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Petrobras se prepara para começar a importar gás argentino

Até então de fora dos primeiros testes, Petrobras obtém aval do governo argentino para importar 1 milhão de m³/dia

Governo de Javier Milei avança na liberação das exportações de petróleo e gás natural na Argentina. Na imagem: Instalações onshore de Vaca Muerta, na Argentina (Foto: Divulgação)
Instalações onshore de Vaca Muerta, na Argentina (Foto: Divulgação)

PIPELINE. Petrobras começa a se preparar para importar gás argentino. De olho na janela do verão, 19 empresas, entre produtores e comercializadores, movimentam-se para explorar as oportunidades de integração.

Sai o novo decreto do mandato do biometano. Petrobras acena para aquisição de plantas existentes do biocombustível. A cobertura do estúdio eixos no 12º Fórum do Biogás. ANP abre contratos legados. Agenda regulatória do gás em xeque. Novo gasoduto Rússia-China e mais. Confira:


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Até então de fora dos primeiros movimentos de importação de gás natural da Argentina, a Petrobras começa a se preparar para explorar oportunidades de trazer molécula do país vizinho.

A estatal já avançou nos trâmites: obteve autorização do governo argentino para importar até 1 milhão de m³/dia, na modalidade interruptível, via Bolívia.

A fonte é seu gás próprio. A companhia, por meio de sua subsidiária Petrobras Operaciones S.A., tem uma fatia de 33,6% no ativo Rio Neuquén, na Bacia de Neuquén, e que é operado pela estatal argentina YPF.

Petrobras e YPF, aliás, mantêm um acordo não vinculante, até 2027, para avaliação de possíveis oportunidades de negócios em exploração e produção.

O gás argentino é, para a empresa, uma peça extra dentro do seu portfólio:

  • “A Petrobras está constantemente avaliando oportunidades para otimização do seu portfólio de comercialização/suprimento”
     
  • “Nesse contexto, o gás argentino passa a compor uma oportunidade adicional em base interruptível para a composição do portfólio de oferta de gás natural da Petrobras”, esclareceu a companhia à agência eixos, ao ser questionada sobre as oportunidades no país vizinho.

A expectativa é que no próximo verão uma nova janela de oportunidades de importação do gás argentino se abra.

As perspectivas de integração já movimentam 19 empresas, entre produtores do país vizinho e comercializadores do lado de cá da fronteira (veja na seção quem é quem, mais adiante)

A seguir, a gas week faz um giro pelas perspectivas de integração do Cone Sul.

  • Mas, antes, aquele convite para você se conectar ao sexto episódio do videocast gas week, com a diretora-presidente da Energisa Distribuição de Gás, Débora Oliver.  Assista na íntegra


A expectativa no mercado é de que, a partir de outubro, até abril de 2026, a janela de importação da Argentina volte a se abrir, na modalidade interruptível.

É nesse período que, sazonalmente, o consumo interno cai e a Argentina tem excedentes para exportar.

Mas a tendência é que as operações comecem a ganhar mais tração a partir de janeiro, quando começam a valer os novos preços mínimos de exportação – mecanismos previstos nos contratos do Plano Argentino de Fomento à Produção de Gás Natural (Plan Gas.Ar), no governo de Alberto Fernández.

Para melhorar a competitividade do gás argentino, o governo de Javier Milei vai reduzir os preços mínimos a partir de 2026 – mas, por força dos contratos do Plan Gas.Ar, só deixarão de existir em 2028.

Tecpetrol, produtora de óleo e gás do Grupo Techint, estima que o preço do gás argentino conseguirá chegar ao Brasil, assim, 19% mais barato do que o valor praticado nas primeiras operações de teste, em abril deste ano.

É “pouco menos de US$ 1 por milhão de BTU”, afirmou o gerente da unidade Brasil da Pluspetrol, Pablo Campana, no quinto episódio do videocast gas weekAssista na íntegra

“[A redução do preço mínimo] favorece o dinamismo do mercado, a arbitragem de preços que há entre um mercado e outro, mas ainda temos um preço mínimo”, ressalvou.

Campana acredita que, mesmo com algumas limitações, haverá mais atividades na próxima janela.

