Critérios de sustentabilidade chegam ao crédito rural, por Natascha Trennepohl

Critérios de sustentabilidade chegam ao crédito rural, por Natascha Trennepohl

Ações relacionadas com sustentabilidade ganham destaque nos mais diversos setores da economia. Não é difícil encontrar práticas sustentáveis que tenham sido adotadas não em razão de uma obrigação legal, mas em razão de exigências do comércio internacional e de uma sociedade que tem buscado cada vem mais por produtos e empresas com ações sustentáveis. 

No setor agrícola não é diferente. Um dos setores mais importantes para a economia brasileira e em constante transformação, práticas sustentáveis podem ser encontradas tanto na agricultura de pequeno porte quanto nas atividades de grandes produtores, seja, por exemplo, através da implementação de um sistema de rotação de culturas ou da integração lavoura-pecuária-floresta.

Atento às transformações do setor, o Banco Central abriu recentemente uma consulta pública a uma proposta de resolução que foca na definição de critérios de sustentabilidade aplicáveis à concessão de crédito rural. 

Na Consulta Pública 82/21 – aberta até o dia 23 de abril, critérios para auxiliar na classificação das operações de crédito rural são detalhados. A ideia é que um empreendimento, quando classificado como operação sustentável por atender a determinados parâmetros de sustentabilidade, possa receber condições mais favoráveis. Por outro lado, aqueles empreendimentos que se enquadrarem em certas situações descritas na resolução, receberão uma sinalização de operação com risco socioambiental ou, então, quando descumprirem requisitos legais, não serão elegíveis ao recebimento de crédito rural.

As operações que poderão ser classificadas como sustentáveis estão elencadas no anexo da resolução e fazem parte, por exemplo, do Programa para Redução da Emissão de Gases de Efeito Estufa na Agricultura (Programa ABC) e do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), incluindo recuperação de pastagens, integração lavoura-pecuária-floresta, agroecologia, recuperação de solos, entre outras. 

Os empreendimentos inelegíveis ao crédito rural, são aqueles cuja área: a) não esteja inscrita no CAR (Cadastro Ambiental Rural); b) esteja inserida em unidades de conservação ou em terra indígena; c) tenha titular inscrito no cadastro de empregadores que mantiveram trabalhadores em condições análogas a de escravo; d) esteja inserida em áreas embargadas por desmatamento ilegal no Bioma Amazonia; e) tenha beneficiário que já possua restrições pela prática de desmatamento ilegal.

Quanto aos empreendimentos que receberão a sinalização de operação com risco socioambiental, estes são destalhados no artigo 3º da proposta. De acordo com o texto atual, serão sinalizados como risco socioambiental: empreendimentos que estejam inseridos total ou parcialmente em áreas embargadas ou, ainda, em Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal ou de Reserva Particular do Patrimônio Natural, bem como aqueles cujos beneficiários tenham sido autuados por trabalho informal ou infantil nos últimos três anos.  

Essas duas modalidades de classificação devem receber grande atenção durante a fase de comentários e revisão, pois situações ambíguas podem gerar diversos questionamentos e demandas futuras, sendo aconselhável um melhor detalhamento de aspectos como a natureza dos embargos, a ressalva das atividades permitidas pelo Código Florestal ainda que dentro de áreas protegidas etc. 

É certo que o crédito rural tem um grande papel na transformação e no crescimento do setor e pode ser usado como mais uma ferramenta em prol da sustentabilidade.

Natascha Trennepohl é sócia do escritório Trennepohl Advogados e doutoranda na Humboldt-Universität zu Berlin (Alemanha).