O desenrolar da negociação da OPEP+ no fim de semana disparou um alerta no mercado de óleo: países membros da coalizão não estão dispostos a sustentar os preços do petróleo em alta para que os concorrentes ganhem mercado.
Mesmo diante do acordo, que levou a uma curva de aumento da produção no segundo semestre dentro da faixa antecipada pelo mercado, os preços do Brent no mercado futuro recuaram a mínima em mais de dois meses nesta segunda (19). A queda chegou perto de 7%.
No intraday, os contratos futuros com vencimento em setembro atingiram a mínima de US$ 67,75 por barril, valor que não era visto desde 10 de maio (US$ 67,41).
Um recuo nesse patamar, de 6% em um dia, não era visto desde março, outro momento de especulação sobre decisões da coalizão liderada por Arábia Saudita e Rússia.
No fim de semana, ficou acertado que o grupo vai adicionar até o fim do ano 2 milhões de barris/dia na oferta de óleo, durante cinco meses. Revisão entra em vigor a partir de agosto.
Muita incerteza leva a maior volatilidade
O mercado já mostrava-se sensível a quaisquer variações na demanda futura por combustíveis. O avanço de variantes da covid-19, especialmente a Delta, retoma a preocupação com o fechamento de importantes cidades nos EUA e na Europa, o que pode desacelerar rapidamente o consumo.
A tendência é de volatilidade no curto prazo. A depender do controle da pandemia e da sustentabilidade da recuperação econômica de grandes economias, a trajetória de alta nos preços pode se manter até o fim do ano.
Antes do revés desta segunda (19), a Platts Analytics previa que os preços da commodity ficariam na média de US$ 77 em julho e voltariam a recuar para o patamar de US$ 66 por barril no fim do ano.
Como o cenário ainda é de demanda restrita, o mercado acaba reagindo bruscamente aos sinais de reversão, seja na recuperação econômica ou por conta do recrudescimento da pandemia. Ainda mais com o forte viés de alta observado desde outubro do ano passado.
Os efeitos econômicos da covid-19 também são mais lentos e o cenário mudou em relação a 2020.
Com consumidores apreensivos com a retomada econômica em “V” vista no país epicentro da pandemia de covid-19, o governo chinês começa a tomar medidas para estimular o consumo interno. Economistas ouvidos pela Bloomberg estimam desaceleração do crescimento.
Em abril do ano passado, o mercado chegou a liquidar contratos futuros do WTI negociado na bolsa de Nova Iorque em valores negativos, mas a recuperação de preços na segunda metade de 2020 encontrou apoio na antecipação de compras de óleo barato, especialmente por refinadores asiáticos.
Exemplo dessa fragilidade foi o equilíbrio entre a expectativa pela recuperação, que ganhou força com a abertura propiciada pela vacinação no verão do Hemisfério Norte, e o duro impacto da covid-19 na Índia.
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Preço no Brasil depende do câmbio, mas pode cair
Por mais que a Petrobras decida acelerar o repasse do recuo nas cotações dos combustíveis internacionais, os preços domésticos da gasolina e do diesel — combustível mais consumido no país – são também afetados pelo câmbio.
Incertezas políticas e econômicas internas, combinadas com o movimento dos mercados internacionais tem impedido que os ganhos das commodities acelerem a retomada do valor do real. Enquanto isso, a moeda americana sobe rápido nos momentos de maior aversão ao risco.
Hoje (19), após bater a máxima de R$ 5,2576, o dólar à vista valorizou 2,64%, a R$ 5,2506, maior avanço percentual desde 18 de setembro de 2020.
Em 1º de maio, a Petrobras reduziu os preços do diesel em 2% e segurou o valor por 66 dias, durante um período de alta nas commodities. O reajuste de 4% veio em julho, mas o mercado calculava que ainda havia defasagem entre os preços nacionais e externos.
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A Ativa Investimento, que estima a defasagem para a gasolina, vê uma diferença de 15%.
