diálogos da transição

Presidência da COP30 divulga segunda carta: sem menção a combustíveis fósseis

Sem se posicionar sobre combustíveis fósseis, presidência da COP30 chama sociedade para contribuir com "inspirações" no combate à crise climática

Ana Toni e André Corrêa do Lago (Foto: Rafa Neddermeyer/ COP30 Amazônia/PR)
Ana Toni e André Corrêa do Lago (Foto: Rafa Neddermeyer/ COP30 Amazônia/PR)

NESTA EDIÇÃO. Brasil evita abordar combustíveis fósseis enquanto presidente da COP30, mas a posição é clara em outros fóruns.

Nesta quinta, presidência da cúpula climática divulgou segunda carta oficial e anunciou uma plataforma para receber “inspirações” da sociedade civil.


EDIÇÃO APRESENTADA POR

A presidência brasileira da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30) divulgou nesta quinta (8/5) sua segunda carta oficial, propondo novo modelo de governança a partir de “círculos de liderança”, mas frustrou organizações ambientais ao desviar dos combustíveis fósseis.
 
A jornalistas, o presidente designado da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, disse que o tema deve vir na próxima carta, que tratará da agenda de ação.
 
Esses documentos são importantes porque buscam dar o tom e mobilizar as delegações em torno de temas que a presidência vai sinalizando como prioritários.
 
No caso, o Brasil é enfático sobre a necessidade de mobilizar recursos, reforçar o multilateralismo em tempos de crise e conectar a discussão climática à vida das pessoas – este último em resposta à crescente onda de desinformação e negacionismo.
 
Até aqui, o silêncio sobre combustíveis fósseis tem deixado espaço para interpretações.
 
“Essa omissão preocupa. A Petrobras, sem plano de transição pós-petróleo, mira a Amazônia como nova fronteira de exploração. Ignorar esse tema compromete a coerência da narrativa de liderança climática que o país deseja construir”, aponta o Climainfo.
 
“Não podemos pisar em ovos em relação às decisões difíceis. É a segunda carta da presidência da COP30 e, embora estruturas importantes sejam anunciadas, ainda não temos detalhes sobre como a ação climática será implementada”, comenta Ilan Zugman, diretor regional da 350.org para a América Latina e Caribe.
 
Marcada para novembro de 2025, em Belém (PA), a COP30 será o momento de os mais de 190 países signatários do Acordo de Paris apresentarem suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) atualizadas até 2035.
 
Até o final de abril, apenas 10% dessas nações haviam entregado seus compromissos. 
 
Entre os maiores emissores, a China ainda não entregou, mas prometeu um plano abrangendo pela primeira vez todos os setores econômicos e gases de efeito estufa. Os EUA apresentaram a NDC antes de Trump assumir a presidência e retirar o país do acordo, pela segunda vez.
 
O Brasil, sexto maior emissor, apresentou a sua na COP29, em novembro de 2024, no Azerbaijão, mas ainda não detalhou como pretende cumpri-la. Ou qual será o espaço para petróleo, gás e carvão.



Em outros fóruns, no entanto, o governo brasileiro tem sido mais vocal sobre o assunto. 

Durante a presidência rotativa do G20 em 2024, o Brasil defendeu, no grupo de trabalho de transições energéticas, que ainda serão precisos investimentos em novos projetos de exploração de óleo e gás, sobretudo em economias emergentes. A visão compartilhada entre os outros membros do fórum resultou em uma declaração final repetitiva sobre o tema.

O consenso foi por eliminar subsídios ineficientes aos combustíveis fósseis. Também aberto a interpretações.

Agora, como presidente do Brics – bloco de emergentes dependentes de petróleo e carvão –, o governo brasileiro tem repetido a tese de que é preciso atacar a demanda, não a produção. E que o Brasil tem condições de se manter relevante no mercado de O&G com um petróleo que emite menos.

Em meio a este jogo de interesses – afinal, acabar com petróleo, gás e carvão não é fácil nem barato –, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), tem pressionado por um mapa do caminho para cumprir o combinado em 2023, na COP28, quando se chegou ao acordo inédito para uma transição para longe dos fósseis.
 
