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Transportadoras tentam frear distribuidoras enquanto ANP debate regulação de gasodutos

Concessionárias estaduais, por sua vez, veem invasão de competência na discussão

Transportadoras tentam frear distribuidoras enquanto ANP debate regulação de gasodutos

PIPELINE. Transportadoras tentam frear projetos de distribuidoras estaduais, enquanto ANP discute a regulamentação para classificação de gasodutos. Concessionárias veem invasão de competência.

Argentina e Paraguai estudam rota pelo Chaco. Petrobras e Braskem anunciam acordo para expansão de polo petroquímico no Rio com gás do Complexo Boaventura (RJ) e mais. Confira:


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As transportadoras de gás natural tentam pôr um freio em alguns novos projetos de expansão das distribuidoras, enquanto a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) discute a regulamentação para classificação de gasodutos – em consulta pública até 21 de julho.

Em São Paulo, a ATGás pediu à Arsesp (o regulador estadual) que os planos de negócios da Comgás e da Necta sejam reavaliados.

A associação, que representa as transportadoras, questiona, em especial, os projetos de interligação das redes das concessionárias, cujos planos de investimentos passaram recentemente por consulta pública no processo de revisão tarifária das companhias. 

  • A ideia é evitar que os investimentos sejam aprovados e incorporados às tarifas dos consumidores locais antes que o assunto esteja pacificado – e impedir, assim, um novo caso Subida da Serra.

O gasoduto da Comgás, aprovado em 2019 pela Arsesp, foi posteriormente classificado pela ANP como um ativo de transporte e o conflito federativo pela regulação do empreendimento está, hoje, no Supremo Tribunal Federal (STF).

E não é só em São Paulo. Em Alagoas, também, há um conflito posto envolvendo projetos da Algás, a concessionária local, e a Transportadora Associada de Gás (TAG).

As distribuidoras, por sua vez, veem na proposta de regulamentação da ANP um caso de invasão à competência estadual. 

A seguir, a gas week se debruça sobre o assunto.



A ATGás pediu mais detalhes sobre os projetos da Comgás e Necta. Quer entender se as características técnicas de diâmetro e pressão conflitam com os limites propostos pela ANP (veja a minuta de resolução na íntegra, em .pdf).

A Comgás planeja investir em novos gasodutos para interconectar as redes da companhia com as das demais concessionárias de gás do estado (Necta e Naturgy) – um compromisso previsto na renovação da concessão em 2021.

Os projetos inicialmente mapeados são:

  • Porto Ferreira-Araras (interligação com a Necta)
  • Campinas-Salto (interligação com a Naturgy)

São investimentos de R$ 543 milhões que permitirão a troca operacional (swap) do gás, por meio do fluxo físico da molécula e não somente pelo fluxo comercial, entre as diferentes áreas de concessão no estado.

Na prática, permite que o gás importado pela Edge (do mesmo grupo Compass) pelo Terminal de Regaseificação de São Paulo (TRSP) chegue aos consumidores da Necta e Naturgy pela malha da Comgás.

A ATGás teme que os novos investimentos criem duplicidade com as redes da Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG) e Nova Transportadora do Sudeste (NTS) – comprometendo, assim, a eficiência econômica do sistema de transporte, com impactos negativos sobre as tarifas.

A associação alega também que alguns dos projetos consideram indevidamente a plena operação do Subida da Serra, sem que o assunto esteja pacificado na esfera judicial. Ou seja, os investimentos seriam incorporados às tarifas dos consumidores paulistas de forma legalmente duvidosa. A Arsesp ainda analisa as contribuições dos agentes.

“Existem gasodutos de transporte que cortam o estado de São Paulo e alimentam as redes das concessionárias locais. Os sistemas precisam ser complementares, não concorrentes, porque estamos falando de uma indústria de rede que depende de escala”

“E, no fim, todo mundo perde se deixarmos a infraestrutura de gás se desenvolver de forma ineficiente”, argumenta o presidente da ATGás, Rogério Manso.

