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O cabo de guerra em torno do novo plano coordenado de gasodutos

Plano Coordenado recebe questionamentos sobre impactos nas tarifas e sobre como conversará com Plano Nacional Integrado da EPE

Obras no gasoduto que vai conectar usina térmica à malha de transporte de gás da TAG, em Aracaju (SE), em 24 de julho de 2024 (Foto Tauan Alencar/MME)
Obras do gasoduto que conecta usina térmica à malha de transporte de gás da TAG, em Aracaju/SE (Foto Tauan Alencar/MME)

PIPELINE. Plano Coordenado das transportadoras de gás é recebido com questionamentos sobre os impactos dos novos investimentos nas tarifas e sobre como ele conversará com o Plano Nacional Integrado da EPE.

Gás fica de fora dos critérios de habilitação do Redata. Revisão tarifária das transportadoras no Senado. Tramontina vai de biometano e mais. Confira:


A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) encerrou, no dia 17/9, a consulta pública sobre o 1º Plano Coordenado das transportadoras de gás natural, em meio a questionamentos sobre o impacto dos novos investimentos nas tarifas.

O planejamento decenal das transportadoras foi recebido com dúvidas no mercado – em especial sobre como ele conversará com o Plano Nacional Integrado de Infraestruturas de Gás Natural e Biometano (PNIIGB), da Empresa de Pesquisa Energética (EPE).

A estatal espera colocar o novo plano em consulta pública ainda este mês.

Aliás… o que esperar do novo PNIIGB? Os rumos do Plano Integrado e como ele conversa com o Plano Coordenado foram temas do oitavo episódio do videocast gas week com a diretora de Estudos do Petróleo, Gás e Biocombustíveis da EPE, Heloísa BorgesAssista na íntegra

Conselho de Usuários(CdU) pede cautela à ANP na aprovação de novos investimentos, enquanto a Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás) e a Eneva chegaram a pedir, sem sucesso, a interrupção da consulta pública do Plano Coordenado.

O documento propõe, ao todo, 30 projetos na malha de gasodutos e que somam R$ 37 bilhões em investimentos (conheça cada um deles).

Reúne projetos em diferentes estágios de maturidade – alguns deles em fase pré-conceitual – e de diferentes perfis: desde  novos gasodutos para interiorização da malha a intervenções de menor porte, como estações de compressão (Ecomps) e conexões da malha a novas fontes de suprimento.

A seguir, a gas week se debruça sobre o debate em torno do plano.



O Conselho de Usuários, que representa o interesse dos carregadores (quem contrata a capacidade dos gasodutos), manifestou preocupação com o impacto tarifário dos investimentos.

E levantou questionamentos à ANP, na consulta pública, sobre o real papel do Plano Coordenado.

Existe um receio de que a aprovação do plano funcione como um aval da ANP à realização de todos os 30 projetos das transportadoras – e dúvidas sobre como esses investimentos serão incorporados na Base Regulatória de Ativos (BRA) e, por consequência, nas tarifas.

CdU pede que nenhum investimento seja aprovado sem o devido crivo das entidades competentes e prévio diálogo com o mercado – e que seja definido, portanto, um rito regulatório e governança pela ANP para eventual aprovação de investimentos relacionados ao plano.

Esse rito, segundo o CdU, determinaria que investimentos devem ou não ser considerados integrantes do sistema de transporte e como seus custos serão incorporados à BRA.

O Conselho defende, por exemplo, a necessidade de se separar da BRA aqueles investimentos que têm o propósito de atender a interesses específicos, para evitar socializar custos indevidos e criar subsídios cruzados.

“Como a ANP ainda não regulou o tema, há incertezas sobre como e em qual momento tais investimentos serão aprovados e traduzidos em receita às transportadoras (incorporados à BRA), ou colocados à disposição para execução por outros interessados”, cita o CdU em sua contribuição.

O Conselho entende haver outras fragilidades no planejamento, como:

  • projeções de oferta e demanda com premissas desatualizadas;
  • ausência de projetos da TSB e GOM;
  • falta de análise de sensibilidade para projetos concorrentes entre si;
  • e falta de análise de custo-benefício de projetos.

