As empresas internacionais que estão se movimentando para instalar plantas de hidrogênio no Ceará vêm demonstrando interesse pela distribuição do combustível para o mercado interno.
“Aí entra a Cegás”, afirma Hugo Figueirêdo, presidente da distribuidora do estado.
O biorrefino, contando com a demanda futura por combustíveis mais limpos para frotas pesadas e aviação, é um dos caminhos para desenvolver atividades industriais na região a partir do hidrogênio.
A Companhia de Gás do Ceará (Cegás) espera ser pioneira na injeção de hidrogênio verde (H2V) na rede de distribuição, tal qual fez com o biometano, em 2017.
“Acreditamos que, da mesma forma que a Cegás foi a primeira a injetar o biometano na rede, seremos a primeira distribuidora a injetar ou ter uma operação de hidrogênio verde 100%. Estamos trabalhando para manter esse pioneirismo que conquistamos no biometano”, afirmou o executivo.
O Ceará vem despontando na corrida pelo desenvolvimento do mercado de H2V no Brasil, com a implementação de um hub de hidrogênio no Complexo Industrial e Portuário do Pecém (CIPP).
Até agora, todos os projetos anunciados visam especialmente a exportação do H2V produzido, aproveitando a conexão existente entre o Pecém e o Porto de Roterdã, na Holanda — principal porta de entrada de combustíveis do continente europeu.
O hub já conta com quatro empresas oficialmente interessadas: Enegix, White Martins, Qair e Fortescue, além de mais de uma dezena de companhias na fila de negociação.
“Alguns operadores europeus estão também olhando para o consumo local e para a interação com a rede atual, não só de distribuição mas também de transporte”, diz Hugo.
O Ceará está na ponta do grid de transporte de gás natural, que conecta a região Nordeste ao Sudeste do país.
Com um terminal de GNL — atualmente desativado — no Porto de Pecém, e a oferta futura de novos energéticos, o executivo enxerga até mesmo a possibilidade de inverter o fluxo do suprimento de gás, a partir do Ceará.
“Eu imagino que lá no futuro mesmo, teremos hidrogênio e biometano na rede (…) Da mesma forma que temos o transporte do gás natural do pré-sal para cá, pode acontecer o inverso com o hidrogênio verde”, afirma o presidente da Cegás.
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Projeto piloto para injeção de H2 na rede
A Cegás já deu os primeiros passos nos estudos de viabilidade de injeção de H2V na rede. Atualmente, a companhia está selecionando, via edital, pesquisadores e empresas interessadas em colaborar no projeto.
As próprias empresas produtoras de hidrogênio verde estão em diálogo com a Cegás para desenvolvimento de um projeto piloto.
“Estamos conversando com vários produtores de hidrogênio verde, não só com os que assinaram os memorandos, mas com os que estão na fila para assinar. Em breve, teremos algumas novidades”.
“Vamos ver se ainda este ano conseguimos anunciar alguma coisa, para de fato ter um modelo piloto operando e possamos fazer as diversas simulações”, diz.
Entre as perguntas a serem respondidas, está o percentual de hidrogênio que a atual rede pode comportar. Ou se serão necessários gasodutos exclusivos.
“Hoje a Cegás conta com redes de aço, poliamida e polietileno de alta densidade. Temos que ver como esses materiais se comportam, além dos ajustes que precisam ser feitos também nos equipamentos da rede, como válvulas, regulagem, medição e estações de transferência, para que se tenha uma operação segura”, explica Hugo.
Ele lembra que mesmo já havendo experiências nos Estados Unidos e Europa, é necessário ver como elas se adaptam à realidade local, o que inclui também considerar o efeito do H2V nos equipamentos dos consumidores.
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Biorrefino é opção para desenvolver demanda industrial
“Aqui no Ceará estamos desenvolvendo o ProQR para instalação de uma refinaria verde, para produção de bioquerosene de aviação. A utilização de hidrogênio de biomassa permitirá a produção dos combustíveis de aviação em locais remotos”, afirma.
O ProQR é um programa do Governo Federal, por meio do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), em parceria com o governo alemão, para desenvolvimento de projetos de combustíveis alternativos sem impactos climáticos para a aviação.
“Certamente, a regulação é um dos gargalos. Não é só fazer a regulação para definir as características do hidrogênio verde, mas a própria injeção e mistura com gás natural. Além disso, as unidades produtoras também deverão ser certificadas, o que é outra etapa, após a regulação”.
Apesar disso, Hugo Figueirêdo acredita que a experiência acumulada com o biometano poderá acelerar esse processo. “Nós sabemos quais passos. A experiência com o biometano ajuda de forma integral”, diz.
Recentemente, o Ministério de Minas e Energia (MME) lançou as diretrizes do Plano Nacional do Hidrogênio (PNH2).
Inclui a produção de hidrogênio por meio de diversas rotas. Atualmente, há duas rotas para produção de H2V. Uma por meio da eletrólise da água com eletricidade de fonte renovável, e outra rota via reforma, a partir de biocombustíveis, como o biometano.
Segundo o presidente da Cegás, a companhia também vê a possibilidade de utilizar o biometano para produção de hidrogênio limpo.
Hoje a companhia distribui 90 mil m³ por dia de biometano, oriundo de aterro sanitário, e espera ampliar ainda mais esse volume, que hoje representa 15% do total distribuído.
A Cegás vem estudando o potencial de outros supridores – não só aterros – como também de estações de tratamento de esgoto no interior do estado. O biogás também pode ser produzido a partir de lodo de esgoto.
“Estamos mapeando o potencial do gás renovável, para fazer um atlas no estilo que o Ceará já possui para solar e eólica. Iremos fazer um para o biometano e também para hidrogênio verde”, conta o presidente da Cegás.
Um das vantagens do biometano é que por ser equivalente ao gás natural, ele pode usar a infraestrutura já utilizada na produção de hidrogênio a partir de gás – o hidrogênio cinza – para produção de hidrogênio verde a um custo competitivo, explica Tamar Roitman, gerente executiva da ABiogás.
“Essa solução do biometano já está pronta. Podemos produzir o hidrogênio usando exatamente a mesma rota do gás”, diz.
A Associação Brasileira do Biogás (ABiogás) calcula que o Brasil tem potencial para produção de 20 mil toneladas por dia de hidrogênio a partir de biometano, ou sete milhões de toneladas por ano.
Dependendo da tecnologia, cada 4 ou 5 metros cúbicos de biometano produzem 1 kg de hidrogênio.
“Com a mistura de biometano no gás natural, a gente já pode ter teores renováveis no hidrogênio. Mas ele pode ser totalmente verde se o gás natural for substituído pelo biometano. É uma substituição totalmente drop-in”, conta Tamar.
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