BRASÍLIA — Produtores de açúcar e etanol da Paraíba calculam impactos de R$ 40 milhões na cadeia produtiva com tarifas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre produtos brasileiros.
Segundo estimativas do Sindialcool da Paraíba, o impacto será maior para o açúcar, onde empresas e trabalhadores já foram contratados, já que o produto responde por cerca de 49% do total das exportações do estado.
Em 2024, Estados Unidos (US$ 20 milhões) e o Canadá (US$ 18 milhões), juntos, foram o destino de 47,3% de todo o valor exportado no segmento.
O sindicato que representa as usinas de etanol e açúcar na Paraíba divulgou, nesta sexta-feira (1/8), uma nota pública em defesa do etanol brasileiro e de uma parceria estratégica e sustentável com os Estados Unidos. A organização também critica a natureza política do tarifaço.
Oficializada pelo presidente dos EUA na última quarta (30/7), a tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros (10% anunciados em abril + 40%) deve entrar em vigor no dia 6 de agosto.
Quando divulgou os 40% adicionais no início de julho, Trump usou o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro como uma das justificativas para a medida, deixando claro o uso político das tarifas.
Embora a ordem executiva de Trump assinada esta semana tenha isentado quase 700 produtos, o etanol e o açúcar seguem sujeitos à taxação, o que preocupa a indústria sucroalcooleira.
“O Brasil, que detém quase 50% das exportações mundiais, tem direito a apenas 155 mil toneladas e viu recentemente a eliminação da cota de açúcar orgânico — medidas que afetam diretamente regiões como a Paraíba”, diz o Sindialcool em nota.
Segundo a organização, Brasil e Estados Unidos respondem juntos por cerca de 80% da produção mundial de etanol e devem compartilhar a responsabilidade de promoção global dos biocombustíveis como solução para a descarbonização do transporte, da aviação e do setor marítimo.
“No entanto, a assimetria atual nas políticas comerciais e ambientais entre os dois países impõe obstáculos à construção de uma aliança verdadeiramente estratégica”, observa.
Os produtores lembram que o Brasil substitui 45% da gasolina no ciclo Otto por etanol, o que garante um mercado equilibrado, inclusive com a o desenvolvimento da indústria de etanol de milho, o que justificaria a tarifa de 18% imposta às importações do biocombustível fora do Mercosul.
Em contrapartida, nos EUA, onde a produção chega a 60 bilhões de litros, a mistura de etanol está em 10%, com um excedente de 7 bilhões de litros que são “exportados agressivamente, muitas vezes com apoio diplomático e tarifário”.
Ainda assim, os Estados Unidos compram o biocombustível brasileiro, a uma tarifa de 2,5%, para cumprir políticas de descarbonização.
Isso porque o produto da cana de açúcar possui uma pegada de carbono significativamente menor: 22 gCO₂/MJ contra 66 gCO₂/MJ do etanol norte-americano de milho.
Em contrapartida, o açúcar paga uma taxa de US$ 357,6 a tonelada para entrar nos EUA, o que representa quase 100% do valor da commodity considerando os preços atuais.
Investigação contra o Brasil
Em 15 de julho, o Escritório do Representante Comercial dos EUA (USTR, na sigla em inglês) iniciou uma investigação contra o Brasil, tendo etanol e desmatamento entre seus alvos.
O processo, a pedido de Trump, vai averiguar se políticas e práticas adotadas pelo governo brasileiro são consideradas arbitrárias, discriminatórias e oneram ou criam barreiras ao comércio estadunidense.
Uma das preocupações é em relação possíveis restrições à entrada do etanol dos EUA no Brasil.
Para o Sindialcool, adotar etanol importado com maior intensidade de carbono contraria os compromissos ambientais do Brasil e os objetivos globais de descarbonização, sobretudo às vésperas da COP30.
Barreiras ao açúcar
Outra crítica dos produtores paraibanos é em relação ao fechamento do mercado estadunidense ao açúcar importado.
Há uma cota global de 1,1 milhão de toneladas distribuída entre 42 países, e o Brasil, que detém quase 50% das exportações mundiais, tem direito a apenas 155 mil toneladas.
“Ressaltamos que a presente tarifação se trata de um acréscimo sobre a taxa de 83% sobre o açúcar brasileiro que os Estados Unidos mantiveram nos últimos 30 anos como defesa do mercado à produção local”, diz a nota do Sindialcool.
“Ainda assim, nós no Brasil estamos dispostos a ampliar o engajamento com os Estados Unidos, evitar julgamentos precipitados, administrar as diferenças com maturidade e explorar mecanismos consistentes de cooperação”, continua.
“É urgente fortalecer canais bilaterais de comunicação e consulta (…). Relações baseadas em unilateralismo e práticas de pressão comercial (bullying) devem ser substituídas por respeito mútuo, previsibilidade e construção de confiança”, completa.