diálogos da transição

Leilão de potência reacende polêmica do carvão

Organizações criticam inclusão de UTEs a carvão no LRCAP: alto impacto ambiental e baixa eficiência

Menos eficientes, usinas a carvão foram as que mais emitiram CO₂ entre termelétricas brasileiras, aponta estudo. Na imagem: Vista das instalações da termelétrica a carvão mineral Candiota III (RS), com capacidade instalada de 350 MW (Foto: Divulgação CGT Eletrosul)
Termelétrica a carvão mineral Candiota III (RS), com capacidade instalada de 350 MW (Foto: Divulgação CGT Eletrosul)

NESTA EDIÇÃO.  Anace e Fiemg questionam opção pelo carvão para atendimento à demanda de potência flexível.

Custo elevado, alto impacto ambiental e baixa eficiência na contratação são algumas críticas.

Arayara aponta que Candiota, no RS, será a principal beneficiada.


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A previsão de contratação de usinas a carvão no leilão de reserva de capacidade (LRCAP) reacendeu a discussão sobre o papel — e os custos — dessa fonte fóssil na matriz elétrica brasileira, que é marcada por alta renovabilidade.
 
Organizações da indústria e ambientais criticam a insistência política na prorrogação do prazo do carvão na geração de energia, enquanto o setor carbonífero — concentrado na região Sul — defende que a descontinuidade do fóssil depende de planos concretos para uma transição justa.
 
O leilão, cujo edital foi publicado para consulta pública na última sexta (22/8), vai contratar termelétricas existentes a carvão e gás natural, além de usinas novas a gás, e a ampliação de usinas hidrelétricas. Os projetos precisam entrar em operação entre 2026 e 2030.
 
É a segunda versão da proposta do governo. A primeira, previa a realização do certame em junho, mas foi cancelada após judicializações
 
A inclusão das térmicas a carvão e retirada dos biocombustíveis da concorrência acenderam o alerta na Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Aanace).
 
Em nota, a organização que representa indústrias que consomem 10 mil MW médios de energia e 1 milhão de m3 por dia de gás, aponta custo elevado, alto impacto ambiental e baixa eficiência na contratação das usinas.
 
E questiona a flexibilidade — um dos objetivos do leilão — nesse tipo de contratação.
 
“As usinas a carvão mineral disponíveis para participar do leilão têm prazos de entrada e saída de operação muito longos, não atendendo o principal requisito desse processo competitivo, que é o atendimento à demanda de potência flexível”, diz em nota.
 
Vale dizer: o MME propõe que a flexibilidade seja tanto um critério de habilitação das térmicas, como um fator de decisão dos lances vencedores. 
 
Ao incluir o carvão, defende se tratar de uma opção por utilizar todos os recursos disponíveis no país para atender a rampa de carga — o entra-e-sai diário das renováveis.
 
A Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) se soma às críticas à inclusão de usinas a carvão e defende prioridade para “fontes rápidas e limpas” que garantam flexibilidade e segurança ao sistema elétrico.
 
“O leilão deve priorizar tecnologias capazes de fornecer agilidade operacional, como hidrelétricas reversíveis, sistemas de armazenamento em baterias e programas de Resposta da Demanda (RDV). Essas soluções conseguem despachar energia em segundos, enquanto uma térmica a carvão pode levar horas ou até um dia para atingir plena operação”, diz em nota.



Instalada em Candiota, no Rio Grande do Sul, com 350 MW instalados, a usina termelétrica Candiota III é uma forte candidata ao leilão. 
 
Seu contrato para fornecimento no mercado brasileiro venceu em 31 de dezembro de 2024 e, no momento, a UTE da J&F (Âmbar Energia) está despachando no mercado spot.
 
Para ambientalistas, a usina gaúcha é a principal beneficiada pelo novo edital. Isso porque o Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, em Santa Catarina, já tem contratação prevista para entrar em vigor em 1º de janeiro de 2026, no Programa de Transição Energética Justa (TEJ) sancionado por Jair Bolsonaro em 2022.
 
