BRASÍLIA – A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) estuda, junto com o Ministério de Minas e Energia (MME) e com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), um planejamento para realizar leilões locacionais de usinas termoelétricas que podem ser usados para ancorar investimento na expansão da oferta de gás natural, afirmou nesta segunda (17) o diretor da agência, Efrain da Cruz.
“Assim como temos uma demanda forte de Santa Catarina com a questão do carvão, a gente vem estudando a questão dos leilões de térmicas ancorando o gás natural. Para a agência, é indiferente as térmicas serem à gás, mas sim a possibilidade de colocá-la onde seja interessante”, explicou durante transmissão promovida pelo Estadão.
A epbr confirmou que há um grupo de trabalho sobre o assunto do qual participa a Aneel, mas não há uma decisão formalizada sobre essa modalidade de leilão de energia entre o colegiado da agência.
Discussão central na Lei do Gás
O uso de térmicas à gás como uma medida para garantir o consumo de gás natural nacional, especialmente do pré-sal, vem sendo debatido como sugestão de associações do setor e parlamentares à Lei do Gás (PL 6407/13), projeto que aguarda votação no plenário da Câmara dos Deputados. A proposta, defendida pela Abegás, foi centro da discussão do evento na manhã desta segunda (17).
Para o diretor da Aneel, há espaço para viabilizar a construção de gasodutos de distribuição através da ancoragem com térmicas independente da inclusão do tema na legislação.
“Naturalmente, se isso vem no escopo de uma legislação, é um amparo mais robusto. Se não vier na lei, estaremos a trabalhar no planejamento energético do país para termos uma solução estrutural para essa grande discussão”.
O melhor caminho para o setor elétrico, ainda segundo o diretor, é que a geração esteja próxima do centro de carga.
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Abegás também defende que a instalação de usinas próximas de onde a energia será consumida ajuda a reduzir os custos da energia, por exemplo, com perdas no sistema de transmissão.
Críticos da medida afirmam que o uso da contratação regulada de energia para sustentar investimentos em redes de gás tende a tornar a energia mais cara.
Efarin da Cruz defende que a remuneração dos investimentos em novos gasoduto pode ser feita de forma semelhante à Receita Anual Permitida (RAP) da transmissão de energia elétrica. A RAP máxima é definida nos leilões de transmissão e as empresas competem pelo deságio – a RAP é repassada às tarifas pagas pelos consumidores de energia.
“O consumidor já pagaria transmissão, porque não pagar o gasoduto nas mesmas condições de uma RAP? O setor elétrico ancoraria o gasoduto, mas logo na sequência seria dividido o custo dos gasodutos com as demais indústrias”, explicou.
O diretor deixou claro de que os estudos da agência ainda não estão finalizados, mas que a ideia da Aneel é demonstrar o paralelo entre os gasodutos de distribuição e as linhas de transmissão do setor elétrico.
Ele indicou discordância da proposta defendida pelo governo de utilizar o GNL com transporte rodoviário para permitir a interiorização do gás natural. “Vamos ter extração de gás em Azulão e transportar por caminhão para Roraima. A pegada do gás natural se esvai porque estou gastando diesel, deteriorando as rodovias e encarecendo ainda mais esse modelo”, avaliou.
Consultor avalia que relatório da Lei do Gás é tímido
Sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), Adriano Pires entende que o atual substitutivo da Lei do Gás não traz muitas novidades e falha em se adaptar ao “mundo pós-pandemia” que exigirá maiores investimentos em infraestrutura. Ele também defende o uso de térmicas como âncora para a demanda do gás com a realização de leilões por parte do governo federal.
“Em função da pandemia, teremos maior dificuldade em atrair investimento porque todos os países buscarão essa saída. Essa disputa maior nos obriga a rever alguns pontos do projeto de maneira mais ousada”, disse.
Os três maiores desafios para o setor de gás, de acordo com Pires, são garantir a maior oferta de gás nacional com maiores condições para o escoamento da produção, expandir a infraestrutura do gás – tanto UPGNs, quanto gasodutos – e conquistar novos mercados por meio da universalização do uso do gás natural.
A adoção de políticas públicas para superar os desafios não exigiria subsídios, segundo o consultor.
“Se você não coloca lojas âncoras no shopping, ele não vai pra frente. Um avanço que poderia ter é o governo fazer leilões locacionais de térmica ao longo do gasoduto e elas seriam âncoras para viabilizar os gasodutos. Gás é indústria de rede. Se não tiver demanda, não tem investimento. Não é subsídio nenhum”, avaliou.
Adriano Pires citou o o estudo Gás para o Desenvolvimento, publicado este ano pelo BNDES, como um “bom debate” a ser feito no desenho do mercado de gás natural, mas reclamou que há posturas radicas acerca da Lei do Gás.
“Precisamos fazer o bom debate, não adianta o ‘nós contra eles’. A gente precisa de gasoduto e também de outros modais de transporte”, defendeu.
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Diretor do BNDES defende expansão “racional” da infraestrutura
O diretor de Infraestrutura, Concessões e PPPs do BNDES, Fábio Abrahão, pontuou que é possível usar a infraestrutura já construída no País, como rodovias e ferrovias, para dar capilaridade ao gás natural antes de estudar a construção de novos gasodutos.
Ele defendeu que a necessidade de modais de grande capacidade de distribuição, como os gasodutos, precisa de muito consumo do energético e pode demorar.
“Vários adensamentos populacionais são servidos por ferrovias, que vão do interior para costa levando grãos e minério. Ou seja, o trem vai cheio e volta vazio. O Brasil já gastou dinheiro para fazer essas ferrovias, temos que usar o que já temos”, comparou.
A crítica é a uma imposição do modelo de expansão da infraestrutura sem racionalidade econômica, não necessariamente à não flexibilização dos despachos.
No artigo Propostas para o gás no Brasil: uma visão do BNDES, publicado pela epbr em maio, Abrahão escreve que a geração termoelétrica “poderia contribuir na viabilização da implantação de rede de gasodutos onde exista também demanda reprimida de gás na indústria”.
Ele também ressaltou que o BNDES deve ter desenvolvido o modelo de projeto para o escoamento do gás até o final do ano. Desde maio deste ano, o BNDES ingressou nas discussões do gás e divulgou estudos do banco para possibilitar uma infraestrutura compartilhada para escoamento do gás natural offshore.
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