ENTREVISTA-Para ser justa, transição tem que considerar custo social

Agnes da Costa fala sobre transição justa
Brasília-DF 11/03/2019 Workshop Dia Internacional da Mulher. Agnes Maria de Aragão da Costa, Chefe da Assessoria Especial em Assuntos Regulatórios do MME Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) Foto: Saulo Cruz/MME

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Diálogos da Transição

eixos.com.br | 01/06/21
Apresentada por

Editada por Nayara Machado
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Descarbonizar a matriz energética é um desafio que vai exigir dos países soluções diferentes para pontos de partida diferentes, de acordo com a assessora especial em assuntos regulatórios do Ministério de Minas e Energia (MME), Agnes da Costa.

Em entrevista à Diálogos da Transição, Agnes defende o conceito de transição justa — isto é, olhar para a vocação de cada país e onde está o potencial para uma descarbonização mais rápida.

Segundo a especialista, o Brasil tem um ponto de partida diferente de outros países porque no passado fez escolhas tecnológicas que levaram a uma das matrizes elétricas mais renováveis do mundo.

“Os países partem de pontos diferentes. E aí, considerando os pontos de partida, é importante dizer que cada país tem seus recursos energéticos e tecnológicos para fazer esse movimento de descarbonização da maneira mais eficiente – em termos de eficiência e em termos de custo para suas sociedades”, explica.

No caso brasileiro, ela destaca que o uso de biocombustíveis e a interligação do sistema elétrico colocam o país em uma situação mais confortável e que a matriz elétrica brasileira contribui para que o setor energético seja responsável por menos emissões.

O grande desafio para o Brasil será reduzir as emissões de transporte e indústria, aponta.

Crítica da eletrificação como uma solução universal, Agnes explica que apesar da vantagem brasileira, que tem um sistema elétrico interligado, o custo dos veículos para a população ainda é uma barreira.

A assessora especial do MME considera que o país não tem recursos públicos para subsidiar a tecnologia.

“Quando se fala em flexibilidade é um pouco um contraponto à narrativa dominante que vem da Europa de que transição energética é eletrificar o sistema energético”.

“As pessoas estão de fato olhando quanto vai custar para a sociedade fazer todas essas transformações?”, questiona.

Confira os principais pontos da entrevista:

Eletrificação

“Existe uma discussão muito grande ainda sobre métricas. Como você mede que uma opção tecnológica, com tudo que está por trás dela, é relevante para a sustentabilidade”.

Para Agnes, há ainda um trabalho de desenvolvimento tecnológico a ser feito, e ele pode passar pela eletromobilidade.

Ela diz que o Brasil não vai descartar esta opção, mas que a aposta continua sendo os biocombustíveis, especialmente para frotas pesadas.

“Os biocombustíveis também têm potencial para [descarbonizar] o transporte de longa distância. Aí não dá para eletrificar, então você pode usar o biocombustível, pode usar a célula combustível com o hidrogênio.

Tem muitas outras tecnologias que a gente tem que estudar”.

Ela também chama a atenção para o caso dos países africanos.

“Em termos de rede, na África, menos da metade da população tem acesso a redes de energia elétrica.

Como é que a gente fala que a transição da mobilidade na África vai passar pela eletrificação?

Eu acho estranho que a gente veja a eletrificação como uma solução que vai suprir todo mundo, principalmente os países em desenvolvimento, quando muitos ainda não têm acesso à energia elétrica tão universal como o Brasil”.

Nota: Embora no Norte da África, países como Marrocos, Argélia, Líbia e Egito tenham quase 100% da população com acesso à eletricidade, nos países subsaarianos as taxas variam entre 14% e 1%. Na África do Sul, 94,3% da população tinha acesso à eletricidade em 2019, segundo a Agência Internacional de Energia

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Precificação do carbono

A precificação do carbono para o setor elétrico está em estudo pelo governo, como uma alternativa para valoração dos atributos ambientais previstos na lei 14.120/2021 (MP 998).

“A gente está discutindo com apoio da Agência Internacional de Energia e do Ministério da Economia a questão do mercado de carbono, se é uma forma mais eficiente de valorar esses benefícios ambientais, para o médio e longo prazo, a gente vai migrar para mercado de carbono”.

Segundo Agnes, a ideia é aproveitar o momento para fazer um desenho de mercado consistente com o internacional.

“Mesmo assim existe essa questão: quanto fica mais caro para países em desenvolvimento ter o mercado de carbono?

A gente está falando de gaps muito grandes de desenvolvimento.

“Existe ainda um contingente grande de pessoas que precisa ser incorporado por processos de desenvolvimento econômico e social, e essa incorporação vai levar a um aumento de demanda por energia no futuro. A gente tem que ter esse olhar”

Pressão da sociedade e dos investidores

“A gente chegou a um momento em que a gente pode ter um ciclo de retroalimentação muito positivo — dos investidores exigirem isso das empresas e as empresas, de alguma forma, exigirem isso dos governo”.

Agnes observa que a sociedade já entendeu que não adianta cobrar só os governos.

“Os investidores têm o poder de influenciar o caminho que as empresas têm adotado quando orientam os recursos para, por exemplo, ter métricas muito claras sobre ações de redução de emissões.

Eu gosto do momento atual porque está mais clara a pauta.

Está mais claro onde a gente quer chegar — na descarbonização –, e estão mais claros os instrumentos: são os formuladores das políticas públicas de antemão já pensando no que a gente pode fazer.

Mas também são os agentes privados fazendo seu dever de casa”.

Curtas

O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, defendeu nesta segunda (31) a continuidade dos investimentos na exploração e produção de petróleo e gás no Brasil, Segundo Albuquerque, nos últimos dois anos o setor nacional de energia e mineração atraiu US$ 30 bilhões — 26% do total de capital estrangeiro que entrou no Brasil. epbr

Também na segunda, o ministro afirmou que até o final do ano o governo vai apresentar um marco regulatório para a geração eólica offshoreMME

As três principais plantas da Baker Hughes em Macaé reduziram em mais de 250 mil toneladas suas emissões de CO2 em 2020, com o uso de renováveis (solar, biomassa, eólica e PCHs) no abastecimento de energia. A iniciativa é parte do objetivo global da empresa fornecedora das indústrias de petróleo e gás de reduzir em 50% suas emissões até 2030, com o objetivo final de zerar até 2050.

Na contramão dos planos para eliminar o carvão de Estados Unidos e países da Europa e da Ásia, o governo russo de Vladimir Putin está gastando mais de US$ 10 bilhões para modernizar ferrovias, o que ajudará a impulsionar as exportações da commodity. Putin aposta que o consumo de carvão continuará a aumentar em grandes mercados asiáticos como a China. Bloomberg/Exame

O governo afastou sete investigados na operação da Polícia Federal que apura facilitação à exportação ilegal de madeira. Os nomes foram publicados no Diário Oficial da União nesta terça (1). Apenas o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, permanece no cargo. Gazeta do Povo

A Petrobras comunicou nesta segunda (31) que concluiu a venda da totalidade de sua participação de 51% no capital da sociedade Eólica Mangue Seco 2 para a Mangue Seco Participações S.A. A operação foi concluída com o pagamento de R$ 34,2 milhões para a Petrobras. UOL/Estadão

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