NESTA EDIÇÃO. EPE mostra que setor de biocombustíveis tem potencial de fornecer quase 200 milhões de toneladas por ano de CO2 biogênico.
Gás de origem renovável é estratégico para viabilizar combustíveis sintéticos, mas também pode ser aproveitado por outras indústrias.
O compromisso encabeçado pelo Brasil na COP30 de quadruplicar a produção e consumo de combustíveis sustentáveis até 2035 tem potencial de mobilizar bilhões em investimentos e alavancar um novo mercado associado à bioenergia: o do CO2 como produto.
Estudo publicado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) aponta que o país tem disponível cerca de 27 milhões de toneladas por ano de CO2 apenas no setor de etanol.
No biogás, cuja escala de produção ainda é pequena, o volume fica em 491 mil toneladas ano, sendo 99 mil toneladas/ano nas plantas em operação e o restante nas unidades com pedidos de autorização.
De acordo com o documento (.pdf), as principais oportunidades envolvem a fermentação alcoólica e a purificação do biogás (em termos de facilidade de captura) e a cogeração a biomassa (em termos de volume).
A projeção é que é possível alcançar 197 Mt de CO2 biogênico em 2035 no setor de etanol, a maior parte (155 MtCO2) vindo de cogeração. As usinas de etanol de cana e milho podem contribuir com 36 MtCO2 e o biometano com mais 6 MtCO2.
A captura e uso ou armazenamento de CO2 na bioenergia é uma alternativa para reduzir e até levar a indústria a emissões negativas.
Um potencial que o Brasil pode explorar para atingir a neutralidade até 2050, e amenizar os impactos de setores que terão maior dificuldade para redução de emissões.
A diretora de Estudos do Petróleo, Gás e Biocombustíveis da EPE, Heloísa Borges, explica que o aumento acelerado da produção de biocombustíveis fará crescer de forma expressiva o volume de emissões de CO2 biogênico – o que pode ajudar a impulsionar a produção de combustíveis sintéticos e a descarbonização da indústria.
“Quando olhamos a rampa de subida da produção de biocombustíveis, há um crescimento grande de CO2 associado à fermentação da indústria sucroalcooleira e à purificação do biogás. Nós podemos usar esse CO2. É um subproduto que pode e deve ser comercializado”, disse em entrevista à eixos na COP30, em Belém, às vésperas da publicação do estudo. Assista
O trabalho da EPE aponta que o CO2 biogênico pode viabilizar rotas como e-metanol e e-amônia, que dependem de carbono para sintetizar combustíveis limpos.
Segundo Borges, como o uso de carbono fóssil nessas cadeias compromete a descarbonização, a tendência é de valorização da oferta renovável.
Oportunidade no mercado de carbono
Políticas públicas como o RenovaBio, Combustível do Futuro e Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten) já trazem alguns mecanismos de fomento ao aproveitamento do CO2.
No RenovaBio, por exemplo, há um bônus de até 20% na nota de eficiência energético-ambiental do produtor ou importador de biocombustível que comprove emissões negativas de gases de efeito estufa.
Mas a EPE também aponta que o desenvolvimento em escala de atividades de captura, transporte, uso e armazenamento de CO2 (CCUS) no Brasil ainda depende de uma série de definições regulatórias e incentivos.
Uma das fronteiras é justamente o mercado de carbono, em fase de regulamentação.
O relatório aponta que a lei 15.042/2024, que instituiu o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa, pode ser um mecanismo decisivo para o CCUS no Brasil.
“Entretanto, ainda é necessário definir as regulações específicas para início de operação desse mercado”, observa o documento.
Do combustível à água com gás
A indústria está atenta a esse novo momento do carbono. Nesta sexta (28), a produtora de biocombustíveis Be8 anunciou a assinatura de uma carta de intenções com a Air Liquide para comercialização de CO2 biogênico capturado da produção de etanol.
A parceria estabelece o fornecimento do gás a partir de uma usina em Passo Fundo (RS) prevista para entrar em operação no segundo semestre de 2026. Segundo o presidente da Be8, Erasmo Carlos Battistella, com a captura do CO2, o projeto completará o ciclo integral de valorização da matéria-prima.
Ao mesmo tempo, atenderá demandas de diversos setores industriais que buscam alternativas sustentáveis para sua produção.
Para o diretor geral da Air Liquide Brasil, Rodrigo Jorge, o projeto é estratégico na garantia de cadeias de suprimentos resilientes.
O gás será purificado pela Air Liquide em padrões de alta exigência e destinado a setores como hospitais (gases medicinais e terapêuticos), indústria de bebidas (carbonatação), setor metalmecânico (soldagem e resfriamento), refrigeração e controle ambiental, agricultura e hortifruti (ambientes de estufa), entre outras aplicações industriais.
Cobrimos por aqui
Curtas
‘Demolição do licenciamento’. A ministra do Meio Ambiente (MMA), Marina Silva (Rede), classificou a decisão do Congresso de derrubar 52 vetos na Lei Geral do Licenciamento Ambiental como uma “demolição da legislação”. Ao participar do programa Bom Dia, Ministra, nesta sexta-feira (28/11), Marina afirmou que o governo estuda acionar o STF.
Petrobras reduz investimentos. A Petrobras planeja investir US$ 109 bilhões no período de 2026 a 2030, de acordo com o plano de negócios divulgado na noite de quinta (27/11). O valor representa uma redução de menos de 2% em relação aos US$ 111 bilhões do planejamento 2025-2029.
Deslocando importação. Investimentos em refinarias e biorrefinarias e maior consumo de combustível sustentável de aviação devem reduzir a dependência externa do Brasil à nafta e ao QAV em 2035, indica caderno do PDE 2035.
- O Brasil é, historicamente, importador líquido de derivados de petróleo. Ainda que a projeção seja de manutenção dessa condição nos próximos dez anos, a importação será de 36 mil m³/d em 2035, volume inferior à máxima histórica de 79 mil m³/d, registrada em 2017.
Movido a hidrogênio. A Neoenergia e a Honda fecharam uma parceria para acelerar iniciativas baseadas em hidrogênio verde para a mobilidade urbana e transporte rodoviário no Brasil. O projeto será desenvolvido no primeiro posto da Neoenergia no país, localizado em Brasília (DF). O empreendimento será inaugurado em dezembro de 2025.
Leilão de transmissão. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), confirmou a realização de dois leilões de linhas de transmissão para 2026. O anúncio ocorreu durante cerimônia de assinatura de contrato de compra e venda de ações da Mantiqueira Energia entre a State Grid e a Brookfield.
- O primeiro dos leilões de transmissão está marcado para março, com lotes já definidos e em fase final de consulta pública pela Aneel.
Dados para o setor elétrico. O Balcão Brasileiro de Comercialização de Energia (BBCE) e a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) fecharam um acordo de compartilhamento de inteligência de mercado. A intenção é usar os dados para estudos e análises na área de segurança de mercado e para o mercado livre de energia.

