Com agências internacionais — O presidente da Rússia, Vladimir Putin, ordenou durante a madrugada desta quinta (24/2) uma operação militar em Donbass, região central do conflito na Ucrânia, em razão da presença de grupos separatistas pró-Rússia. O conflito levou o barril do petróleo a superar os US$ 100.
Putin desafiou o Conselho de Segurança da ONU, que se preparava para uma segunda reunião após o governante russo reconhecer a independência das repúblicas de Donetsk e Luhansk, na região de Donbass.
Explosões foram ouvidas, contudo, em outras regiões do país, incluindo a capital Kiev, elevando temores que a investida russa se estenderá além da fronteira leste, onde se concentram os movimentos separatistas.
Moscou também ordenou a retirada da embaixada russa em Kiev.
Com informações da Reuters, AFP, EFE e CNN
“É tarde demais”
“É tarde demais. O presidente russo declarou guerra”, afirmou o embaixador ucraniano no conselho, Sergiy Kyslytsya. “É responsabilidade deste conselho parar essa guerra. Então, peço a cada um de vocês: façam todo o possível para parar essa guerra”.
As agências de notícias russas RIA-Novosti e Interfax reproduziram uma afirmação de Putin que “os conflitos entre a Rússia e as forças ucranianas são inevitáveis, é apenas uma questão de tempo”, segundo informações da Reuters.
Os países-membros da OTAN no Conselho de Segurança falam em condenações nos “mais duros termos”; o presidente americano, Joe Biden, classificou o ataque de “injustificável”.
“Uma guerra premeditada que trará perdas catastróficas de vidas e sofrimento humano”, disse.
O Conselho de Segurança da ONU e a OTAN voltarão a se reunir e líderes do G7 devem decidir nesta quinta (24/2) por novas sanções à Rússia.
Essa semana, a OTAN também afirmou que mantém recursos militares em “alerta máximo”. Desde a anexação da Crimeia pela Rússia em 2014, a Ucrânia acelerou a aproximação com o Ocidente, mas a entrada na aliança do Atlântico Norte não foi concluída.
A intenção é um dos motivos da escalada do conflito por parte da Rússia.
Brent chega a US$ 100 por barril
Logo após o acirramento do conflito, o barril do petróleo Brent negociado no mercado futuro ultrapassou a marca de US$ 102, uma alta de quase 5%.
A commodity não superava essa marca desde 2014, ante sala da derrocada dos preços do petróleo de 2014-2016, provocada por sobreoferta, a disparada da produção dos EUA e o baixo crescimento de emergentes.
Guterres: economia global sofrerá com guerra na Europa
O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, apelou aos efeitos devastadores que uma guerra na Europa pode causar à população mundial, além das fronteiras da Rússia e da Ucrânia.
Em especial, países que sofrem para se recuperar dos impactos da pandemia de covid-19.
“[Essa] recuperação será muitíssimo difícil com os altos preços do petróleo, do fim das exportações de grãos da Ucrânia e com os aumentos dos juros causados pela instabilidade nos mercados internacionais”.
“Esta guerra não faz sentido”, disse Guterrez.
Ele classificou a possível escalada para um conflito generalizado no país do Leste Europeu de o “que pode ser a pior guerra desde o início do século”.
“[Haverá] consequências não apenas devastadoras para a Ucrânia, não apenas trágicas para a Federação Russa, mas um impacto que nem sequer podemos antever, em relação aos efeitos para a economia global”.
Alemanha veta Nord Stream 2
A resposta ocidental à beligerância russa afetará também o mercado global de gás.
No momento em que a Europa começava a enxergar o alívio nos preços da energia, com o fim do inverno, novas rodadas de sanções contra Moscou vão provocar um choque na oferta do energético.
Essa semana, o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, anunciou que a operação do Nord Stream 2 será obstruída.
O consórcio liderado pela Gazprom, com participação de empresas de energia ocidentais, estava prestes a finalizar a duplicação da rota de escoamento de gás da Rússia para a Alemanha.
Europa tem gás para sustentar crise no curto prazo
A duração dos conflitos e sanções podem provocar, portanto, um desequilíbrio futuro do mercado, mas no curto prazo, a conjuntura não indica uma escalada dos preços locais tal qual ocorreu no auge do inverno europeu.
“Se as exportações russas para a Europa forem interrompidas, as coisas podem obviamente ficar muito piores [no fim de 2022]”, explica Kateryna Filippenko, analista-chefe do mercado de gás da Europa da Wood Mackenzie.
A consultoria ressalta que as próprias rotas terrestres, que passam pela Ucrânia e Polônia, vinham operando abaixo da capacidade máxima.
Nesse cenário, os desdobramentos vão além das fronteiras da Europa.
“A Europa pode ser capaz de lidar com as rupturas de abastecimento se estas forem limitadas ao transporte pela Ucrânia”, diz.
“Teria que usar todos os recursos para manter as luzes acesas – reduzir a queima de gás e dar partida em usinas nucleares e a carvão mofadas; maximizar a produção interna de gás; persuadir compradores asiáticos a usar carvão e liberar o GNL [para o mercado internacional]”.
A consultoria não espera, contudo, um choque imediato no balanço do mercado europeu.
“O clima ameno e o aumento do fornecimento de gás natural liquefeito (GNL) atenuaram o impacto dos fluxos russos continuamente baixos e resultaram em maiores volumes de gás armazenado”, diz Kateryna Filippenko.
“Em geral, a situação atual de abastecimento e armazenamento significa que a Europa está mais bem posicionada tanto para atravessar 2022 sem o Nord Stream 2, como para se preparar para o próximo inverno”.
O JKM, indicador da Platts para o mercado asiático de GNL, registra cotações próximas de US$ 30/MMBtu para liquidação no curto prazo. No auge da crise de suprimento europeia, o preço de referência chegou a ultrapassar os US$ 40/MMBtu.
O preço do gás termelétrico no grid europeu também vinha recuando consistentemente desde dezembro, ainda que a queda tenha sido desacelerada pela tensão no leste, mantendo os preços em patamares historicamente altos.
Nord Stream 2 é alvo de sanção
Controverso, o projeto liderado pela russa Gazprom conta com investidores ocidentais. Desde o início da estruturação do projeto, em 2019, a Nord Stream 2 AG assinou acordos de financiamento com Engie, OMV, Shell, Uniper e Wintershall Dea.
O CEO do consórcio, Matthias Warnig, foi incluído na lista de pessoas e instituições sancionadas pelo Tesouro dos EUA esta semana.
O mega projeto de mais de US$ 10 bilhões consiste em um gasoduto offshore de 1,2 mil km no Mar Báltico, para duplicar a rota de interconexão entre a Rússia e seu principal importador de gás natural, a Alemanha.
O comissionamento começou em outubro do ano passado.
Desde a sua concepção, é alvo de uma disputa geopolítica entre Rússia e países ocidentais — eles próprios, potenciais supridores de gás para a Europa, como os EUA, que se tornou um exportador de GNL.
O conflito foi mediado pela Alemanha, sob o comando de Angela Merkel e, agora, do social-democrata Olaf Scholz. O país chega a consumir 70% dos volumes de gás natural russo que abastecem a Europa.
“Não podemos aceitar o reconhecimento e por isto é tão importante reagir rápido”, disse Scholz ao anunciar que o consórcio terá sua licença para operar na Alemanha obstruída, impedindo a operação na chegada do gasoduto.