O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) aponta que vivenciamos uma tripla crise planetária, tendo em vista o contexto de três problemas globais interconectados que afetam os ecossistemas, as espécies e a vida dos seres humanos: mudanças climáticas, perda da natureza e da biodiversidade, e elevados índices de poluição.
Nesse contexto, o Estado brasileiro assumiu a responsabilidade de sediar, em Belém do Pará durante o mês de novembro de 2025, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30).
A escolha da cidade brasileira, que se insere no bioma Amazônia, simboliza um esforço global decisivo para o enfrentamento da crise ecológica, a partir de respostas coletivas construídas em instâncias multilaterais.
A transição energética será um dos temas fundamentais na COP30, sendo o enfrentamento da pobreza energética elemento fundamental para uma transição justa.
A pobreza energética pode ser definida, numa perspectiva mais ampla, como a ausência ou a dificuldade de acesso a serviços energéticos adequados, confiáveis, seguros e ambientalmente sustentáveis.
No Brasil, segmentos populacionais em situação de vulnerabilidade social que fazem uso de meios poluentes para cocção de alimentos, como a lenha e o carvão, estão expostos a graves danos à saúde, contribuindo ainda para o desmatamento e a emissão de gases de efeito estufa.
Da mesma forma, a ausência ou a restrição de acesso à energia elétrica compromete as possibilidades concretas de desenvolvimento das pessoas, na medida em que precariza o exercício de direitos fundamentais como a educação, a moradia, o trabalho, dentre outros.
O arcabouço jurídico do Estado brasileiro, incluindo os compromissos assumidos em âmbito internacional, impõe a adoção de medidas concretas que promovam a superação de contextos de vulnerabilidade social e a proteção do meio ambiente.
Todavia, pode-se afirmar que as iniciativas brasileiras que se propõem a promover o enfrentamento da pobreza energética em contexto de crise ecológica não estão organizadas em esforço estatal mais amplo de planejamento, coordenação e controle das ações.
Assim, é fundamental que o Brasil aprove norma jurídica que preveja um plano de longo prazo, como foi feito por exemplo pelo Estado português (2023-2050), seguindo diretivas da União Europeia.
O documento deve prever, dentre outros aspectos, um conceito normativo para a pobreza energética adequado à realidade brasileira, que sirva de referência para a formulação e implementação de ações.
Diante do desafio que está posto, o plano do Estado brasileiro deve contemplar o planejamento, a formulação e a implementação de políticas públicas pelas instâncias da administração pública, considerando o desenho federativo (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) e os três Poderes da República.
O plano deve ter em conta, ainda, a necessária conciliação entre os ecossistemas e as práticas culturais das pessoas que vivem tradicionalmente inseridas nesses ambientes, na medida em que o texto constitucional brasileiro também impõe ações do poder público que conduzem à valorização da diversidade étnica e regional e reconhece, dentre outros aspectos, os costumes dos povos e comunidades tradicionais.
O processo de controle das diversas ações de enfrentamento da pobreza energética em contexto de crise ecológica pressupõe a criação e o funcionamento regular de instância formada por representantes do poder público e da sociedade civil, sendo recomendável a sua instituição formal, com membros e atribuições, na mesma norma jurídica que vier a aprovar o plano.
Tal perspectiva está alinhada com boas práticas que vem sendo implementadas em outros países e reforça a participação da população na formulação das políticas públicas.
A liderança internacional que o Estado brasileiro vem buscando construir em matérias como combate à fome, proteção ao meio ambiente, transição energética e fontes renováveis não é compatível com graves contextos de pobreza energética. É preciso ter instrumentos efetivos para fazer mais.
Vitor Alencar é advogado e doutorando na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.
João Paulo Madruga é advogado e especialista em Administração Pública.
