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Indústria nascente de CCS espera regulação simplificada

Regulação para CCS deve diferenciar carbono de hidrocarbonetos, defende indústria

Vista de projeto Illinois Industrial Carbon Capture and Storage (ICCS) armazena de forma segura e permanente mais de 1 milhão de toneladas de CO2 por ano (Foto: Scott Smith/Cortesia/Archer Daniel Midland)
Projeto Illinois Industrial Carbon Capture and Storage (ICCS) armazena de forma permanente mais de 1 milhão de toneladas de CO2 por ano nos EUA (Foto: Scott Smith/Cortesia/Archer Daniel Midland)

NESTA EDIÇÃO. CCS Brasil e empresas do setor defendem regulação específica para captura e armazenamento de carbono, diferenciando CO2 de hidrocarbonetos e sem exigências excessivas para, assim, conter custos.

Regras para os futuros carbonodutos também vão desenhar mercado de serviço e a infraestrutura para movimentar o carbono capturado.


EDIÇÃO APRESENTADA POR

A nascente indústria brasileira de captura e armazenamento de carbono (CCS, em inglês) defende uma regulamentação que trate o carbono de maneira distinta de outros gases – e que não se confunda com hidrocarbonetos. 
 
O argumento é de que as atividades de CCS e de exploração produção de óleo e gás, embora associadas, não são equiparáveis em termos de riscos ambientais e de propósito, logo, um tratamento similar, com muitas exigências, pode ameaçar a viabilidade dos projetos.
 
“CO2 não é hidrocarboneto”, pontua Isabela Morbach, presidente da associação CCS Brasil. “Não é tóxico. Não é volátil. A interação dele com o meio ambiente e os impactos dessa interação são muito diferentes. No fim do dia, o maior risco é o de ter emissões, que seriam evitadas”. 
 
Segundo Morbachhá um debate se o carbono seria tratado como um resíduo ou uma commodity, o que também contribui para este tratamento diferenciado diante do petróleo e gás. 
 
Atualmente, está sob a responsabilidade da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) regular as atividades de captura de carbono para fins de armazenamento, seu transporte por meio de dutos e sua estocagem geológica, conforme a lei do Combustível do Futuro
 
Mesmo antes, a agência deu autorizações especiais para os primeiros projetos: usou um regramento de perfurações de fomento de dados de óleo e gás para a FS, do setor de etanol.  
 
A empresa está otimista com seu projeto na Bacia dos Parecis, onde espera capturar o carbono emitido da sua produção de etanol de milho e armazená-lo em um reservatório salino. O grupo também defende a diferenciação.
 
“O CO2 não é um hidrocarboneto. Devemos tratá-lo de maneira distinta e não semelhante”, reforça o vice-presidente de operações da empresa, Everson Medeiros, em entrevista à agência eixos.
 
Segundo ele, o projeto vem sendo discutido em parceria com órgãos ambientais estaduais, como a Secretaria de Meio Ambiente do Mato Grosso e com a ANP.



Morbach cita o exemplo da regulação dos EUA, em que há exigência de dois poços (um de injeção e outro de monitoramento) para armazenamento de CO2, para verificar a integridade do poço principal, possíveis vazamentos, qualidade da água subterrânea e movimentação do CO2. “Isso torna o projeto muito caro”, diz Morbach. 
 
Aliás, por lá, o governo de Donald Trump anunciou o encerramento de 24 projetos de energia limpa, incluindo iniciativas de captura e armazenamento de carbono (CCS). Envolviam mais de US$ 3,7 bilhões em subsídios públicos e acabaram tratados como dinheiro sendo jogado fora
 
Outro ponto que traz incertezas aos investimentos é a falta de definição sobre a transferência de responsabilidade dos poços nas operações de CCS, isto é, a possibilidade de o operador do projeto de CCS transferir a gestão do reservatório com CO2 armazenado para uma entidade governamental.
 
Chegou a ser discutido no Congresso Nacional, mas não prosperou. Contou para isso, inclusive, a questão fiscal, dado o custo de se criar uma estrutura pública para gerir o CO2 confinado, com o papel de minimizar os riscos de vazamentos. 
 