O CdU cita, por exemplo, que aEcomp Japeri (RJ), do projeto Corredor Pré-Sal da NTS, é um projeto já pacificado, mas que falta, por outro lado, mais clareza sobre a necessidade da Ecomp Itajuípe (BA), da TAG.

cautela com novos investimentos, aliás, foi um dos assuntos discutidos no segundo episódio do videocast gas week, em agosto, com Sylvie D’Apote, presidente do Conselho de Usuários; e Adrianno Lorenzon, vice-presidente do CdU. Assista na íntegra.


As transportadoras veem o Plano Coordenado, por sua vez, como um documento de referência para dar mais visibilidade sobre os investimentos pretendidos pelas empresas do setor.

Em entrevista ao estúdio eixos, na Rio Pipeline & Logistics, O presidente-executivo da Associação de Empresas de Transporte de Gás Natural por Gasoduto (ATGás), Rogério Manso, saiu em defesa do Plano.

Ele acredita que o planejamento das transportadoras ainda passará por um “processo evolutivo” e caminhará, no futuro, para ser um plano “com caráter um pouco mais determinativo”.

Mas que, nesse primeiro momento, a aprovação do plano não funcionará como uma autorização automática para os projetos.

“Ele vai ser uma referência, mas ele não vai ser hoje do tipo: ‘foi aprovado, eu vou sair para construir’. Até porque vários projetos ainda estão em fase pré-conceitual, a maioria dos projetos na verdade… vai passar por processo de FID [decisão final de investimento] nas transportadoras, vai passar por processo de teste de demanda…”, disse. Assista na íntegra

Entre os projetos considerados mais maduros pelas transportadoras estão os reforços à segurança do suprimento, com destaque para a construção de estações de compressão nas rotas da NTS (Japeri/RJ), TBG (Gaspar/SC) e TAG (Itajuípe/BA).

Manso defendeu a aprovação desses projetos, para não engargalar o sistema, e que a agenda regulatória da ANP precisa andar – numa resposta ao pedido da Abegás para suspensão de todas as consultas públicas em aberto que tratam do setor de transporte.

A ANP, aliás, negou esta semana o pedido da Abegás para prorrogar a consulta pública sobre o Plano Coordenado.

As distribuidoras defendem que as consultas sobre tarifas e sobre o Plano Coordenado deveriam aguardar o desfecho do Leilão de Reserva de Capacidade (LRCAP) em 2026 – e que vai dar um sinal mais claro sobre a demanda por capacidade dos gasodutos pelas termelétricas.

O Plano Coordenado servirá como insumo ao Plano Nacional Integrado (PNIIGB), novidade trazida pelo decreto 12.153/2024.

A interação entre os dois planejamentos (um das transportadoras, outro estatal) levantou dúvidas no mercado.

O Conselho de Usuários entende que há riscos de sobreposição de processos (o PNIIGB, por exemplo, tem uma chamada pública própria para estimativas de demanda) e pediu esclarecimentos à ANP se a aprovação do Plano Coordenado irá subsidiar o Plano Integrado; ou terá o condão de aprovar os investimentos contemplados no documento da EPE.

  • Plano Coordenado é uma herança da Lei do Gás de 2021. É um plano proposto pelos transportadores que contempla as providências para otimização, reforço, ampliação e construção de novas instalações do sistema de transporte, conforme regulação da ANP, a quem cabe analisar e aprovar a proposta, após consulta pública.
  • Plano Integrado faz parte das mudanças introduzidas pelo decreto 12.153/2024 e visa subsidiar a ANP no processo de outorga de novos projetos (não só de transporte). A EPE indicará, por meio do PNIIGB, as melhores alternativas de expansão das infraestruturas.

O decreto diz que a ANP poderá solicitar à EPE a elaboração de estudos específicos para suporte à outorgas e, inclusive, aos planos coordenados. Por outro lado, a EPE poderá solicitar à ANP informações sobre os planos coordenados para subsidiar o Plano Integrado.

