BRASÍLIA – Com um pedido de vistas, a diretoria da Aneel adiou a decisão sobre a regulamentação da Conta-Covid para, a princípio, a próxima sexta (19). Em reunião extraordinária que durou até o início da madrugada desta terça (16), não houve consenso sobre a presença de requisitos para lançamento de expectativas de reequilíbrio financeiro nos balanços das distribuidoras entre os diretores da agência.
O valor total dos empréstimos está estimado em R$ 16,2 bilhões e a ideia é antecipar receita para as distribuidoras, cujo faturamento foi afetado pela queda no consumo de energia e aumento da inadimplência, elevando o prazo de amortização de itens que entrariam na tarifa de energia este ano.
Autor do pedido de vistas, o diretor Efrain Cruz afirmou que a proposta em relação ao equilíbrio econômico-financeiro colocaria em dúvida a legalidade da regulação da Aneel ao avançar sobre questões contábeis das distribuidoras e que há possibilidade de judicialização.
O diretor também apontou que muitas empresas buscam a agência alegando risco de falência com a crise, mas demonstraram situação confortável que permitiu, por exemplo, a distribuição de dividendos entre seus acionistas. Efrain usou como base um parecer da Procuradoria Federal junto à Aneel, mas o documento está classificado como reservado, sem acesso público.
Na proposta discutida ontem (15), a Aneel delimitaria como os ativos financeiros relativos aos efeitos do coronavírus devem ser considerados nos balanços das empresas – o que poderia ser lançado como previsão para o reequilíbrio econômico financeiro –, mas sem garantia de aprovação dos valores pela agência, que precisaria aprovar cada um dos pedidos. A proposta foi apoiada pelos diretores André Pepitone e Júlio César Ferraz.
Em seu voto, Elisa Bastos possibilitou a contabilidade desses ativos com o detalhamento das previsões das distribuidoras, inclusive do diferimento da parcela dos grandes consumidores (parcela B). A aprovação da recomposição do equilíbrio econômico-financeiro de contratos de distribuição de energia elétrica seria avaliada em um segundo momento, com uma outra regulação a ser definida pela Aneel e avaliada por consulta pública.
A diretora frisou que proposta de regulamentação da Conta-Covid foi exaustivamente discutida com órgãos de controle, incluindo a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Tribunal de Contas da União (TCU), além de associações do setor elétrico.
Agentes do segmento de distribuição pressionavam para que a regulação da Conta-Covid colocasse a avaliação dos pedidos de equilíbrio como determinante para a operação financeira. Elas entendem que podem perder os covenants de dívidas contratadas – os requisitos e garantias apresentadas na emissão de dívidas e tomada de crédito –, provocando uma onda de liquidação antecipada, caso não haja garantia de reequilíbrio dos contratos.
[sc name=”adrotate” ]
Sem cobertura especial para distribuidoras privatizadas
O reajuste tarifário para distribuidoras do Norte e Nordeste também foi ponto de debate na sessão extraordinária. Na última sessão que debatia a consulta pública sobre o tema, foi aprovada uma alteração que permitia que a Conta-Covid bancasse os reajustes tarifários de distribuidoras das regiões que eram operadas pela Eletrobras e foram privatizadas no governo passado.
Porém, a relatora do caso rejeitou a proposta em seu voto final por entender que a ação está além do limite definido na política pública e que o propósito da mitigação tarifária previsto no decreto do Ministério de Minas e Energia (MME) que fez o primeiro detalhamento da Conta-Covid se limita a 30 de junho de 2020.
“Compreendo que não cabe à Aneel, enquanto agência reguladora, discriminar tratamento diferenciado aos consumidores das distribuidoras licitadas em razão de aspectos sociais e econômicos que marcam determinadas regiões do país. Essa seria uma opção política a ser conduzida pelo Poder Concedente”, explicou a relatora.
O diretor Sandoval Feitosa, quem sugeriu a alteração, cobrou a ausência de sua proposta no voto final sobre a regulamentação da operação financeira. Feitosa defendeu que a Conta-Covid tem como escopo manter o equilíbrio do setor elétrico e evitar impactos tarifários maiores e que, portanto, vário itens previstos pela regulação que estava sendo avaliada não têm relação direta com a pandemia.
Consumidores também criticaram a proposta
Para o especialista em energia da Fiesp, Lucas Fernandes, a agência extrapolou a competência regulatória dada pelo decreto 10.350/2020 e criticou o rateio dos custos dos empréstimos, exclusivamente, com os consumidores de energia.
Fernandes também chamou atenção para o fato de que todo o arranjo da operação financeira se baseia em uma medida provisória que ainda não foi aprovada pelo Congresso Nacional. “A isso daremos o nome de segurança jurídica?”, questionou.
Os conselhos de consumidores voltaram a defender que os custos da operação fossem divididos por toda a cadeia do setor elétrico e não apenas com o consumidor. Pela resolução, o consumidor terá de arcar com todo o custo acessório do empréstimo. A consulta pública recebeu 419 contribuições de 77 remetentes. Destas, 44% foram aceitas ou parcialmente aceitas, segundo a Aneel.
[sc name=”newsletter” ]