LISBOA — Prioridade do Brasil na agenda de descarbonização dos transportes, a oferta de biocombustíveis pode mais do que dobrar no país até 2050, sem pressionar áreas de vegetação nativa, mostra um estudo lançado nesta quinta (9/10) pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema).
A estimativa é que o cultivo agrícola adicional para biocombustíveis pode utilizar entre 20 e 35 milhões de hectares (Mha), dentro dos 56 Mha de pastagens degradadas disponíveis para expansão da agricultura — o país conta com 100 Mha de áreas degradadas.
Essas áreas adicionais até 2050 se somariam aos cerca de 31,4 milhões de hectares utilizados em 2024 para produção de bioenergia, e ainda contemplam florestas plantadas que geram lenha, carvão vegetal ou lixívia.
Elaborado em parceria com o GT Clima e Energia do Observatório do Clima, o estudo Biocombustíveis no Brasil: alinhando transição energética e uso da terra para um país carbono negativo observa que essa expansão é compatível com uma política que busca eliminar o desmatamento e recuperar florestas, além de aumentar a produção de alimentos.
O estudo tem como premissa uma meta de redução das emissões em todos os setores de 92% até 2035 em relação a 2005, conforme consta na proposta do OC para a segunda Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil.
O que levaria o país a mais que dobrar seu consumo de biocombustíveis, de 102 milhões de toneladas equivalentes de petróleo (Mtep) em 2024 para 221,1 Mtep em 2050.
Ao mesmo tempo em que novos combustíveis entram na matriz, como diesel verde e combustível sustentável de aviação (SAF).
“Para isso, é necessário que haja uma aposta em cultivos de maior produtividade, como a macaúba, e o investimento em novas tecnologias, como o etanol de segunda geração”, comenta Felipe Barcellos, pesquisador do Iema autor do relatório.
Considerando que a bioenergia tende a demandar uma quantidade relevante de terras para suprir a demanda por combustíveis líquidos de baixo carbono, uma vez que a eletrificação não é uma solução universal, o Iema aponta caminhos para que isso ocorra de forma sustentável.
“O país precisa ser rigoroso em políticas de monitoramento e regramento do uso do solo. A prioridade deve continuar sendo a produção de alimentos e a proteção e regeneração de áreas naturais, com os biocombustíveis ocupando apenas parte das áreas degradadas”, diz Barcellos.
Cana e macaúba
O estudo compara seis cenários de expansão da produção de biocombustíveis até 2050, cada um com diferentes combinações de matérias-primas e tecnologias para a produção de etanol, biodiesel, diesel verde e SAF.
Quatro deles conseguem ser atendidos pelos 56 milhões de hectares propostos pelo Iema, demandando uma área de 20 a 35 Mha, aproximadamente, com destaque para culturas de cana e macaúba.
- Foco em Cana/Macaúba – 21 milhões de hectares: 100% do etanol, do diesel verde e do SAF produzidos a partir da cana-de-açúcar e 100% do biodiesel oriundo da macaúba;
- Foco em Macaúba – 26 milhões de hectares: 100% do biodiesel, do diesel verde e do SAF produzidos a partir da macaúba e 100% etanol oriundo da cana-de-açúcar;
- Foco em Cana/Soja/Macaúba 2050 – 27 milhões de hectares: 70% do etanol produzido a partir da cana-de-açúcar e 30% a partir do milho de segunda safra, biodiesel oriundo da soja e da macaúba em proporções iguais e 100% do diesel verde e do SAF produzido a partir da cana;
- Foco em Cana 2050 – 34 milhões de hectares: 40% do etanol produzido a partir da cana-de-açúcar e 60% a partir do milho de segunda safra, 100% do diesel verde e do SAF oriundos da cana e 100% do biodiesel produzido a partir do óleo de soja.