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Petróleo e gás: uma agenda para o setor

Importante propulsor da economia, só em E&P, projeta-se entre 2023 e 2030 inversões de US$ 175 bilhões e geração de 570 mil empregos por ano

Na imagem: plataforma para exploração e produção offshore de petróleo e gás (Foto: Divulgação/Ineep)
Plataforma para exploração e produção offshore de petróleo e gás (Foto: Divulgação/Ineep)

A magnitude dos investimentos do setor de petróleo e gás natural o coloca como importante propulsor da economia brasileira.

Só em exploração e produção (E&P), projeta-se para o período de 2023 a 2030 inversões de US$ 175 bilhões e a geração de 570 mil postos de trabalho diretos e indiretos a cada ano, segundo dados coligidos pelo Instituto Brasileiro do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (IBP).

Além dos vultosos recursos que estimulam a atividade econômica e guardam uma correlação direta com o desenvolvimento do país, o setor responde por 46% da oferta interna de energia do Brasil.

Essa notável influência se espraia sobre variados segmentos e atividades econômicas, desde a cadeia fornecedora de bens e serviços, passando pelas áreas de pesquisa e desenvolvimento (P&D), arrecadação dos entes federativos — União, estados e municípios –, comércio internacional, entre outros.

De acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o setor pagou, nos últimos 11 anos, R$ 2,1 trilhões de tributos, ICMS, royalties, participações especiais e bônus de assinatura.

No ano passado nos tornamos o oitavo maior consumidor e o oitavo maior produtor de petróleo do mundo.

As transações comerciais da indústria do petróleo do Brasil com o exterior são muito relevantes para a nossa balança comercial e têm alcançado uma média de quase 12% do fluxo de comércio do país nos últimos 13 anos.

Para se ter uma ideia, o petróleo bruto foi o terceiro produto mais exportado pelo Brasil em 2021, gerando receita superior a US$ 30 bilhões.

E&P marcado por reformas

O setor viveu muitas mudanças legais e regulatórias nos últimos anos, além de um processo de desconcentração importante.

O programa de desinvestimento da Petrobras tem alterado de forma considerável a estrutura de mercado do segmento, promovendo a competição, gerando novos investimentos e empregos e aumentando a arrecadação de impostos e de royalties.

No E&P a estatal segue líder, agora compartilhando protagonismo com companhias que surgiram ou cresceram a partir de seu desinvestimento, caso da Eneva, PetroRio, 3R, PetroReconcavo, Trident, Cobra, Origem, Perenco e Seacrest, entre outras. Além de maior diversidade e concorrência, o movimento está transformando a economia regional, com resultados expressivos, como um rápido aumento da produção em campos com curva descendente.

No mar, para ficar no exemplo da Bacia de Campos, onde a produção vinha despencando por falta de investimentos, doze ativos vendidos pela Petrobras receberão, no mínimo, R$ 11 bilhões dos novos operadores, podendo alcançar o dobro desse valor se o resultado de suas atividades for promissor.

O caso da PetroRio ilustra bem essa realidade.

A companhia, que apresentava significativo crescimento e produzia 32 mil barris/dia nos campos de Frade, Polvo e Tubarão Martelo, vai aumentar esse número em 70% com a compra de Albacora Leste.

A Trident, operadora de Pampo e Enchova, conjunto de 10 campos, dobrou a produção desses ativos.

Em terra um exemplo positivo foi a venda à Eneva, em 2019, de Azulão, na Bacia do Amazonas, por R$ 300 milhões. Antes inativo, o campo hoje produz gás natural que alimenta uma térmica para geração de energia elétrica em Roraima, com investimentos de R$ 1,9 bilhão.

A Petrorecôncavo, por sua vez, consolidou e vem ampliando um modelo exitoso de atuação que já lhe permite produzir cerca de 20 mil barris/dia e a coloca como uma das protagonistas na produção onshore.

Venda dos ativos de gás natural

No gás natural, a estatal promoveu uma grande desconcentração através do termo de cessação de conduta com o Cade.

A venda da Nova Transportadora do Sudeste (NTS) para a Brookfield por R$ 18 bilhões e da Transportadora Associada de Gás (TAG) para a Engie por R$ 33 bilhões, além de auxiliar a Petrobras a abater suas dívidas, dinamizou novos investimentos.