“Vamos ter, eu imagino, alguns volumes pequenos, [mas] mais regulares, mais constantes. E também podemos esperar alguma coisa, algum volume mais importante, mas por prazos mais curtos”, avalia.

Sem novos investimentos estruturais, a capacidade de exportação da Argentina ao Brasil, via Bolívia, no verão, limita-se a uma faixa de 3 milhões a 4 milhões de m³/dia.


A capacidade da Argentina de exportar volumes firmes ao Brasil depende de novos investimentos na malha de gasodutos do país.

Transportadora Gas del Norte (TGN), do grupo Techint, desenhou um projeto de um novo gasoduto de 750 km (Neuquén-La Carlota), estimado em US$ 2 bilhões, e que visa aumentar a capacidade de envio do gás da Bacia de Neuquén, de olho tanto na demanda do Brasil quanto do mercado interno.

A TGN está concebendo o gasoduto com uma capacidade incremental de 20 milhões de m³/dia, sendo a metade disso destinada ao mercado brasileiro – o projeto pode ser redimensionado, a depender da demanda.

A transportadora também vê a necessidade de investir cerca de US$ 500 milhões na expansão do sistema atual, independente se a rota de exportação se derá por Bolívia, Chaco Paraguaio ou Uruguaiana.

Em julho, o projeto do oleoduto Vaca Muerta Oil Sur foi bem sucedido ao captar US$ 2 bilhões junto a bancos privados

Embora se trate de um projeto de óleo, mais fácil de se financiar, Campana destaca que o caso demonstra que projetos, se bem estruturados, podem se viabilizar no país vizinho.

O desafio será ancorar os novos gasodutos em contratos de longo prazo no Brasil – a Tecpetrol, por exemplo, espera fechar esses contratos até o fim de 2026, para que seja possível fornecer gás firme ao Brasil em 2028-2029.

Uruguai quer propor um projeto de um gasoduto para ligar Vaca Muerta ao Brasil, disse a ministra da Indústria e Energia, Fernanda Cardona, em uma entrevista à Bloomberg News. A ideia é iniciar as obras até 2030.

O Paisito também quer se posicionar como opção de rota para a integração do mercado de gás do Cone Sul, a exemplo do governo do Paraguai – país que não produz gás e tenta atrair investimentos em fertilizantes nitrogenados e geração de energia para data centers com o gás argentino.

A infraestrutura ociosa da Bolívia é, hoje, a única opção existente para transportar o gás argentino aos grandes centros de consumo do Brasil.

Em 2024, os governos do Brasil e Argentina anunciaram a criação de um grupo de trabalho para estudos conjuntos das rotas alternativas:

  • interligação via Uruguaiana (RS);
  • a rota pelo Chaco Paraguaio;
  • uma nova rota pelo Uruguai até o Rio Grande do Sul;
  • e o gás natural liquefeito (GNL).

rota uruguaia é vista com ceticismo pelo diretor-geral da TGN, Daniel Ridelener:

“O caminho mais óbvio é pela Bolívia. Outro que poderia ser bastante óbvio é por Uruguaiana… Se esse gasoduto for construído, estaremos fechando um anel de gás muito interessante. Há um terceiro caminho que o Paraguai propôs recentemente. Nessa área, há um corredor bioceânico, uma rota que liga o norte do Chile ao Oceano Atlântico e ao Brasil”

“Um quarto caminho, que do meu ponto de vista é muito pouco competitivo, é atravessar o Rio da Prata e chegar pelo Uruguai. E o quinto caminho, que acredito ser complementar, é via GNL”, analisou o executivo argentino, em encontro com jornalistas, no Rio de Janeiro, em agosto.

Em entrevista ao videocast gas week, o gerente sênior de Pesquisa da divisão de Gás e Energia do Cone Sul da Wood Mackenzie, Javier Toro, fez ressalvas à viabilidade de novas rotas.

“Com a perspectiva do aumento da produção doméstica [no Brasil] nos próximos dez anos, existe pouco espaço para fazer investimentos para trazer esse gás argentino de maneira mais firme com novos investimentos”, disse. Assista na íntegra

Segundo ele, a rota Uruguaiana-Porto Alegre, por exemplo, é um projeto que faz mais sentido a longo prazo: “Nos próximos dez anos, a produção nacional vai conseguir suprir grande parte do mercado doméstico brasileiro. Esse gasoduto faz sentido quando essa produção nacional começa a cair”.