“Com implicação direta na elevação de produção da OPEP, hoje, nós sabemos que existe defasagem do preço praticado na gasolina doméstica em relação a internacional de aproximadamente 15% em nossos cálculos. O aumento de produção pode trazer um alívio nos preços dos combustíveis aos consumidores no curto prazo e essa defasagem deverá ser reduzida”, avalia Guilherme Sousa, economista da Ativa Investimentos, em nota.
A combinação de queda nos preços da gasolina com dólar alto, por sua vez, têm estimulado os usineiros a produzir mais açúcar. O mercado considera que o etanol hidratado, vendido diretamente nas bombas, é competitivo quando custa até 70% do valor do litro de gasolina.
A demanda interna, por sua vez, deve permanecer aquecida. O consumo de óleo diesel tende a se firmar já a partir deste terceiro trimestre em valores acima dos registrados pré-pandemia.
E a demanda por gasolina deve voltar a crescer de forma sustentada em 2020 – em meados deste ano as vendas do combustível chegaram a ultrapassar o patamar de 2019, mostram os dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
“Estima-se uma queda na produção de cana para a safra 2021/22, devido ao déficit hídrico em importantes regiões produtoras, com reflexos para o etanol. O crescimento do etanol de milho deve compensar parte desta redução”, diz a EPE, nas projeções.
Projeções de curto prazo para o mercado de combustível, segundo a EPE
- Diesel: crescimento nas vendas de 5,5% em 2021 e de 2,9% em 2022, com “retomada da atividade econômica em 2021, especialmente o bom desempenho da agropecuária, com expectativa de safra recorde de grão”;
- Gasolina C: recuperação gradual para os níveis pré-pandemia no 2º semestre de 2021. Crescimento de 7,2% este ano e 1,1% em 2022;
- Etanol hidratado: declínio de 7,8% em 2021, com crescimento de 5,7% em 2022;
- QAV (aviação): recuperação constante. O mercado foi o mais afetado pela pandemia, “não somente por conta da crise sanitária, mas também pela desvalorização do real”. Crescimento de 24% em 2021 e de 33% em 2022.
Desacordo na OPEP+ reflete enfraquecimento de laços regionais
A coalizão saiu enfraquecida da mais recente rodada de negociações. Temia-se que a Rússia seria um obstáculo para manter a oferta sob controle, mas a surpresa veio diretamente da área de influência saudita no Oriente Médio.
Primeiro, os Emirados Árabes Unidos bloquearam as negociações em busca de uma revisão de suas metas individuais. E, por fim, Arábia Saudita, Rússia (500 mil barris/dia), Iraque e Kuwait (150 mil barris/dia) garantiram uma flexibilização de suas obrigações depois de maio de 2022.
O aumento da cota dos Emirados Árabes será de 332 mil barris/dia.
O reajuste se dará por meio do aumento da produção base sobre a qual foram calculados os rateios dos limites de produção.
Não há gargalo na oferta.
No acordo original, o cartel segurou a produção em 9 milhões de barris/dia e, atualmente, trabalha com um controle da oferta de cerca de 5 milhões de barris/dia. A capacidade remanescente, pelo que foi combinado no fim de semana, será revista apenas em dezembro.
Analistas apontam, contudo, que grandes produtores como a própria Arábia Saudita, possuem ainda mais capacidade ociosa em seus campos, diretamente controlados por empresas nacionais, caso da Saudi Aramco.
As semanas de impasses acabaram por dar destaque à disputa pela hegemonia das potências árabes do Golfo Pérsico. O príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, governante de fato, tenta transformar o reino saudita em uma potência global, aberta — ao menos para negócios — para o mundo.
Paralelamente, o que se viu foi um afastamento nas relações com os Emirados Árabes Unidos, envolvendo o recuo em alianças militares e maior rivalidade entre as monarquias sunitas.
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Com informações de Bloomberg, Estadão, Investing.com, Reuters e S&P Global Platts
Edição por Gustavo Gaudarde