biofertilizantes.

Financiamento

Se não bastasse, existem diversos incentivos para financiamento de plantas de biogás e biometano que podem ser realizados com recursos públicos, sendo o principal deles o Fundo Clima, que oferece recursos reembolsáveis ou não reembolsáveis, conforme as características do empreendimento. O financiamento de recursos reembolsáveis é oferecido com termos bastante competitivos.

Além disso, para facilitar o oferecimento de garantias para o financiamento pelo Fundo Clima, está sendo criado o Fundo Garantidor do Biogás que reduz o risco de crédito e, por conseguinte, a taxa de juros do financiamento.

Possíveis estruturas

Outro importante aspecto a ser considerado nos investimentos em plantas de biogás ou biometano é a flexibilidade nos modelos de negócios que estruturam os empreendimentos. Há possibilidade de se estruturar projetos que se inserem na cadeia de valor do próprio empreendedor ou de projetos em parceria com terceiros,
com diversos formatos contratuais. Os modelos podem combinar a participação de vários agentes, de modo a distribuir a participação de capital próprio e diluir os riscos.

Os modelos de negócio podem contemplar empreendedores rurais e empresas do setor de energia bem como indústrias e agentes financeiros que tenham interesse em tornar mais “verde” seu portfólio de ativos ou operações.

Por todos esses motivos, segundo a publicação Panorama do Biogás no Brasil – 2021, citada anteriormente, o potencial teórico da produção de biogás é de 84,6 bilhões de metros cúbicos por ano — quantidade esta que seria suficiente para suprir 40% da demanda interna de energia elétrica e 70% do consumo de diesel. Há
portanto, um vasto potencial a ser explorado.

A produção em larga escala de biogás e biometano é uma realidade em diversas partes do mundo. Segundo a publicação Biogas: Pathways to 2030 feita pela World Biogas Association em março de 2021, em 2018 a produção na Europa foi de 209 TWh, na China de 84 TWh e nos Estados Unidos foi de 42 TWh.

No Brasil, entretanto, a produção foi de somente 0,42TWh. Tais dados evidenciam o potencial de
crescimento para investimentos em biogás.

Em resumo, os investimentos em biogás e biometano têm vasta demanda, um ambiente seguro e amigável para desenvolvimento e flexibilidade comercial e financeira para sua estruturação, razão pela qual podemos dizer: Chegou a hora de investir.

Paulo Campos Fernandes e Juliana Pizzolato Furtado Senna são advogado e sócia, respectivamente, do escritório Kincaid Mendes Vianna Advogados