“O Brasil não tem novos projetos de licenciamento ambiental de usinas a carvão em andamento, pois a UTE Nova Seival já teve o processo encerrado pelo Ibama, e a UTE Ouro Negro está sendo arquivada. Essa inclusão parece uma manobra para contemplar a UTE Candiota III”, comenta o gerente de transição energética da Arayara, John Wurdig.
 
A ONG ambiental aponta que entre junho e julho deste ano, mais de R$ 26 milhões foram repassados à Âmbar Energia, responsável pela UTE, pela Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), paga pelos consumidores. Mas esta energia está indo para os vizinhos do Brasil.
 
Também na sexta, a Arayara conseguiu na Justiça a derrubada da licença de operação de Candiota e determinação de uma série de ações climáticas. Veja a sentença (.pdf). Para participar da licitação, é preciso reverter a decisão.
 
Apesar desse movimento, a Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS) afirma que toda a cadeia produtiva do carvão segue funcionando, com todas as suas licenças e de acordo com todos os parâmetros legais. 
 
“A ABCS reforça também seu compromisso com uma transição energética justa, inclusiva e responsável do ponto de vista ambiental, social e econômico”, diz o presidente da associação, Fernando Luiz Zancan, em nota.


Além da Foz do Amazonas. Enquanto avança nos processos finais para a licença de perfuração na bacia da Foz do Amazonas, a Petrobras traça os próximos passos para a exploração da Margem Equatorial. Nos planos da petroleira está uma nova perfuração em águas profundas na Bacia Potiguar em 2026.
 
Retorno aos fósseis. O presidente dos EUA, Donald Trump, reiterou críticas a projetos de energia verde, durante discurso de abertura em reunião do gabinete do governo nesta terça-feira (26/8). E disse esperar que países que investem nessas tecnologias “voltem para os combustíveis fósseis”.
 
Biodiesel a bordo. A produtora de sucos e ingredientes de laranja Citrosuco anunciou nesta terça (26/8) a primeira viagem de longo curso da sua frota de navios com uma mistura de 24% de biodiesel no combustível marítimo. 

  • O navio atracou no porto de Santos (SP), após período na Turquia, trazendo consigo as primeiras 500 toneladas de B24 a bordo dos tanques de combustível para iniciar a sua próxima viagem com destino aos Estados Unidos.

Corrida mineral. O chanceler da Alemanha, Friedrich Merz, e o primeiro-ministro do Canadá, Mark Carney, anunciaram, nesta terça (26), parcerias em minerais críticos e energia. Um dos objetivos é aprofundar a cooperação para proteger cadeias de fornecimento de minerais essenciais.
 
Energia alivia inflação. Os gastos das famílias brasileiras com a energia elétrica residencial caíram 4,93% em agosto, item de maior impacto individual negativo sobre o IPCA-15) do mês, uma contribuição de -0,2 p.p. O resultado é consequência da incorporação do Bônus de Itaipu.
 
Sistemas isolados. A Aneel aprovou nesta terça-feira (26/8) a minuta do edital do leilão para suprimento aos sistemas isolados, de 2025, que vai contratar empreendimentos para o atendimento nos mercados não conectados ao SIN. São 11 localidades situadas em diferentes municípios nos estados do Amazonas e Pará.
 
Moratória da soja. A Justiça Federal em Brasília derrubou na segunda (25/8) a decisão do Cade que suspendeu a Moratória da Soja, o acordo que proíbe a compra de soja cultivada em áreas desmatadas da Amazônia. A decisão foi proferida pela juíza Adverci Rates Mendes de Abreu, da 20ª Vara Federal, a partir de um pedido da Abiove.
 
Conservação da água. A Engie vai selecionar quatro iniciativas relacionadas ao uso e conservação da água, nos estados da Bahia, Ceará ou Rio Grande do Norte, em um edital totalizando R$ 60 mil em investimentos. As inscrições podem ser feitas até 30 de setembro.

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