Esta semana, durante um evento em Brasília, Marina disse que para “liderar pelo exemplo” a COP30, o Brasil precisa enfrentar suas contradições e se comprometer com a transição energética. Especialmente na definição de políticas públicas.
 
Enquanto isso não entra nos documentos oficiais, a bola fica com a sociedade civil. Também nesta quinta, o embaixador André Corrêa do Lago anunciou o lançamento de uma plataforma para receber contribuições sobre o alcance das metas climáticas. 
 
A iniciativa será lançada na Semana do Clima da UNFCCC (sigla em inglês para Secretariado da ONU sobre Mudança do Clima), marcada para 19 a 23 de maio na Cidade do Panamá. 
 
Segundo a diretora-executiva da COP30, Ana Toni, a ideia é que as contribuições sirvam de inspiração. “É mostrar que a transição já está acontecendo e sendo liderada pela sociedade tanto para mitigação quanto para adaptação”, disse a jornalistas.
 
“No nível de mobilização, nós queremos complexidade, incoerências e várias coisas que refletem a realidade. Se as sociedades querem mais, têm que provar também que são capazes de fazer muito mais e, portanto, podem, cobrar muito mais do que o governo”, completou.


Papa climático. O cardeal norte-americano Robert Francis Prevost, de 69 anos, foi apresentado no início da tarde desta quinta (8/5) como o 267º papa da Igreja Católica. Ele escolheu o nome de Leão XIV. Sucesso do papa Francisco, o novo pontífice é o primeiro papa agostiniano. Também é conhecido por defender ações urgentes em relação à mudança climática, enfatizando o impacto desproporcional sobre as comunidades mais pobres e vulneráveis.
 
Russos de olho no urânio e no lítio. A estatal russa Tenex, subsidiária da Rosatom, manifestou interesse em ampliar sua atuação no Brasil, com foco na exploração de urânio e lítio — dois minerais estratégicos para a transição energética. A declaração ocorreu nesta quinta (8/5), durante reunião com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), que cumpre agenda oficial acompanhando a comitiva do presidente Lula (PT).
 
Foco em petróleo e gás. Durante encontro com o presidente da China, Xi Jinping, em Moscou, nesta quinta (8/5), o presidente da Rússia, Vladimir Putin, anunciou que os dois países trabalham na implementação de 86 projetos conjuntos avaliados em mais de US$ 200 bilhões. A área energética continua sendo o carro-chefe da relação.
 
Mais tempo para montadoras europeias. O Parlamento Europeu aprovou nesta quinta (8/5) a flexibilização das metas de emissões de CO2 para carros e vans novos que deveriam começar a valer este ano. Com a alteração, os fabricantes poderão cumprir suas obrigações para os anos de 2025, 2026 e 2027, calculando a média de desempenho ao longo do período de três anos.
 
Gás para Todos. O mercado de gás liquefeito de petróleo (GLP) entrou em rota de colisão diante do que pode vir a ser um capítulo à parte da criação do Gás para Todos, programa social gestado no governo Lula para substituir gradativamente o novo vale-gás. O Planalto pretende editar uma MP para colocar o projeto de pé este ano, inicialmente pensado para atender 20 milhões de famílias.
 
210 GW. O Brasil ultrapassou em abril a marca de 210 gigawatts (GW) em potência fiscalizada de energia elétrica, com mais de 24 mil usinas em operação comercial. De acordo com dados da Aneel, mais da metade da geração de energia elétrica no país vem de hidrelétricas, incluindo PCHs, que oferecem ao sistema 51,97% da energia, com 109,96 GW.
 
Importação de resíduos. O governo federal publicou novo decreto sobre as possibilidades de importação de resíduos sólidos pela indústria, com limites para alguns materiais estabelecidos por cotas. Ele revoga o anterior, publicado em 17 de abril. A mudança atende pleitos de catadores de materiais recicláveis, que temiam ameaça às cadeias de reciclagem existentes no país e danos à economia circular.

Newsletter diálogos da transição

Inscreva-se e fique por dentro de tudo sobre Transição Energética