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Nuclear, baterias e hidrelétricas frustradas com Plano Clima

Proposta brasileira para transição reserva espaço para termelétricas e frustra alternativas de menor emissão

Complexo nuclear das usinas de Angra 1 e 2 (Foto Divulgação
Complexo nuclear das usinas de Angra 1 e 2 (Foto: Divulgação)

NESTA EDIÇÃO. Associações apontam dados desatualizados e ambições fracas para algumas alternativas à geração fóssil na proposta brasileira para transição.

Com a COP30 marcada para novembro no Brasil, governo prepara para apresentar o país como modelo de renovabilidade.


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Em consulta pública até 18 de agosto, o roteiro brasileiro para cumprir sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) ao Acordo de Paris chegou como uma má notícia para alguns setores da indústria energética. Mas não estamos falando da fóssil.
 
Nuclear, armazenamento em baterias e hidrelétricas avaliam as ambições do Plano Clima para a matriz brasileira até 2035 como desatualizadas e, em alguns casos, marcadas por “ativismo” e “questões tecnicamente equivocadas”.
 
É o caso da indústria nuclear. Em entrevista à agência eixos, o presidente da Associação Brasileira para Desenvolvimento de Atividades Nucleares (Abdan), Celso Cunha, observa que os caminhos apontados para a transição brasileira desconsideram o papel estratégico da energia nuclear na descarbonização da matriz energética.
 
“Participamos ativamente da discussão do Plano Clima. Mas esse plano me parece mais um ativismo do que algo efetivamente e tecnicamente pensado”, aponta.
 
Para ele, as poucas referências à energia nuclear no documento, restritas à conclusão de Angra 3 e menções a barreiras econômicas e sociais, estão desatualizadas.
 
Isso porque o único compromisso concreto é a realização de um estudo de viabilidade para Angra 3 até 2032. A obra está paralisada desde 2015, com custos que chegam a R$ 1 bilhão por ano.
 
A associação enxerga um potencial ainda inexplorado para pequenos reatores modulares (SMRs) que poderiam ser usados como solução para descarbonização da indústria — especialmente do setor de óleo e gás. 
 
Além de ser uma opção de energia firme para deslocar a dependência de termelétricas fósseis. Estas, aliás, estão com espaço garantido na proposta brasileira para transição energética. Leia na matéria de Gabriel Chiappini



A meta brasileira mais ambiciosa para 2035 prevê uma certa estabilidade de emissões, com um aumento de 1% — mas deixa uma janela aberta para alta de 44% em uma década.

Isso porque a escolha política é por manter a geração termelétrica como uma garantia de suprimento firme, para lidar com intermitências de solar e eólica e o impacto de eventos climáticos extremos sobre o setor elétrico. 

Uma escolha política porque outras opções tecnologicamente disponíveis, como as baterias, não receberam a mesma atenção no plano elaborado por Ministério de Minas e Energia (MME), Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e Aneel.

O documento indica a meta de instalação de 800 megawatts (MW) de baterias, embora a indústria defenda que é possível chegar a 2 GW.

Para a Associação Brasileira de Soluções de Armazenamento de Energia (Absae), o governo se baseou em preços de referência antigos, o que distorceu a meta.

“O dado reflete as condições que a EPE utilizou de preço, que estão defasadas, e a falta de marco legal e regulatório, além de não haver previsão expressa de formas de remuneração específica”, critica em uma nota enviada à eixos em julho.

6,3 GW é a adição de capacidade hidrelétrica prevista no plano em consulta, três vezes menor do que o mercado espera e cerca de 5,73% dos 110 GW já em operação no Brasil.
 
“Com mais de 52% das hidrelétricas operando há mais de 35 anos, modernizar e repotenciar essas usinas é essencial para manter e ampliar a confiabilidade e a eficiência do sistema elétrico, sem impactos ambientais adicionais”, diz a presidente da Associação Brasileira de Geradoras de Energia (Abrage), Marisete Dadald.
 
