PIPELINE. Na esteira da aceleração do mercado livre, venda de gás spot ganha tração no Brasil, tanto entre clientes livres quanto distribuidoras. Wood Mackenzie estima que 3,5 milhões de m3/dia podem migrar para transações de curto prazo no mercado cativo este ano.
GBS Storage vê momento favorável para projetos de armazenamento de gás. Comgás abre chamada pública para aquisição de molécula. MSGás mira importação da Bolívia e Argentina e mais. Confira:
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Pari passu aos recordes de migração de clientes livres, a modalidade de contratação de gás spot vem ganhando espaço no mercado brasileiro.
A Wood Mackenzie prevê que 2025 será o ano em que os contratos spot desafiarão os volumes firmes: até 3,5 milhões de m3/dia contratados pelas distribuidoras podem migrar este ano para o mercado de curto prazo.
Em relatório divulgado esta semana, a consultoria destaca que o movimento tem um componente de competitividade, já que os preços no spot têm se mostrado atrativos – de US$ 5,9 a US$ 10,5 o milhão de BTU.
A procura crescente por contratos de curto prazo não se restringe às concessionárias de gás canalizado.
Indústrias que migraram para o mercado livre e que têm perfis de consumo mais flexíveis têm no gás spot uma oportunidade de complementar volumes – e, eventualmente, arbitrar.
E, num ciclo que se retroalimenta, o desenvolvimento do mercado livre tem exigido das distribuidoras soluções mais flexíveis na contratação de molécula – em especial para gerir a complexidade de gestão das flutuações de demanda dos consumidores parcialmente livres.
Mudança no perfil
Javier Toro, gerente sênior de Pesquisa da divisão de Gás e Energia do Cone Sul da Wood Mackenzie, destaca que a compra de molécula no mercado spot deixou de ser apenas um movimento oportunista das distribuidoras para se tornar parte do dia a dia da gestão de portfólio delas.
“É uma alternativa viável para as operações diárias, com ganhos táticos evoluindo para decisões estratégicas”, citou o analista.
De acordo com a Wood Mackenzie, as distribuidoras movimentaram, no mercado spot em 2024, cerca de 40 milhões de m3 – a maior parte a preços mais competitivos que os contratos firmes.
Se o mercado brasileiro ainda é concentrado na figura de um agente dominante (a Petrobras, com cerca de 70% dos volumes) e ainda carece de liquidez, fato é que a abertura do setor tem evoluído nos últimos anos: são mais comercializadores, com mais modalidades de contratos.
Não à toa, o mercado spot se desenvolveu mais, até aqui, no Nordeste – onde há uma diversidade maior na oferta.
Segundo a Wood Mackenzie, quatro distribuidoras – Copergás (PE), Cegás (CE), Bahiagás (BA) e SCGás (SC)— responderam por mais de 95% dos volumes contratados no spot em 2024. Três delas estão no Nordeste.
Isso tende a mudar a partir deste ano, com a interconexão entre as redes da Transportadora Associada de Gás (TAG) e da Nova Transportadora do Sudeste (NTS) – que derrubou a principal barreira para o pleno funcionamento da malha integrada nacional e traz perspectivas de uma nova geografia da abertura do mercado, com a chegada do gás nordestino ao Sudeste.
Risco Petrobras
Toro cita que o prêmio de incentivo à demanda, implementado a partir deste ano pela Petrobras, traz uma nova dinâmica para a concorrência com o gás de oportunidade.
A diferença de preço dos contratos firmes da estatal em relação ao mercado spot está diminuindo.
Mesmo assim, acredita o analista, os preços do gás de curto prazo se mantêm atrativos o suficiente para desafiar o status quo – especialmente no contexto da volatilidade global do Brent e da crescente pressão competitiva de novos fornecedores.
“A Petrobras tem feito um movimento para segurar market share, mas, ao mesmo tempo, vemos que os supridores privados têm volumes para colocar no mercado spot. O que aconteceu é que a Petrobras colocou um teto no mercado spot, ao oferecer um preço de 10% do Brent para os volume que ultrapassa o take or pay, mas ainda há margem para esses agentes concorrerem”, avalia.
Toro cita que a oferta de gás spot desponta como uma oportunidade dos comercializadores privados desafiarem a Petrobras.
“Os concorrentes estão cada vez mais recorrendo ao mercado spot como um novo modelo comercial, oferecendo incentivos de preços e trazendo nova liquidez ao setor”, disse.
