diálogos da transição

Emergentes superam US$ 100 bi em investimentos renováveis pela primeira vez

Participação de emergentes na atração de recursos para transição energética chegou a 17,5% em 2023, aponta BNEF

NESTA EDIÇÃO. Participação de emergentes na atração de recursos para transição energética chegou a 17,5% no ano passado. Em 2022, o percentual era de 15%.

Mais de 77% das instalações de capacidade elétrica nesses mercado, em 2023, vieram de solar e eólica, mostra o Climatescope.

E ainda: com países produtores de petróleo planejando ampliar exploração, mundo precisa estabelecer uma data – e cumprir – para fim dos fósseis.


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Pela primeira vez, os mercados emergentes, sem a China, superam a marca de US$ 100 bilhões em investimentos combinados, com as renováveis respondendo pela maior parcela das adições de capacidade em 2023, mostra o Climatescope elaborado pela BloombergNEF.

Lançado nesta terça (12/11) em Baku, no Azerbaijão, durante a conferência climática das Nações Unidas (COP29), o estudo aponta que 77% das adições de capacidade elétrica em 110 economias emergentes vieram de solar e eólica no ano passado, com os investimentos em renováveis alcançando US$ 116 bilhões.

O volume representa 17,5% do investimento global em transição, bem abaixo do necessário, mas o crescimento anual mais expressivo da década. 

Esse movimento acompanha o avanço na implementação de políticas de transição energética: 95% dos países pesquisados têm metas de energia limpa.

O capital, no entanto, está concentrado em algumas regiões, deixando as economias de baixa renda para trás na corrida em direção à descarbonização da economia.

“Se compararmos os 15 países que estão no topo com os 15 países que estão no fim do ranking, percebemos que os que estão melhores receberam, nos últimos cinco anos, 423 vezes mais investimento”, comenta Luiza Demoro, chefe global de Transição Energética na BloombergNEF.

Brasil, Índia, Turquia, Vietnã e Taiwan foram os cinco países que mais atraíram investimentos em renováveis na última década, a maior parte destinada a solar e eólica. 

“Não existe correlação mais clara do que isso. Não existe investimento fluindo sem o dever de casa feito para implementar as políticas, para diminuir barreiras, para criar os incentivos financeiros e os mecanismos que são necessários”, completa Demoro.

Ela participou nesta terça (12/11) dos Diálogos da Transição 2024, promovido pela agência eixos, para comentar as expectativas do setor de energia em relação à COP29. (Assista no Youtube)

Um dos pontos-chave da conferência é justamente fechar a conta do que é necessário para que emergentes façam sua transição e como destravar esses recursos.

“Essa questão é um pouco complicada porque começou de uma base que gerou um pouquinho mais de distração do que de efetividade. A meta era US$ 100 bilhões alocados por ano para mercados emergentes, mas US$ 100 bilhões por ano para mercado emergente, para clima como um todo, não move nada”, analisa.

“Hoje, está se buscando metas mais ambiciosas, eu realmente espero que elas sejam atingidas, porque a gente está falando de necessidade de trilhões por ano nas próximas décadas”, completa. 


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Entre os que mais precisam de investimentos, os mercados africanos foram responsáveis ​​por uma grande parte das novas políticas de transição energética implementadas nos últimos anos. Foram 25 mecanismos novos desde 2021. 

Três anos atrás, 74% dos mercados do continente tinham uma meta de energia limpa em vigor; agora, 98% têm. 

“Estamos em um momento que isso precisa ser enfatizado, porque à medida que as conversas avançam com o setor privado falando ‘eu não olho para você porque você não tem política’, isso precisa ser conhecido”, defende a chefe global da BNEF.

Mas é o Brasil que lidera na atração de capital entre os emergentes, excluindo a China, de acordo com a BNEF.

Em 2023, foram US$ 27 bilhões em energia renovável. A Índia, segunda colocada no ranking, recebeu US$ 16 bilhões. A Arábia Saudita, US$ 9 bilhões.

“Estamos muito à frente. Se olharmos para os últimos 10 anos, o Brasil também é o país que mais recebeu investimento em renováveis entre os emergentes, com US$ 115 bilhões em investimento entre 2014 e 2023, também à frente da Índia”, conta Demoro.

Para Elbia Gannoum, presidente da ABEEólica, a COP28, de 2023 em Dubai, já trouxe a meta que o mundo precisava para renováveis: triplicar a capacidade até 2030. Agora é preciso estabelecer uma data para a saída dos combustíveis fósseis.