Em tempo. O conflito federativo em torno do Subida da Serra segue no Supremo, depois das tentativas frustradas de acordo entre ANP, Arsesp e o governo de São Paulo no Núcleo de Solução Consensual de Conflitos no STF. 

Caberá ao ministro relator, Edson Fachin, julgar liminarmente o pedido da Arsesp e do governo de São Paulo para que a operação do gasoduto seja mantida sob regulação estadual até o julgamento final da ação; e que a ANP seja impedida de adotar quaisquer medidas para interditar a operação do ativo.


As distribuidoras, representadas pela Abegás, veem na proposta de regulamentação da ANP um caso de invasão à competência estadual – alegam, nesse sentido, que não existe hierarquia da regulação federal em relação à estadual, pela própria definição constitucional.

Segundo a associação, a discussão aberta pelo regulador federal está contaminando a revisão tarifária das concessionárias e pode paralisar investimentos.

A Abegás entende que o debate ainda está pouco maduro e pede o adiamento, por 30 dias, dos prazos da consulta pública da ANP, devido à complexidade do assunto.

O diretor técnico comercial da Abegás, Marcelo Mendonça, defende um “freio de arrumação” no debate: “Hoje, do jeito que está, a regulamentação da ANP inviabiliza investimentos das distribuidoras”.

  • As distribuidoras alegam que a Análise de Impacto Regulatório (AIR) não se aprofunda no impacto econômico sobre a atividade de distribuição; e questionam a eficiência do sistema.

Nesse ponto, especificamente, a Abegás argumenta que, nos termos do desenho regulatório proposto pela ANP, será preciso ampliar a construção de city-gates (onde ocorre a transferência de custódia do gás para as distribuidoras) – o que tende a encarecer a expansão da infraestrutura. Cada ponto de entrega custa cerca de R$ 50 milhões.

Além disso, corre-se o risco de que sejam propagadas malhas de transporte desconectadas entre si, no interior dos estados.

A Abegás pontua, ainda, que o segmento de transporte opera com ritos mais complexos de aprovação e prazos para implantação de projetos.

Uma das diretrizes da minuta da ANP, para classificação de gasodutos, é o conceito da eficiência global das redes, mas falta, na visão de diferentes agentes, justamente, um aprofundamento sobre o conceito na minuta.

  • As críticas à minuta proposta pela agência estão detalhadas no artigo de opinião “Proposta da ANP para regulação de gasodutos representa ameaça de conflito federativo”, escrito pelo sócio-diretor da Zenergas Consultoria, Zevi Kann.

Em Alagoas, a TAG questiona um projeto da Algás em Pilar: um gasoduto em aço carbono de 1,5 quilômetro de extensão que, segundo a concessionária estadual, está associado à realocação do ponto de entrega Marechal Deodoro das instalações da Origem Energia para a rede da transportadora.

TAG alega que o ramal já está contemplado nas obras de instalação do novo Ponto de Saída Marechal Deodoro II e que há duplicidade nos projetos. 

A transportadora defende que o seu projeto valoriza a conexão da rede da Algás à malha de transporte e que permitirá maior precisão na medição dos fluxos destinados à futura instalação de estocagem subterrânea de gás natural de Pilar (uma parceria entre TAG e Origem).

A Algás justifica, em seu plano de investimentos, que o seu novo ramal é necessário para a a expansão planejada da rede local e visa manter a estabilidade operacional do sistema.

A Arsal, o regulador estadual, não acatou os questionamentos da TAG, na aprovação do projeto, mas recomendou na ocasião a articulação com a ANP para aprofundamento da análise. 

  • Procurada, a TAG esclareceu, em nota, que suas contribuições são “pautadas na defesa do benefício coletivo dos usuários da cadeia de gás” e que o planejamento integrado das redes é o “caminho necessário” para o dinamismo de mercado e aumento da competitividade do gás.
  • A Algás, por sua vez, destacou, em nota, que o “planejamento integrado entre os entes federativos constitui instrumento essencial para o desenvolvimento infraestrutura de transporte e distribuição de gás natural no país de forma eficiente”.
  • E que ele deve respeitar a competência e independência dos entes federativos. Caso contrário, poderá resultar em “custos com judicialização e redução de investimentos, comprometendo, assim, o próprio desenvolvimento da infraestrutura do país”. 

