RIO — As metas climáticas dos países fundadores do Brics — Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — estão abaixo do necessário para limitar o aquecimento global a 1,5°C, conforme estabelecido pelo Acordo de Paris, indica levantamento feito pelo BRICS Policy Center, com apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS).
A análise das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) dos membros do bloco antes da sua expansão, em 2024, aponta que, apesar de avanços pontuais, as políticas climáticas desses países ainda são insuficientes para enfrentar a emergência climática global.
O estudo foi divulgado no momento em que o Brasil se prepara para sediar a COP30, em novembro. A expectativa do governo brasileiro é que a Cúpula dos Brics, que também ocorrerá no país, em julho, possa ser capaz de pressionar as nações por metas mais ambiciosas.
“O Bics tem a força política necessária para mobilizar resultados ambiciosos para a COP30, garantindo que o crescimento econômico caminhe lado a lado com a justiça social e ambiental”, disse o presidente Lula, na abertura da primeira reunião de Sherpas do fórum.
Apenas 17 dos 198 signatários do Acordo de Paris apresentaram novas NDCs até o prazo de fevereiro de 2024, incluindo o Brasil e os Emirados Árabes Unidos, que integram o Brics. Estados Unidos, Uruguai, Suíça, Reino Unido, Nova Zelândia, Andorra, Equador e Santa Lúcia completam a lista.
O baixo engajamento global forçou a extensão do prazo até setembro, reduzindo o tempo para negociações antes da COP30.
China: maior emissor, metas “altamente insuficientes”
A China, maior emissor global de gases de efeito estufa, atualizou sua NDC em 2021, comprometendo-se a atingir o pico de emissões antes de 2030 e a neutralidade de carbono até 2060.
O país também estabeleceu metas como aumentar a participação de energias renováveis e elevar o estoque florestal.
No entanto, análise do Climate Action Tracker (CAT) classifica as metas chinesas como “altamente insuficientes”.
“As políticas e os compromissos climáticos chineses não são consistentes com o limite de temperatura de 1,5°C do Acordo de Paris”, afirma o estudo.
Contudo, o documento ressalta que seis anos antes do previsto, a China cumpriu duas metas da sua NDC. A marca de 1.200 GW de capacidade total instalada de energia eólica e solar em julho de 2024, e a meta de estoque florestal.
“Segundo dados divulgados no relatório submetido a UNFCC em 2024, o estoque florestal do país aumentou em mais de 6,49 bilhões de metros cúbicos”, pontua o levantamento.
Apesar de cumprir algumas metas antecipadamente, como a capacidade instalada de energia eólica e solar, as emissões do país devem se estabilizar em níveis elevados nesta década, sem reduções significativas.
Compromissos tímidos da Índia
A Índia, por sua vez, atualizou sua NDC em 2022, prometendo reduzir a intensidade das emissões do PIB em 45% até 2030 e aumentar a participação de energias renováveis. No entanto, o CAT classifica essas metas como “altamente insuficientes”.
“À medida que a COP30 se aproxima, a Índia está envolvida em discussões para atualizar sua NDC. Este período que antecede a COP30 incluirá debates e consultas nacionais sobre como cumprir essas metas aprimoradas, apoiados por oficinas globais e regionais”, diz o estudo.
A expectativa, na avaliação do Brics Policy, é que a Índia baseie suas futuras NDCs na expansão das energias renováveis e na redução das emissões no setor energético. O estudo também chama a atenção para o maior engajamento do primeiro-ministro indiano, Narenda Modi, na agenda global.
“Modi tem procurado ser visto como um líder climático global. Este papel inclusive foi reforçado na COP28, com Modi defendendo a justiça climática e instando as nações desenvolvidas a cumprirem seus compromissos de financiamento climático para apoiar os países em desenvolvimento”.
Rússia “criticamente insuficiente”
A Rússia, que ratificou o Acordo de Paris apenas em 2019, tem uma NDC considerada pouco ambiciosa. O Climate Action Tracker (CAT) classifica as ações da Rússia como “criticamente insuficientes”.
O país se comprometeu a reduzir suas emissões em 70% até 2030, com base nos níveis de 1990. No entanto, essa meta é criticada por depender fortemente da capacidade de absorção das florestas, em vez de ações concretas de redução de emissões.
O documento aponta que a meta russa permite que o país alcance a redução com mínimo esforço, já que suas emissões em 2019 já eram 28% menores do que em 1990 devido ao declínio econômico pós-União Soviética.
Além disso, a NDC russa, atualizada em 2020, não detalha planos setoriais para descarbonização. O país também não estabelece metas claras de adaptação, limitando-se a mencionar planos gerais, como a construção de barragens contra inundações e cinturões florestais de proteção.
“A Rússia cita poucas políticas nacionais já em vigor e sua NDC vem sendo criticada por organizações por deixar de fora pontos importantes e por ser pouco ambiciosa”, destaca o estudo.
África do Sul precisa superar carvão
A meta atual da NDC sul-africana é manter as emissões entre 398-510 MtCO2 em 2025 e entre 350-420 MtCO2 em 2030.
“Outra mudança relevante foi a antecipação do ano em que as emissões devem começar a cair: de 2035, na NDC inicial, para 2025 na NDC atualizada”, destaca o estudo.
O país também mencionou pela primeira vez o objetivo de alcançar a neutralidade de carbono até 2050.
No entanto, o CAT classifica suas políticas como “insuficientes”.
“Se todos os países seguissem a abordagem da África do Sul, haveria um aumento de temperatura entre 2°C e 3°C”, cita o estudo.
Apesar de avanços na redução da intensidade de emissões, a África do Sul ainda depende fortemente do carvão, que responde por mais de 70% de sua matriz energética.
Brasil da meta factível
Em novembro de 2024, às vésperas da COP29, o governo brasileiro anunciou que a sua nova contribuição para o cumprimento das metas do Acordo de Paris será reduzir as emissões líquidas de gases de efeito estufa de 59% a 67% em 2035, em relação aos níveis de 2005.
Os números, no entanto, são criticados por ambientalistas, que classificam os limites como insuficientes para alcançar as metas climáticas do tratado.
Segundo os cálculos do governo brasileiro, em termos absolutos a nova meta permitiria ao Brasil limitar as emissões entre 850 milhões e 1,05 bilhão de toneladas de gás carbônico equivalente em 2035, volume que seria suficiente para permitir ao país avançar rumo à neutralidade climática até 2050. Essa é a segunda NDC apresentada pelo Brasil desde a assinatura do Acordo de Paris.
No entanto, o país ainda enfrenta desafios significativos, especialmente no combate ao desmatamento na Amazônia, que responde por uma parcela considerável das emissões nacionais.
O CAT analisa dados de julho de 2024 que mostram uma queda de 30,63% no desmatamento em relação ao período anterior, mas lembra que é necessário reduzir o desmatamento em pelo menos 33% para cumprir as metas de 2025.
Além disso, a NDC brasileira depositada na ONU não detalhou as metas setoriais, como o aumento da participação de energias renováveis para 45% na matriz energética ou a restauração de 12 milhões de hectares de florestas até 2030, presentes na versão original de 2016.
São informações que devem ser divulgadas no Plano Clima, ainda em preparação pelo governo.
O país também não apresentou uma estratégia de longo prazo (LTS) para alcançar a neutralidade de carbono até 2050, o que é visto como uma lacuna importante.