Com essa nova dinâmica concorrencial, a Petrobras perdeu participação de mercado em 2024: ainda que não o suficiente para mudar estruturalmente o setor e ameaçar sua posição de agente dominante, a estatal perdeu rentabilidade no negócio de gás e energia e decidiu se reposicionar.
Relembre: em resposta à concorrência, lançou uma nova política comercial – o prêmio de incentivo à demanda – e passou a oferecer descontos no preço do gás para volumes acima do compromisso mínimo (take-or-pay), justamente o volume mais sensível a arbitragens do gás spot.
Toro explica que as distribuidoras se valem da flexibilidade do take-or-pay para garantir preços mais baixos no mercado de curto prazo – ou seja, retiram o volume mínimo contratado e complementam a demanda com o gás spot, quando o preço está mais atrativo.
Quem é quem
Levantamento da agência eixos, com base em dados públicos da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), mostra que o número de contratos de curto prazo bateu recorde em 2024 e começa 2025 em ritmo acelerado.
Se mantido o ritmo dos últimos meses, teremos um novo recorde na oferta de gás spot em 2025, tanto nos ambientes livre quanto cativo.
Desde o marco da abertura do mercado brasileiro para os fornecedores privados, em 2022, o total de contratos assinados pelas distribuidoras no mercado de curto prazo subiu de 25 naquele ano para 27 em 2023 e 67 no ano passado. Só no 1º bimestre de 2025, já são 17, numa curva ascendente.
Já entre as indústrias, no mercado livre, foram 18 acordos assinados em 2022; 20 em 2023; 44 em 2024; e 17 entre janeiro e fevereiro deste ano.
Pela classificação da ANP, são considerados contratos de curto prazo aqueles com prazos inferiores a um ano. Na prática, porém, na maioria dos casos, tratam- se de ofertas spot, com prazos reduzidos (alguns dias a semanas).
Do lado de quem vende, entre os comercializadores mais ativos na oferta de produtos de curto prazo, em número de contratos assinados desde o ano passado, estão a Brava Energia, Shell, Galp e PetroReconcavo.
Já na ponta de quem compra, o destaque, em número de acordos celebrados, vai para a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), a Refinaria de Mataripe e a Yara Fertilizantes, entre os clientes livres.
E Cegás (CE), SCGás (SC) e Bahiagás (BA) entre as distribuidoras.
A concessionária cearense, aliás, é um case no mercado brasileiro. A companhia contrata volumes firmes abaixo de sua demanda e adota a exposição ao mercado spot como estratégia de gestão de portfólio de suprimento de molécula.
Com uma carteira exposta ao mercado de curto prazo, a concessionária é, aliás, uma das pioneiras, entre as distribuidoras, nas operações de revenda de gás para terceiros.
Um movimento crescente e que está evoluindo, no caso da Bahia, para uma nova dinâmica de mercado, com a decisão da Bahiagás de lançar uma plataforma de comercialização de gás natural spot, voltada para clientes industriais de grande porte.
O projeto (inovador) é uma espécie de marketplace que permitirá à distribuidora ofertar sobras de gás aos seus usuários.
GÁS NA SEMANA
Estocagem. O momento da indústria de gás e energia no Brasil é favorável ao desenvolvimento do negócio de armazenamento subterrâneo, defende o CEO da GBS Storage, Celso Silva. Empresa assinou contrato com a GeoPark para aquisição de uma participação adicional de 10% no campo de Manati, de olho no potencial de conversão do ativo num projeto de estocagem.
Distribuição. Comgás abriu a chamada pública anual para contratação de gás natural. A companhia, maior compradora de gás do mercado brasileiro, mira modelos firmes a flexíveis.
– Já a MSGás (MS) recebeu autorização da ANP para importar gás natural da Bolívia e da Argentina. Ao todo, a concessionária está autorizada a importar 150 mil m³/dia dos países vizinhos.
Termo Norte. Ibama marcou para 17 de junho a audiência pública sobre o projeto de instalação da UTE Brasília.
Biometano. O gás renovável pode ser para o Brasil o que o hidrogênio verde é para a Europa, uma molécula-chave na transição energética, com a vantagem de aproveitar a infraestrutura de gás já existente, avalia o CEO da Fluxys Brasil, Sébastien Lahouste, em entrevista à agência eixos.