A venda do controle da Gaspetro, que potencialmente ampliaria a diversidade de agentes na cadeia da distribuição, parece caminhar para manter elevado grau de concentração, apenas mudando de mãos, o que exige o fortalecimento institucional da ANP, para que a independência de seu processo decisório seja preservada e prestigiada.

Adicionalmente, o novo marco legal do gás, aprovado ano passado, projeta importantes investimentos e geração de empregos, com possibilidade de redução de preço após o fim da guerra e a reorganização do mercado de energia, desmantelado pela pandemia de covid-19.

Demora no downstream

Esse dinamismo tem demorado a chegar ao refino. Embora tenha aberto o mercado há 20 anos, o Brasil ainda tem poucos importadores ou exportadores de petróleo e derivados e apenas uma refinaria (Acelen, antiga RLAM, recentemente vendida pela Petrobras) e quatro microrrefinarias privadas.

Adicionalmente, não houve a necessária expansão do refino, o que tornou o abastecimento do país caro e dependente de importações. Hoje, cerca de 25% das nossas necessidades de diesel e 10% das de gasolina são atendidas via importação.

Ao mesmo tempo, o país exporta 1,4 milhão de barris de petróleo cru ao dia, em um passeio logístico sem qualquer sentido econômico. Essa realidade expõe ainda mais o Brasil ao que se pode chamar de “novos choques do petróleo”.

Num país onde tantos governos já utilizaram a Petrobras como instrumento de controle da inflação, impedindo-a de corrigir preços, a manutenção da presença da empresa como agente dominante cria permanente incerteza, desestimula investimentos e preserva a concentração.

Destravar esse setor estratégico, que vive um momento de baixa rentabilidade no mundo e não comporta riscos elevados, requer superar esse imbróglio.

A soma de avanços tecnológicos, que ampliaram as fronteiras exploratórias e acirraram a competição por investimentos em E&P, e de cenário de transição energética – cujas bases já estão postas –, impõe ao Brasil melhorar seus atributos de atratividade.

Quanto mais atrativo ao investimento é um país, mais espaço ele tem para ampliar a sua parcela no negócio, seja via government take (participações governamentais, como royalties), ou através da internalização de benefícios, como uma política sofisticada de conteúdo local, por exemplo.

Ou seja, parece haver uma correlação entre percepção de atratividade e captura de maior renda, sendo certo que um valor alto inibirá investimentos, ao passo que um patamar abaixo do “valor ótimo” significará perda de receita.

Uma agenda para o setor de óleo e gás

Nessa conjuntura de ascendente concorrência internacional, incerteza sobre o patamar de preços do barril e dúvidas quanto à longevidade do uso dos recursos fósseis como principal fornecedor de energia primária, o Brasil reúne condições únicas de atrair investimentos pela sua potencialidade geológica.

Precisamos, no entanto, ir além da dotação natural que recebemos, criando uma atmosfera de negócios consistentemente atrativa. Nesse sentido, seja quem for o candidato a presidente vitorioso, uma agenda se impõe, onde cabe destacar:

A continuidade do processo de desinvestimento da Petrobras;

Blindagem das agências reguladoras pelo cumprimento rigoroso da legislação, que impede a indicação que pessoas sem vivência nos setores regulados;

Cumprimento, de forma célere, da agenda regulatória da ANP prevista para o biênio 2022-23, com implementação antecipada das regulamentações previstas para a plena operacionalização da Lei da Gás;

O aprimoramento do processo de licenciamento ambiental e de planejamento de oferta de blocos;

O estímulo à atratividade da exploração e produção em novas fronteiras, áreas de acumulação marginal e campos maduros;

O estímulo à atratividade da exploração e produção de recursos não convencionais, segmento onde estamos atrasados pelo menos 20 anos;

Seguir na simplificação e adaptação da tributação do setor de gás natural, à luz da nova estrutura de mercado;

A continuidade do processo de desverticalização do setor de gás, assegurando a separação entre atividades reguladas e atividades competitivas;

A continuidade da desconcentração da atividade de refino, única saída consistente para construir um mercado competitivo, com multiplicidade de agentes, diversidade de modelos de negócio e preços alinhados ao mercado internacional.