A TAG também chegou a formalizar em março, na ANP, questionamentos sobre a operação de um gasoduto da PetroReconcavo na Bahia, que interliga a UTG São Roque diretamente à rede da Bahiagás.

O assunto, porém, esfriou. O gasoduto, aliás, não se enquadraria como de transporte, com base nos próprios limites técnicos de diâmetro e pressão recém-propostos pela ANP. 

Em 2024, a área técnica da agência indicou que o gasoduto se tratava de um ativo integrante da instalação produtora e sujeito ao acesso negociado e não discriminatório de terceiros – posição chancelada pela Procuradoria Federal junto à ANP.

A TAG, por sua vez, alegou que, pelas características técnicas e sua finalidade, trata-se de um caso de “indevido bypass” ao sistema de transporte, e pediu, na ocasião, que a ANP se abstivesse de autorizar a construção do gasoduto “até que esgotados todos os debates técnicos, jurídicos e econômicos necessários”.

O ativo, porém, já está operacional desde o ano passado. Como o gasoduto se encontra integralmente dentro da concessão de Mata de São João, a petroleira entende que ele se caracteriza como de seu interesse específico.

Na ocasião do questionamento, a TAG citou que o pedido de acesso às informações do processo tinha como objetivo esclarecer a interpretação do regulador quanto à classificação de dutos e que não se tratava, portanto, de uma questão específica – e, sim, visa evitar uma interpretação que gere um precedente com efeitos danosos aos usuários do mercado”.


Integração regional. Governos do Paraguai e Argentina assinaram um memorando de entendimento para avaliar a viabilidade de um gasoduto pelo Chaco paraguaio, ligando as reservas de Vaca Muerta ao mercado brasileiro.

  • A produção de gás argentino, aliás, deve atingir um pico de 180 milhões de m³/dia na próxima década, quando o país vai substituir a Bolívia como o principal supridor regional, estima a Wood Mackenzie. 
  • Esse volume pode chegar a 270 milhões de milhões de m³/dia se a Argentina conseguir se estabelecer como um supridor confiável de GNL. Nesse cenário, o país precisará de US$ 10 bilhões para financiar a expansão da infraestrutura. 

Petroquímica. Petrobras anunciou acordo com a Braskem para fornecer o gás natural processado no Complexo Boaventura (RJ) como matéria-prima para ampliar a produção de polietileno nas unidades de Duque de Caxias, Três Rios e Resende, no Rio de Janeiro. O projeto prevê R$ 4,3 bilhões em investimentos. 

Preço do gás. A presidente da Petrobras, Magda Chambriard, disse que a companhia está “trabalhando com afinco” para trazer mais gás ao mercado e entregar preços mais competitivos, mas que esse não é um processo imediato.

Revisão tarifária. As tarifas dos gasodutos estão defasadas, por atrasos de anos na revisão tarifária das transportadoras, e precisam ser corrigidas para incentivar a continuidade da agenda de competitividade do gás no Brasil, defendeu o diretor de Relações Externas da Eneva, Aurélio Amaral, em entrevista ao estúdio eixos, na Macaé Energy 2025.

Térmica no Amazonas. Super Terminais planeja construir uma usina a gás dedicada às operações portuárias. O projeto, de R$ 30 milhões, vai alimentar diretamente os três guindastes no porto. A Cigás vai instalar 3,5 km de rede e fornecerá até 12 mil m3/dia.

Opinião: A maior parte das concessões de gás canalizado têm flertado com os ciclos viciosos ao receberem o aval para praticar margens de distribuição cada vez maiores a cada revisão tarifária, escreve Letycia Pedroza, da Abrace Energia.

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