Na visão da vice-presidente da Excelerate Energy para a América do Sul, Gabriela Aguilar, existe também um potencial de desenvolvimento de uma integração via GNL small-scale.

“A briga é qual é o mais conveniente: construir gasodutos novos ou fazer o transporte de GNL via terrestre. É uma briga que tem que ser bem consistente e bem analisada”, comentou, no videocast gas week. Assista na íntegra

A Argentina deve se tornar exportadora de GNL a partir de 2027 e a proximidade pode fazer do país uma fonte de suprimento importante para o Brasil – sobretudo para as térmicas.

Hoje, a principal fonte de GNL do mercado brasileiro são os produtores dos Estados Unidos.

Javier Toro, da Wood Mackenzie, acredita que a Argentina terá uma vantagem competitiva contra o GNL dos EUA em termos de custo de frete. E que há oportunidades de que o mercado brasileiro assuma compromissos de contratos de longo prazo com os argentinos.

As turbulências da guerra tarifária de Donald Trump podem ajudar a aproximar o GNL argentino do Brasil?

Para o diretor-geral da Pan American Energy (PAE) no Brasil, Alejandro Catalano, a proximidade geográfica será o item de maior peso para o futuro da integração do Cone Sul.

“É um projeto de longo prazo. Uma conjuntura global poderia em algum momento ajudar mais ou menos. Acredito que o principal ponto que vai fortalecer essa potencial negociação, que não tenho dúvida que vai acontecer entre Argentina e Brasil, é a proximidade”, analisa.

E, no meio da construção dessa integração regional, temos eleições por vir, em outubro, tanto na Bolívia – e que podem mexer com os rumos da indústria de gás do país de trânsito do gás de Vaca Muerta ao Brasil – quanto na própria Argentina (nesse caso, eleições parlamentares de meio de mandato).

O primeiro turno das eleições bolivianas confirmou o senador centrista Rodrigo Paz Pereira (Partido Democrata Cristão) e o ex-presidente Jorge “Tuto” Quiroga (Aliança Livre), mais à direita no espectro político, no segundo turno em 19/10. É o fim de um ciclo de duas décadas da esquerda no poder.

Ambos acenam com reformas para atrair investimentos para recuperar as reservas de gás natural — um dos pilares da balança comercial do país. (veja as propostas dos candidatos)

Bolívia será concorrente da Argentina? Na avaliação da Rystad Energy, Quiroga e Paz prometem impulsionar as exportações de gás, ao mesmo tempo em que aprimoram o arcabouço legal para atrair investimentos estrangeiros e reverter a nacionalização do setor. 

Novos investimentos levarão tempo para se materializar, mas podem ter impactos significativos para a integração regional.

“Mais estabilidade no setor de gás boliviano pode fornecer uma rota confiável para exportar gás para o Brasil, mas também pode levar ao aumento da concorrência pelos volumes de exportação pretendidos devido às altas distâncias de Vaca Muerta ao Brasil, o que implica em custos adicionais”, cita relatório recém publicado pela Rystad.

A consultoria destaca que um potencial aumento na oferta de gás boliviano poderia ser capitalizado por agentes privados no Brasil.

A Bolívia vem se consolidando como fonte importante e contínua para os comercializadores privados no Brasil em 2025. Edge, Galp, MGás, Shell e YPFB reservaram, juntas, uma capacidade de 2,3 milhões de m³/dia em Corumbá (MS), a porta de entrada do gás importado no Gasbol.

  • Já na Argentina… o cenário, no momento, é de enfraquecimento do governo Milei. Há duas semanas, o presidente argentino precisou ser retirado às pressas durante ato de campanha na província de Buenos Aires, onde ocorrem eleições provinciais no domingo (7/9).

O resultado pode ditar tendência para a eleição legislativa de outubro – aposta de Milei para reduzir sua desvantagem no Parlamento.

