Representantes de mais de cem cidades ao redor do mundo entregaram, neste domingo (17/11), uma carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com a proposta de criação de um fundo garantidor para facilitar a chegada de US$ 800 bilhões anuais em financiamento às cidades, direcionados a projetos de adaptação e mitigação climática.
A iniciativa se daria, em parte, por meio da reforma de instituições financeiras multilaterais — uma das agendas do Brasil no G20 — e pelo redirecionamento de subsídios hoje voltados à indústria de combustíveis fósseis.
“As cidades precisam de um acesso maior, mais rápido e inclusivo ao capital dentro de uma arquitetura financeira global renovada. Reconhecemos os esforços da presidência brasileira na trilha financeira do G20, sobretudo em avançar a necessária reforma dos bancos multilaterais de desenvolvimento”, defendeu Eduardo Paes, prefeito do Rio de Janeiro.
A proposta, que deve ser levada pela presidência do Brasil às discussões do G20 nesta semana, foi feita durante a realização do U20, iniciativa que reúne cidades dos países membros durante a presidência brasileira do G20, no Rio de Janeiro.
O prefeito do Rio destacou a urgência de um novo modelo de financiamento que reconheça o papel crucial das cidades.
“Peço ao G20 que reconheça o papel diferenciado dos governos locais como parte da esfera pública, e que trabalhe efetivamente com cidades de todos os tamanhos, apoiando o papel central que elas têm, inclusive com financiamento direto e dedicado”, disse Paes.
Segundo ele, o momento atual, com crises e conflitos globais, agrava os desafios enfrentados pelas cidades, especialmente aquelas com populações mais vulneráveis.
“Ecoamos a priorização da presidência do G20 em reformar a governança global e pedimos um sistema multilateral renovado que reconheça o papel das cidades como atores políticos cruciais, o nível de governo mais próximo das comunidades”, completou.
Fundo garantidor verde
A proposta apresentada pelos prefeitos inclui a criação do Fundo de Garantia para a Cidade Verde, que permitiria melhores condições para que governos locais obtivessem empréstimos de instituições financeiras, públicas e privadas.
Paes enfatizou que o fundo eliminaria o obstáculo atual, em que municípios precisam da garantia dos governos centrais para obter financiamento, o que acaba impactando as contas nacionais.
“Entregamos a proposta de criação de um fundo garantidor que torna mais fácil a chegada desses recursos aos governos locais. Esses recursos existem, inclusive de fontes privadas. O desafio é garantir que eles cheguem no nível municipal”, explicou.
A proposta permitiria que as cidades tivessem acesso direto ao capital necessário sem comprometer o balanço nacional, ou seja, sem entrar na conta de endividamento.
“Isso flexibiliza muito, porque só vai levar em consideração as contas do município, o meu balanço e não o balanço do governo federal”, destacou Paes, exemplificando com a situação do Rio de Janeiro.
Cidades pedem US$ 800 bilhões por ano
A prefeita de Freetown (Serra Leoa), Yvonne Aki-Sawyerr, reforçou a necessidade urgente de mobilizar recursos substanciais para a ação climática local.
“No nível da cidade, somos muito simples em nosso pedido. Precisamos de US$ 800 bilhões todos os anos, de agora até 2030, para garantir que tenhamos os projetos de mitigação e adaptação necessários para a mudança climática”, afirmou Aki-Sawyerr, que também é co-presidente do C40.
O C40 Cities Climate Leadership Group é um grupo de 96 cidades ao redor do mundo que representa um quarto da economia global.
Aki-Sawyerr defendeu que parte desses recursos seriam advindos dos subsídios que hoje são direcionados para os combustíveis fósseis.
“Sabemos que há alguns lugares óbvios [de onde virão os recursos] como os subsídios que atualmente vão para combustíveis fósseis. Também temos o mecanismo de perdas e danos, que foi anunciado na última COP28, em que os países que são mais responsáveis pelas emissões, que causaram esse desastre, devem financiar as soluções que são necessárias em países como o nosso”, disse.
A prefeita também destacou que a mudança climática não pode ser dissociada de questões como pobreza, desigualdade e gênero.
“As mulheres são as mais afetadas. Ontem houve um acordo histórico com o BID e o C40, onde se comprometem a financiar diretamente as cidades, e isso é uma tendência”, acrescentou.
Apoio para América Latina e Caribe
No sábado, foi anunciada a criação de um programa para facilitar o acesso ao financiamento e aumentar a resiliência das cidades da América Latina e Caribe.
A iniciativa, apoiada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o C40, busca promover um diálogo para intensificar o apoio a projetos de resiliência urbana na região.
Os prefeitos esperam que a liderança do Brasil no G20 e a realização da próxima Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP) em Belém, em 2025, sirvam como catalisadores para que suas demandas ganhem tração no cenário global.