Os planejamentos, portanto, retroalimentam-se, disse Heloísa Borges, da EPE. Ela explica que o grau de maturidade dos projetos é o principal diferencial entre eles.

Nem todos os projetos apresentados pelas transportadoras serão necessariamente incorporados ao Plano Nacional Integrado. A maior parte ainda se encontra em fase pré-conceitual e de baixa maturidade.

“[O Plano Coordenado] tem diferentes graus de maturidade do projeto. Tem projetos que ainda estão no campo das ideias e não tem nem traçado definido. Tem projetos que são alternativos”.

“Quando ainda precisa de amadurecer, uma coisa muito ainda na fase pré-conceitual, ele não entra no plano integrado”, disse a diretora da EPE no último episódio do videocast gas week.

Em tempo: a primeira edição deve recomendar a construção de dois hubs para injeção de biometano na malha de gasodutos de transporte – um em São Paulo e outro no norte do Paraná.

Outra novidade do Plano Integrado será a recomendação de uma rota de integração com o mercado argentino. O projeto segue sob sigilo, o plano vai sugerir a rota atualmente “mais madura”. 

  • No sétimo episódio do videocast gas week, o diretor-geral da TSB, Walter Farioli, antecipou que a EPE havia incorporado, nos seus estudos do Plano Integrado, o trecho Uruguaiana-Triunfo. Assista na íntegra

Eneva questionou a ANP sobre a competência legal da ATGás em propor o Plano Coordenado.

A empresa pediu, inclusive, a interrupção da consulta pública sobre o planejamento, até que o assunto fosse avaliado pela Procuradoria Federal junto à agência e a associação fosse formalmente designada como gestora da área de mercado.

  • O gestor da área de mercado é uma figura introduzida pela Lei do Gás de 2021 como um “ente regulado e fiscalizado pela ANP responsável pela coordenação da operação dos transportadores”.

Pela lei, transportadores que operem em uma mesma área de mercado de capacidade deverão constituir o gestor, nos termos da regulação da ANP. Esse gestor, uma vez constituído, tem como uma de suas obrigações submeter o plano coordenado à aprovação do regulador.

O decreto 12.153/2024, por sua vez, prevê que os planos coordenados podem ser submetidos pelos gestores das áreas de mercado ou pelos transportadores.

As transportadoras entendem, por sua vez, que a criação do gestor só fará sentido no momento em que o mercado tiver mais de um transportador operando na mesma área de mercado – hoje, TAG, NTS e TBG operam áreas diferentes, com tarifas diferentes entre si.

A  ATGás esclareceu, em nota, que, conforme previsto na Lei do Gás, o Plano Coordenado foi proposto pelos transportadores e que associação apoiou a elaboração e encaminhou o documento à ANP.

A associação entende, ainda, que o momento pede “colaboração entre governo, iniciativa privada e sociedade para aprimorar o plano e propor melhorias, fortalecendo a abertura de mercado”.


Gás de fora do Redata. O critério de habilitação por fonte de energia para habilitação na Política Nacional de Data Center, criada pela MP 1318/2025, não incluirá a geração termelétrica a gás.

Revisão tarifária. A Comissão de Infraestrutura do Senado marcou para a próxima quarta (24/9) a audiência pública sobre a revisão das tarifas de transporte, a pedido do senador Laércio Oliveira (PP/SE).

Gás argentino. As tradings Interco e NEG Energia receberam autorização da ANP para importar gás natural da Argentina. A Interco poderá importar até 150 mil m³/dia de gás, via Gasbol; enquanto a NEG obteve aval para importação de 31,25 milhões de m³/ano – o equivalente a cerca de 85 mil mil m³/dia.

Biometano. A Tramontina passou a consumir o gás renovável, em substituição parcial ao gás natural, em duas de suas unidades industriais no Rio Grande do Sul. O biocombustível será fornecido pela Ultragaz.

Fertilizantes. A Petrobras concluiu a licitação para os serviços de operação e manutenção das fafens da Bahia e Sergipe. A estatal assinou contrato com a Engeman para reiniciar as atividades nas unidades, o que está previsto para ocorrer até o fim deste ano.

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