“Faz mais ou menos dois anos que notamos um relativo retrocesso na velocidade da transição energética global”, alerta. 

Gannoum também participou dos Diálogos da Transição 2024, nesta terça, e observou que a maioria dos países com metas ambiciosas para reduzir o consumo de petróleo recuou nos últimos anos.

“É claro que as geografias têm suas especificidades, mas, de forma geral, o que nós estamos vendo é que o mundo está dizendo que ainda precisa muito do petróleo para atender as necessidades da sociedade. A crise da Europa demonstrou isso”.

Um exemplo é a dificuldade de dar escala a projetos de hidrogênio renovável e tecnologias da captura e armazenamento de carbono.

“São justificativas para os países produtores de petróleo que estão, inclusive, retomando a exploração, perfurando novos poços ou se preparando para fazer isso. O próprio Brasil está fazendo isso também. Então, percebo que o mundo está caminhando para a direção que, em tese, não deveríamos caminhar”, comenta.

Na visão de Gannoum, os países produtores de petróleo precisam se posicionar e estabelecer uma data para a transição de fato.

Enquanto isso não ocorre, a janela fica aberta para que emergentes sigam explorando óleo. Argumento que tem sido usado pelo governo brasileiro para perfurar a Foz do Amazonas, na Margem Equatorial.

Embora concorde que, do ponto de vista climático, é uma estratégia problemática, sob a ótica econômica, a CEO da ABEEólica pontua que o Brasil é um país que tem muitos recursos de petróleo para monetizar.

“Do ponto de vista do clima, é péssimo. Só que todo mundo está fazendo o péssimo. Países nórdicos anunciaram recentemente que vão continuar explorando petróleo. Eles podem não consumir, mas exportam. Então será consumido em algum lugar do planeta e a emissão de CO2 será a mesma. Por que o Brasil [vai ser o] primeiro a dizer que vai parar de extrair petróleo se é um país em desenvolvimento que tem a renda ainda muito baixa, que precisa incluir a sua sociedade, e se o resto do mundo não está dizendo que vai parar?”, questiona.


Ambiciosa e factível’. O vice-presidente da República e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin (PSB), disse nesta terça (12/11) que a meta climática que o Brasil detalhará nos próximos dias é “ambiciosa, mas também factível”. A declaração ocorreu durante o discurso no Segmento de Alto Nível da COP29. Ele também cobrou avanço com as metas de financiamento climático e regulação do mercado internacional de carbono para criar condições de implementação das NDCs.

Políticas para indústria verde. O presidente da CNI, Ricardo Alban, apresentou uma proposta para criar um grupo de empresários com foco na elaboração de políticas verdes – a exemplo do B20, no caso do G20. A sugestão foi apresentada durante a inauguração do estúdio da CNI, nesta terça (12/11), na Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a COP29, em Baku, no Azerbaijão.

Incentivos na mira. Para Raphael Faucz, vice-presidente da Rystad Energy, um dos pontos mais prováveis de revisão na política de subsídios à indústria de baixo carbono nos EUA durante o governo Trump envolve os incentivos fiscais para veículos elétricos e parques eólicos. Um deles é o artigo 30B do IRA, que atualmente destina cerca de US$ 3 bilhões anuais em incentivos para a indústria de veículos elétricos. Assista nos Diálogos da Transição 2024

Importação de carbono. O Brasil deve permanecer como um importador líquido de derivados de petróleo pelos próximos anos, projeta o PDE 2034. Desenvolvido pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), documento aponta que, mesmo com aumento da produção de derivados, a demanda crescente e a capacidade limitada de refino continuarão a exigir a complementação com importações. Entre os derivados mais deficitários, está o óleo diesel A.

Deixe isso no chão. A troika formada por Brasil, Emirados Árabes e Azerbaijão para comandar a missão 1,5°C está prestes a liberar 50,5 Gt de CO2 na atmosfera devido às suas políticas para combustíveis fósseis, calcula um estudo (.pdf) da Leave it in the Ground Initiative (LINGO), publicado nesta terça (12) na COP29. As estatais Adnoc, Petrobras e Socar possuem a maior participação nas respectivas emissões, mas muitas empresas internacionais estão envolvidas.

Ano mais quente, de novo. A Organização Meteorológica Mundial (OMM), confirmou na segunda (11) que o ano de 2024 será o mais quente já registrado, após uma longa sequência de temperaturas médias globais mensais excepcionalmente altas. De janeiro a setembro, a temperatura média global ficou 1,54 (±0,13) °C acima do nível pré-industrial.