O governo Milei surfava a onda do controle da inflação e do dólar, mas mergulhou, em agosto, numa crise de popularidade em meio à publicação de áudios que relacionam a secretária e irmã do presidente, Karina Milei, a uma suposta rede de subornos na Agência Nacional de Incapacidade.

Antes mesmo disso, Milei vinha acumulando derrotas no Legislativo. (BBC)

O movimento de integração do mercado de gás com o Brasil, é bem verdade, é capitaneado pela iniciativa privada.

Mas uma mudança nos rumos da macroeconomia do país pode ter impactos sobre a capacidade de atração de investimentos e revisão das taxas sobre a exportação de gás, por exemplo.

As perspectivas de integração entre Brasil e Argentina já movimentam 19 empresas, entre produtores do país vizinho e comercializadores do lado de cá da fronteira – alguns deles braços dos produtores argentinos.

Além da Petrobras, outros oito produtores de gás na Argentina já obtiveram a autorização do governo local para exportar gás ao Brasil e têm acordos de suprimento com comercializadores do lado de cá. São eles:

  • Oilstone Energía (com acordo com a MGás)
  • Pampa Energía (com Eneva e Tradener)
  • Pan American Energy (com Comgás, PAE do Brasil e Tradener)
  • Pluspetrol (com Gas Bridge)
  • Tecpetrol (com Edge, Eneva, MGás e Tradener)
  • TotalEnergies (com MTX Comercializadora, Eneva, Total Energies EP Brasil, Edge e MGás)
  • Vista Energy (com Cinergia)
  • YPF (com PAE do Brasil, MGás e Tradener)

Mandato do biometano. O governo publicou na sexta (5/9) o decreto que regulamenta o Programa Nacional de Descarbonização do Produtor e Importador de Gás Natural e de Incentivo ao Biometano. (na íntegra)

  • mandato precisa ser bem calibrado para assegurar espaço para o mercado voluntário, alerta o diretor de Gases Renováveis da Ultragaz, Erik Trench, em entrevista ao estúdio eixos no 12º Fórum do Biogás.

Petrobras no biometano. Magda Chambriard afirmou que a estatal deverá investir em plantas existentes de biometano por meio de fusões e aquisições e que há “conversas avançadas com players do setor” nesse sentido.

  • Na visão da presidente-executiva da ABiogás, Renata Isfer, a entrada da Petrobras na produção de biometano é favorável para o crescimento do setor. Ela não vê grandes riscos de concentração na oferta.

Direto do 12º Fórum do Biogás… A Eren Biogás Brasil espera tomar a decisão de investimento nos seus primeiros projetos em biogás e biometano nos próximos 12 meses, disse o CEO, Pierre Moussafir, ao estúdio eixos.

Ônibus a biometano. O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), assinou o decreto do programa Bio SP, com regras para incorporação progressiva do biometano à frota de transporte público e de veículos de coleta da cidade.

Descarbonização do transporte. A redução dos pedágios para caminhões a gás, nas rodovias, deveria ser pensada como a próxima política de estímulo, defendeu o diretor Institucional da Scania, Gustavo Bonini.

  • Para o diretor de novos negócios da Copersucar, Daniel do Valle, a troca do diesel pelo biometano na frota da indústria sucroalcooleira é uma oportunidade para reduzir ainda mais a pegada de carbono do etanol.

Contratos legados. A ANP abriu, com tarjas, o conteúdo dos contratos das transportadoras de gás natural. A divulgação é uma resposta a um pedido do MME, em meio ao processo de revisão tarifária das transportadoras.

Agenda regulatória em xeque. A Abegás pediu à ANP que suspenda não só a regulamentação dos critérios para classificação de gasodutos, mas as todas as consultas públicas em aberto que tratam do setor de transporte de gás.

  • Opinião: Sobreposição de consultas e audiências públicas sobre o elo do transporte de gás confunde mercado e pode resultar em graves prejuízos para usuários, escreve Zevi Kann

Novo gasoduto Rússia-China. Os países assinaram um memorando “legalmente vinculativo” para avançar na construção do gasoduto Power of Siberia 2, um projeto que deve consolidar o papel de Pequim como o cliente de energia mais importante de Moscou — que busca substituir os mercados europeus perdidos depois da invasão à Ucrânia.

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