COP29

Ex-secretários das Nações Unidas pedem revisão urgente de negociações climáticas via COPs

“Agora está claro que a COP não é mais adequada ao propósito”, afirma carta aberta

Mulher fala ao celular na COP29 - Around the venue, durante a convenção de Baku, capital do Azerbaijão, em 10/11/2024 (Foto Kamran Guliyev/UNFCCC)
COP29 - Around the venue, em Baku capital do Azerbaijão, em 10 de novembro de 2024 | Foto Kamran Guliyev/UNFCCC)

BRASÍLIA – Carta aberta aos Estados-Membros da ONU e ao Secretário Executivo do Secretariado da UNFCCC, Simon Stiell, publicada nesta sexta (15/11) aponta que o processo de política climática global não é mais adequado e requer uma revisão abrangente para garantir a estabilidade e um futuro habitável para a humanidade.

O documento assinado por ex-secretários das Nações Unidas chega enquanto líderes mundiais se reúnem em Baku, capital do Azerbaijão, justamente para debater políticas para o financiamento climático, durante a COP29.    

Os signatários incluem Sandrine Dixson-Declève, presidente executiva da Earth4All e embaixadora global do Clube de Roma; Johan Rockström, diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa de Ação Climática; Ban Ki-moon, ex-secretário-geral das Nações Unidas; Christiana Figueres, ex-secretária executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas; e Mary Robinson, ex-presidente da Irlanda.

Eles reconhecem avanços de COPs passadas, como o Acordo de Paris e compromissos para acabar com o desmatamento. No entanto, destacam limitações da estrutura atual para promulgar mudanças rápidas e em larga escala.

“Agora está claro que a COP não é mais adequada ao propósito”, afirma a carta. “Precisamos mudar da negociação para a implementação”.  

‘Petróleo, presente de Deus’

A publicação da carta ocorreu após o presidente do país anfitrião da COP29 dizer que petróleo e gás – principais causadores de gases de efeito estufa relacionados a energia – são um “presente de Deus” e notícias de que um funcionário da presidência da COP do Azerbaijão estava usando o evento para promover acordos comerciais de combustíveis fósseis.

“Precisamos de um processo de COP que ofereça entrega, não atraso. Exigimos COPs que sejam plataformas para a ambição do governo e das partes interessadas, não facilitadores de contratos de energia fóssil e crescentes emissões de gases de efeito estufa”, critica Sandrine Dixson-Declève, presidente executiva da Earth4All e embaixadora global do Clube de Roma.

“Após 28 COPs, o tempo acabou para negociações que não fomentam ação e implementação. A estabilidade planetária depende da igualdade, justiça e redução da pobreza para enfrentar o maior desafio existencial do nosso tempo”, completa.

Os signatários alertam que a possibilidade de ultrapassar 2,9°C de aquecimento até 2100 é real, e reverter isso requer políticas sérias e inclusão efetiva dos mais afetados nas decisões.

“Na última COP, os lobistas de combustíveis fósseis superaram em número os representantes de instituições científicas, comunidades indígenas e nações vulneráveis. Não podemos esperar alcançar uma transição justa sem reformas significativas no processo da COP que garantam uma representação justa dos mais afetados”, comenta Christiana Figueres, ex-secretária executiva da UNFCCC.

São propostas sete reformas para que as COPs possam levar ao cumprimento dos compromissos climáticos acordados e à eliminação gradual dos combustíveis fósseis:  

  • Melhorar o processo de seleção para presidências da COP: critérios de elegibilidade rigorosos para excluir países que não apoiam a eliminação/transição da energia fóssil. Os países anfitriões devem demonstrar seu alto nível de ambição para manter as metas do Acordo de Paris.
  • Simplificação para maior velocidade e escala: as reuniões da COP devem ser transformadas em reuniões menores, mais frequentes e voltadas para soluções, para acelerar as ações e permitir ajustes oportunos com base em descobertas científicas emergentes e mudanças nas circunstâncias globais.  
  • Melhorar a implementação e a responsabilização: criar mecanismos para responsabilizar os países por suas metas e compromissos climáticos.  
  • Monitoramento robusto do financiamento climático: com o financiamento climático sendo cada vez mais desembolsado como empréstimos com juros, há uma necessidade de definições padronizadas do que se qualifica como financiamento climático, juntamente com mecanismos de relatórios e rastreamento.  
  • Ampliar a voz da ciência confiável: os signatários compartilham preocupações crescentes de que as COPs climáticas não integram suficientemente as evidências científicas mais recentes e pedem que um órgão consultivo científico permanente seja formalmente integrado à estrutura da COP.  
  • Reconhecer ligações entre pobreza, desigualdade e instabilidade planetária: a carta pede um Enviado de Política Climática-Pobreza para garantir que essas ligações críticas sejam ancoradas nas negociações e ações de implementação.  
  • Aumentar a representação equitativa: com os lobistas dos combustíveis fósseis superando em número os representantes científicos, indígenas e de nações vulneráveis ​​ao clima nas COPs anteriores, há uma necessidade de regras mais fortes de transparência e divulgação, além de diretrizes claras que exijam que as empresas demonstrem alinhamento entre seus compromissos climáticos, modelo de negócios e atividades de lobby.