Comida vs combustíveis

Indústria quer usar COP30 para rebater concorrência entre biocombustíveis e alimentos

Produtores brasileiros mobilizam para apresentar biocombustíveis como solução sustentável para setor de transportes

Conteúdo Especial

Evento da FPBio e associações do biodiesel discute descarbonização dos transportes e COP30. Foto: Victor Jäger
Evento da FPBio e associações do biodiesel discute descarbonização dos transportes e COP30. Foto: Victor Jäger

BRASÍLIA — O debate sobre o uso de terras agricultáveis para a produção de biocombustíveis ao invés de destiná-las à produção de alimentos (em inglês, a disputa fuel vs food) será um dos temas centrais levados pelo setor para a conferência do clima das Nações Unidas (COP30), que ocorre entre 10 e 21 de  novembro, em Belém.

A indústria quer mostrar que, no Brasil, não existe essa concorrência e as duas coisas caminham juntas.

Evento promovido pela Frente Parlamentar do Biodiesel (FPBio) e entidades do setor nesta quinta-feira (9/10), em Brasília, reuniu representantes do setor para tratar das rotas brasileiras para a descarbonização veicular.

A discussão sobre fuel vs food  tem sido usada por países ricos, sobretudo europeus, para enfraquecer o atributo ambiental e de descarbonização dos combustíveis de primeira geração.

O argumento é que a a mesma matéria-prima usada para bioenergia poderia ser direcionada para produzir comida, como o óleo de soja para fins alimentícios e a cana para a produção de açúcar.

“No Brasil não existe fuel vs food. Nós temos o combustível e temos o alimento, não há concorrência. Ao contrário, cada vez mais se processa soja e temos uma produção maior de farelo, que vai virar proteína”, defende o diretor superintendente da União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio), Donizete Tokarski.

O diretor da Ubrabio afirma que o setor está preparado para acessar novos mercados e que mesmo os europeus — resistentes ao biocombustível brasileiro — acabarão consumindo não só o alimento, mas o biodiesel produzido no Brasil.

Para o diretor executivo da Bioenergia Brasil, Roberto Hollanda, o país tem experiências a compartilhar na jornada de desacarbonização dos transportes, mas é alvo de fake news e ignorância quanto à política de biocombustíveis.

“Muitos agentes, por desconhecimento, por ignorância ou por interesse, criam narrativas contra os biocombustíveis. Fuel vs food é, certamente, a mais eloquente delas”, critica Hollanda.

Disputa com petróleo

No mercado europeu, a disputa é com a eletrificação. Mas há uma outra concorrência em jogo: os derivados de petróleo.

A adição de biocombustíveis ao diesel ou à gasolina desloca a demanda por esses combustíveis fósseis.

“Tem uma indústria de derivados de petróleo que não vai abrir mão de market share assim tão facilmente. Coloca-se em dúvida a viabilidade técnica da mistura de biocombustíveis e que pode comprometer a segurança energética”, comenta o diretor de Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia (MME), Marlon Arraes.

O diretor do MME cita a lei do Combustível do Futuro e os recentes aumentos nas misturas de etanol à gasolina (30%) e de biodiesel ao diesel (15%) como experiências de substituição fóssil que podem fazer parte da contribuição brasileira para a COP30.

“O mundo pode olhar para esse nosso programa e falar: eu posso implementar algo parecido e isso vai aumentar minha segurança energética, vai aumentar minha produção de biocombustíveis”, disse.

Contabilidade de carbono

Para rebater, com dados, os argumentos contra os biocombustíveis, o Brasil tem defendido, desde sua presidência no G20 em 2024, uma contabilidade de carbono que considere as características regionais de produção de bioenergia.

Na visão do diretor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Pietro Mendes, a COP30 no Brasil permitirá avançar nessa agenda.

Segundo ele, embora seja um tema árido, o Brasil precisa ter um reconhecimento internacional de suas políticas públicas.

A Aliança Global para os Biocombustíveis é uma aliada nesse processo, de acordo com o diretor da ANP, ao promover a harmonização entre os principais países produtores de biocombustíveis.

“Existe espaço, inclusive, para a China também adotar como parte da solução os biocombustíveis, e para isso a gente precisa que a Renovacalc [instrumento que mede a intensidade de carbono dos biocombustíveis e serve de base para a emissão dos créditos de descarbonização] seja reconhecida por outros países”, afirmou Mendes.

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