A Abrage vê a possibilidade de expansão de 18,5 GW a partir de motorização de poços vazios, modernização de equipamentos e ampliação de casas de força.
 
Só o Leilão de Reserva de Capacidade (LRCAP), à espera de um novo edital e uma nova data, teve 5,4 GW registrados em 12 projetos de ampliação de hidrelétricas — 85% da meta anunciada pelo governo. Leia na matéria de Daniel Cardozo

Ainda assim, com sua matriz elétrica 88% renovável, o Brasil quer ser um exemplo para o mundo, usando a conferência das Nações Unidas deste ano como vitrine.
 
Nesta quinta (7/8), a CEO da COP30, Ana Toni, disse que o país deve “usar” a conferência, que será sediada em Belém (PA), para mostrar que pode ser um grande provedor de soluções em áreas como agricultura e energia renovável.
 
A cúpula climática será o momento de quase 200 países membros da conferência apresentarem suas ambições climáticas até 2035, o que deve dar o tom dos investimentos que precisam ser feitos e priorizados.
 
O Brasil, no entanto, tenta conciliar sua vocação renovável com a promessa desenvolvimentista da indústria de petróleo.
 
Enquanto um mundo em turbulências bélicas e tarifárias vai dando sinais de que não será capaz de abandonar de vez os combustíveis fósseis.


Tarifaço e energia. O presidente Lula  (PT), e o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, conversaram por telefone nesta quinta (7/8) sobre uma resposta conjunta ao avanço de barreiras comerciais unilaterais. Brasil e Índia são os únicos taxados em 50% pelos EUA. Eles também abordaram cooperação na área de energia.
 
Acionamento de térmicas. A Aneel deu início no mês de agosto a fiscalizações em usinas termelétricas apontadas como estratégicas para o atendimento do SIN. A medida é motivada pela redução dos níveis dos reservatórios durante a época seca e pela expectativa de maior uso das térmicas no segundo semestre e início de 2026.
 
Consumo em alta. O consumo de energia elétrica no Sistema Interligado Nacional (SIN) cresceu 1,7% em junho de 2025, na comparação com o mesmo mês do ano anterior, segundo o ONS. A carga média registrada no mês foi de 77.055 MWmed. No acumulado de 12 meses, a expansão da carga foi de 3,2%.
 
Nunes contra Enel. A Prefeitura de São Paulo entrou com uma ação na Justiça Federal para impedir a antecipação da renovação do contrato de concessão de energia elétrica com a Enel SP, que se encerra em 2028. Na ação, o município também defende a criação de um plano de contingência.
 
Política para minerais críticos. O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) está empenhado na aprovação, ainda este ano, de uma política de incentivos para minerais críticos e estratégicos. Segundo o presidente da organização, Raul Jungmann,  expectativa é ter o PL 2780/2024 aprovado até a COP30.
 
Conta ambiental. O TCU avalia que o Brasil não possui respaldo legal suficiente para implementar o Sistema de Contas Econômicas Ambientais (SCEA), padrão internacional que busca integrar dados sobre a economia e o meio ambiente. Além da lacuna legal, o TCU identificou falhas na coordenação institucional.
 
Tarifa social. As buscas online por informações sobre a Tarifa Social de Energia Elétrica cresceram 125% de julho de 2024 a junho de 2025, segundo estudo da Descarbonize Soluções. Foram mais de 400 mil buscas pelo termo nesse período.
 
Inovação aérea. A diretoria da Anac aprovou as regras para um sandbox regulatório com objetivo de viabilizar testes de modelos e tecnologias inovadoras na aviação que ainda não estejam contemplados pelas normas atuais. A expectativa é estimular a inovação no setor.
 
Mulheres da Energia. O 4º Congresso Brasileiro das Mulheres da Energia, marcado para 25 de agosto, em São Paulo, está com 100 vagas gratuitas para estudantes mulheres de cursos técnicos, tecnológicos ou superiores ligados às energias renováveis. É preciso acessar o site do evento, utilizar o voucher ESTUDANTE100 e preencher o formulário oficial. 

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