O avanço tecnológico e a crescente complexidade do setor aquaviário brasileiro exigem instrumentos regulatórios capazes de estimular inovação sem comprometer a segurança jurídica e o interesse público.
O sandbox regulatório, em destaque no cenário global, permite testar novos produtos, serviços ou modelos de negócio em ambiente controlado e supervisionado.
No Brasil, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) implementou recentemente seu programa, voltado a portos, terminais de uso privado e transporte aquaviário, representando marco importante na política regulatória do setor.
Regulamentado pela Resolução nº 131, de 18 de agosto de 2025 da Antaq, o sandbox constitui ambiente experimental que viabiliza o desenvolvimento de modelos inovadores em conformidade com a Lei Complementar nº 182/2021.
O programa oferece condições simplificadas e autorizações temporárias, estabelecendo limites para garantir segurança jurídica, proteção dos usuários e conformidade regulatória.
Entre seus objetivos estão: estimular inovação e empreendedorismo, promover diversidade de negócios, ampliar a eficiência e o acesso a serviços, fortalecer a cooperação entre regulados e Antaq e aprimorar a regulação com base em evidências.
O ingresso ocorre por editais ou processos de qualificação direta, sendo possível ainda o envio de propostas via formulários eletrônicos da agência.
A base legal do sandbox está na Lei nº 10.233/2001, que define as competências das agências reguladoras, nos regulamentos internos da Antaq e na legislação sobre inovação. Esse arcabouço assegura que a experimentação seja conduzida de forma transparente, eficiente e alinhada ao interesse público.
A Antaq, como autarquia especial, tem poderes normativos e de supervisão, devendo atuar segundo princípios de legalidade, eficiência e incentivo à inovação. O sandbox encontra respaldo nesse mandato institucional.
Outras agências já adotaram modelos semelhantes, como a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), cada qual adaptada ao seu setor, mas com objetivos comuns: testar tecnologias e modelos de negócio em ambiente controlado, protegendo o interesse público e a segurança jurídica.
Enquanto a Anac foca em segurança operacional e inovação na aviação, e a ANTT em digitalização e eficiência do transporte terrestre, a Antaq busca avanços em portos e transporte aquaviário, com potencial de reduzir custos, melhorar a logística e ampliar o acesso a serviços.
Além da Lei nº 10.233/2001, o Marco Legal das Startups (Lei Complementar nº 182/2021) autoriza órgãos reguladores a criar programas de sandbox, definindo critérios de participação, prazos e alcance da flexibilização normativa.
A implementação traz benefícios como testar soluções em ambiente seguro, favorecer o desenvolvimento de projetos sem riscos excessivos e fornecer à Antaq experiência prática para aprimorar regulamentos.
O modelo contribui para estabilidade regulatória, facilita a adaptação normativa a novos negócios e evita a necessidade de alterações legislativas imediatas.
Outro aspecto relevante é a contribuição do sandbox para projetos voltados à sustentabilidade ambiental, permitindo que soluções de logística verde e redução de emissões sejam testadas em ambiente seguro.
Embora os sandboxes regulatórios ofereçam oportunidades significativas para testar inovações em ambiente controlado, sua implementação envolve desafios importantes.
Entre eles estão o risco de captura regulatória, em que empresas podem influenciar decisões a seu favor, e distorções concorrenciais, quando participantes do sandbox obtêm vantagens econômicas não disponíveis para outros atores do setor.
Além disso, questões legais e de conformidade, como proteção de dados e propriedade intelectual, devem ser cuidadosamente gerenciadas para evitar problemas durante ou após o período experimental.
Outro ponto crítico é a necessidade de coordenação eficiente entre diferentes autoridades reguladoras, garantindo que as flexibilizações normativas sejam consistentes e seguras.
A confiança dos participantes também é fundamental: a atração de startups e empresas inovadoras depende de garantias de confidencialidade, transparência e segurança jurídica.
Dessa forma, embora o sandbox seja uma ferramenta valiosa para estimular inovação, seu sucesso depende de mecanismos claros de monitoramento, avaliação e mitigação de riscos.
Internacionalmente, países como Reino Unido, Cingapura e Austrália adotaram sandboxes em setores estratégicos, com resultados positivos em inovação, eficiência e sustentabilidade.
No Brasil, a experiência ainda é recente no setor aquaviário, mas já indica condições favoráveis, apoiando-se em práticas de outras agências e na tendência global de regulação experimental.
A iniciativa da Antaq representa avanço na modernização do setor aquaviário, ao alinhar inovação e segurança jurídica, em sintonia com boas práticas internacionais.
O êxito do sandbox dependerá da capacidade de equilibrar inovação e responsabilidade regulatória, aproveitando aprendizados nacionais e internacionais para promover um ambiente competitivo, sustentável e juridicamente seguro.
Alessandra Montet é advogada atuante nas áreas de Direito Administrativo, Direito Societário, Contratos, Direito Processual Civil, Direito Regulatório e Direito de Imigração do Murayama, Affonso Ferreira e Mota Advogados.