“O ideal seria que a transferência de responsabilidade de longo prazo fosse prevista em lei”, defende Morbach. Ainda assim, ela acredita que as decisões finais de investimentos em atividades de CCS vão correr, uma vez que são projetos de longo prazo — até o encerramento das atividades de injeção.
 
Esse ponto também é ressaltado por um estudo recente da consultoria DNV, que lembra que “o CO2 será armazenado no subsolo por tempo indefinido, criando várias responsabilidades, como possíveis vazamentos ou impactos ambientais”. 
 
Segundo a consultoria, é crucial que a regulamentação defina claramente o período de transferência dessas responsabilidades para o governo, após o encerramento dos projetos.

Outro aspecto sensível é o transporte de CO2. A DNV acrescenta que o transporte, seja por duto, navio, trem ou caminhão, exige normas técnicas próprias. 
 
“O CO2 pode ser transportado em fase densa ou gasosa, cada uma com exigências operacionais distintas. A escolha do método deve considerar distância, volume e viabilidade econômica”. 
 
O estudo aponta que o transporte por duto é geralmente o mais custo-efetivo, com valores entre US$ 6 e US$ 28 por tonelada, enquanto modais como trem e caminhão são mais caros por dependerem de OPEX elevado.
 
Morbach concorda: “A inviabilidade do caminhão está relacionada à pegada de carbono. Um caminhão tem um OPEX muito alto”. 
 
Ainda assim, ela vê papel para o modal rodoviário em projetos menores ou com distância curta, em “CO2dutos virtuais”, a exemplo do que já ocorre com o GNL.
 
No radar. A Eneva analisa a instalação de gasodutos capazes de transportar o carbono capturado das usinas de etanol até o poço onde será injetado na Bacia do Paraná, oriundo de uma ou múltiplas usinas, considerando a criação de potenciais hubs de captura de CO2 na região. 
 
Já a FS avalia o transporte de CO2 via dutos da sua usina de etanol de milho em Sorriso até o futuro reservatório de carbono em Lucas do Rio Verde, ambas no Mato Grosso.
 
A lei prevê que compete à ANP regular o transporte por meio de dutos, o que à época contrariou, inclusive, a Petrobras, justamente pelo receio de o mercado ser acabar regulado da mesma forma que o transporte de gás natural.
 
“Existe uma preocupação muito grande sobre o uso compartilhado de dutos. Essa é a razão mais importante para isso ter sido alocado como algo a ser regulado”, explica a presidente da CCS Brasil.
 
“Existe a possibilidade de as transportadoras de gás hoje quererem ser transportadoras de CO2. Mas basta ter mercado. Elas sabem fazer isso muito bem. Não é o mesmo duto, mas pode usar a mesma servidão de passagem”.


R$ 1,3 bilhão para a indústria verde. O Brasil poderá acessar US$ 250 milhões do Fundo de Investimentos Climático (CIF) para financiar tecnologias limpas e de economia circular, como hidrogênio e materiais de baixo carbono. No total, 26 países enviaram propostas ao Fundo para a participação no programa. O Brasil recebeu a nota mais alta.
 
Etanol mais competitivo. O etanol foi avaliado mais competitivo em relação à gasolina em seis estados na semana de 8 a 14 de junho. Na média das pesquisas postadas no país, o etanol tinha paridade de 67,68% ante a gasolina no período, portanto favorável em comparação com o derivado do petróleo, conforme levantamento da ANP elaborado pela AE-Taxas.
 
Impasse superado. O deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania/SP) disse que avanços na fiscalização e combate à adulteração de combustíveis, abre caminho para a adoção do B15 (mistura de 15% de biodiesel ao diesel fóssil).
 
Na pauta do CNPE. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, convocou a próxima reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) com apenas dois itens na pauta: as misturas obrigatórias de biodiesel no diesel e de etanol anidro na gasolina.
 
P&D para hidrogênio. A Neoenergia iniciou a construção de uma usina de hidrogênio verde em Taguatinga, no Distrito Federal. Investimento de R$ 30 milhões, como parte do programa P&DI da Aneel. A planta será alimentada por energia solar.

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