RIO — O Brasil pretende fazer da Agenda de Ação o foco da sua presidência na COP30, em Belém, no tema da energia, consolidando as vitórias conquistadas no G20 do ano passado, na articulação em torno da transição justa e equitativa.
A estratégia é usar a Agenda como plataforma para transformar compromissos multilaterais já assumidos em outras COPs — como triplicar a capacidade de energias renováveis e dobrar a eficiência energética até 2030 — em resultados concretos e mensuráveis.
E, assim, contornar os conhecidos imbróglios que costumam arrastar as negociações dos textos finais das COPs.
O que é a Agenda de Ação
A estrutura consiste em um plano de implementação que mobiliza governos, empresas, cidades e sociedade civil a cumprir compromissos já acordados.
O ministro João Marcos Senise Paes Leme, diretor do Departamento de Energia do Itamaraty e responsável por coordenar as negociações sobre energia na COP30, afirmou que a prioridade do Brasil será reforçar a centralidade da transição energética dentro dos esforços de combate às mudanças climáticas.
“Em Nova Iorque, ouvimos de todos os interlocutores que ninguém pensa em questionar a transição energética fora de pequenos círculos, e isso vai se reforçar na COP, porque a transição energética é um pilar central ao combate à mudança do clima”, disse o diplomata na última sexta (3/10), em evento promovido pelo Cebri, no Rio de Janeiro.
Senise se referia à Climate Week NYC, que ocorreu no final de setembro paralelamente à Assembleia Geral da ONU, ocasião em que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, aproveitou para reforçar seu negacionismo às mudanças climáticas e críticas às energias renováveis, em especial as eólicas.
O ministro explica que a Agenda de Ação proposta pela presidência brasileira da COP30 foi desenhada para traduzir os resultados do balanço global (GST-1) — ferramenta do Acordo de Paris que avalia o progresso na implementação de seus objetivo — em um plano de implementação capaz de mobilizar governos, empresas, cidades e sociedade civil.
A ideia é encontrar soluções que possam catalisar resultados em matéria de descarbonização, e transição para longe dos combustíveis fósseis de forma justa ordenada e equitativa.
“A Agenda de Ação foi moldada para identificar os compromissos ali elencados e encontrar soluções que possam catalisar resultados (…) Isso é também uma medida para posicionar o Brasil como um país eficiente, para receber investimentos mais competitivos de maneira geral”, afirmou.
A aposta nos combustíveis sustentáveis
Entre os temas que o país pretende priorizar estão os combustíveis sustentáveis, a expansão e modernização das redes elétricas, o acesso à energia e ao “clean cooking”, e o estímulo à cadeia de minerais críticos, além do desbloqueio de financiamentos para países em desenvolvimento.
Segundo o ministro, o Brasil deverá mostrar “experiências bem-sucedidas” no uso de combustíveis sustentáveis, incluindo biocombustíveis, em setores de difícil eletrificação e descarbonização.
A diplomacia brasileira trabalha para construir, até a Cúpula de Líderes da COP30, um compromisso global para quadruplicar a produção e o uso de combustíveis sustentáveis até 2035.
A proposta vem sendo articulada desde setembro, quando Brasil e Japão anunciaram a intenção de liderar um grupo de 34 países na ampliação da produção de etanol, biodiesel, biometano, SAF (para aviação), metanol e amônia verde, entre outros.
A iniciativa foi reforçada com a assinatura, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, da carta All hands on deck for the just and equitable energy transition (Todos juntos pela transição energética justa e equitativa), junto a outros 16 chefes de Estado e de governo.
O documento, que inclui signatários como União Europeia, Reino Unido, Canadá, Noruega, Quênia e Austrália, reafirma os compromissos da COP28 e o objetivo de “ampliar a produção e o uso de combustíveis sustentáveis para substituir os fósseis”.
“O Brasil entra com o sarrafo lá em cima”
Para Mariana Espécie, assessora especial do Ministério de Minas e Energia e integrante da equipe que lidera a agenda energética da presidência da COP, o país chega a Belém com “credenciais sólidas” e capital político acumulado para conduzir as negociações com ambição.
“O Brasil entra nessa discussão com um sarrafo lá em cima (…) mostrando que é possível fazer. Nossas credenciais são as melhores possíveis. Não escondemos os desafios associados a isso, não é uma trajetória fácil, mas internalizamos muitas inovações por necessidade, adaptando à nossa realidade”, afirmou.
Mariana destacou que a transição energética precisa ir além do setor elétrico e envolver outros segmentos econômicos, como indústria, transportes e cidades — o que exige uma complexa coordenação institucional entre diferente níveis de governo e da economia.
Segundo a assessora, a Agenda de Ação será usada para manter “níveis de ambição cada vez mais vivos”, considerado um cenário internacional adverso.
Ela sinaliza que o Brasil deverá propor iniciativas voltadas à expansão e resiliência das redes elétricas, à ampliação do acesso à energia e ao uso de tecnologias como captura e armazenamento e uso de carbono (CCUS).
“Vamos discutir, sim, sobre minerais para a transição energética, porque sem isso não é possível avançar (…) A gente também tem a indústria de óleo e gás com o potencial catalisador de soluções como o CCUS e várias outras”, afirmou.
“Também vamos falar sobre os desafios associados a acesso à energia elétrica e acesso a clean cooking, problemas que afetam a América Latina, África e Sudeste Asiático, e sobre combustíveis sustentáveis, um item fundamental para essa transição se viabilizar”, concluiu.